Ascensão da extrema-direita na União Europeia gera incertezas sobre a continuidade das políticas climáticas futuras; enquanto um novo relatório científico destaca a urgência de reduzir os chamados “superpoluentes” para conter o aquecimento global.
A recente eleição para o Parlamento Europeu trouxe preocupações significativas para ativistas e defensores da ação climática na Europa. Apesar do predomínio de partidos centristas, que formarão a maioria dos integrantes do corpo legislativo da União Europeia, o avanço de grupos extremistas de direita gerou apreensão sobre o futuro das políticas climáticas no continente.
Os novos parlamentares de extrema-direita, muitos dos quais são negacionistas da crise climática e críticos das medidas ambientais adotadas pela UE nos últimos anos, representam uma ameaça potencial à ambição climática da União Europeia.
Especialistas alertam que, embora seja improvável que haja um retrocesso nas políticas climáticas já estabelecidas, a definição de novas políticas pode enfrentar obstáculos consideráveis. Bas Eickhout, chefe do grupo de parlamentares verdes do Parlamento Europeu, expressou sua preocupação ao afirmar que novas ambições podem ser adiadas por razões populistas. Julian Popov, ex-ministro do meio ambiente da Bulgária, compartilha dessa visão, destacando a possível complicação no lançamento de novas políticas.
“Não penso que retrocederemos nas políticas [climáticas]. Mas penso que será mais complicado lançar novas políticas”
disse Bas Eickhout à Reuters
“É possível que uma nova ambição seja adiada, principalmente por razões populistas”
Ponderou Julian Popov
Vincent Hurkens, do thinktank E3G em entrevista ao The Guardian, destacou que a maioria dos europeus ainda votou em partidos do centro político, e que cabe à centro-direita, aos liberais e aos social-democratas decidir quanto poder e influência a extrema-direita terá sobre o futuro do Green Deal europeu.
“Apesar de muita atenção ser dada às conquistas da extrema-direita, a grande maioria dos europeus ainda votou em partidos do centro político”
“Cabe à centro-direita, aos liberais e aos social-democratas [decidir] quanto poder e influência permitirão que a extrema-direita tenha sobre o futuro do Green Deal europeu”.
, declarou
O primeiro teste dessa nova configuração política ocorrerá ainda neste ano, quando a UE deverá apresentar uma nova Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) com metas de redução de emissões de gases de efeito estufa até 2040. A aprovação dessa NDC pelo Parlamento pode ser um indicativo de quão forte será a ambição climática da UE nos próximos anos.
Superpoluentes climáticos
Enquanto a política europeia enfrenta desafios internos, cientistas globais têm discutido alternativas para frear o aquecimento global de forma rápida. Um novo relatório do Instituto de Governança e Desenvolvimento Sustentável (IGSD) propõe aumentar os esforços contra os superpoluentes climáticos, um grupo de gases-estufa menos abundantes, mas com alto potencial de aquecimento. O briefing científico afirma que o corte dessas substâncias pode evitar que a Terra esquente até 0,6 °C até 2050, com um potencial ainda maior na América Latina e no Caribe, onde a redução na temperatura pode chegar a 0,9 °C.
Embora menos abundantes do que o dióxido de carbono (CO₂), superpoluentes como metano, carbono negro, ozônio troposférico e hidrofluorcarbonos podem ser entre dezenas e milhares de vezes mais potentes no aquecimento global. A incorporação de uma estratégia abrangente para reduzir essas substâncias poderia evitar quase quatro vezes mais aquecimento, no mesmo intervalo temporal, do que as ações focadas apenas na diminuição do CO₂. Durwood Zaelke, presidente do IGSD, compara o esforço contra os superpoluentes a descarbonização;
“Se pensarmos nisso como uma série de corridas, o esforço contra os poluentes climáticos de vida curta é um sprint, porque, ao derrubar essas emissões, evita-se 90% do aquecimento no espaço de uma década, reduzindo de forma rápida a curva de calor. Já a descarbonização é uma maratona. É uma corrida mais comprida, só que, se nós não vencermos o sprint, talvez não tenhamos sequer a oportunidade de terminar a maratona”, compara.
Dados do IPCC indicam que cerca de metade do atual aquecimento da Terra é causado pelos superpoluentes climáticos de vida curta. A comunidade internacional já vem dando passos em relação a alguns desses superpoluentes, como evidenciado pela Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal, que amplia a restrição aos gases HFCs. Na conferência do clima da ONU de 2021, os países concordaram em reduzir 30% das emissões globais de metano até 2030, um compromisso reforçado na última COP, realizada em Dubai.
O professor Jubilut fez um vídeo no ano passado um pouco mais sobre o funcionamento desses gases:
O que esperar do futuro?
As políticas climáticas da União Europeia têm um impacto significativo nos esforços globais de mitigação climática. A apresentação de uma nova NDC europeia até 2025 será crucial não apenas para a UE, mas também para os objetivos globais estabelecidos pelo Acordo de Paris. A presença de partidos de extrema-direita no Parlamento Europeu pode enfraquecer essa NDC, resultando em metas menos ambiciosas para a redução de emissões de gases de efeito estufa.
O que são as NDCs
As Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) são compromissos assumidos por cada país signatário do Acordo de Paris para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa e combater as mudanças climáticas. Cada NDC é elaborada individualmente por cada país, levando em conta suas capacidades, circunstâncias nacionais e objetivos específicos. As NDCs são atualizadas periodicamente, geralmente a cada cinco anos, e são essenciais para alcançar as metas globais de limitar o aumento da temperatura média global bem abaixo de 2 °C, com esforços para mantê-la abaixo de 1,5 °C, em relação aos níveis pré-industriais.
Os próximos anos serão decisivos para determinar se a União Europeia conseguirá manter sua liderança na luta contra as mudanças climáticas e influenciar positivamente os esforços globais. A combinação de políticas internas eficazes e compromissos internacionais robustos será fundamental para enfrentar a crise climática de maneira eficiente e justa.
Com informações da Folha de São Paulo, do The Guardian e da Reuters
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