O objetivo do projeto na Amazônia, parceria entre Unicamp, Inpa e governo britânico, é avaliar o impacto do aumento de CO2 na atmosfera e nas mudanças climáticas ao longo de, no mínimo, uma década
Um experimento inédito conduzido por pesquisadores da Unicamp, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e do governo britânico busca simular as condições climáticas previstas para 2060, funcionando como uma espécie de “máquina do tempo”. Com duração mínima de uma década, o chamado AmazonFACE (Free Air CO₂ Enrichment) utiliza 96 torres metálicas instaladas na floresta amazônica para enriquecer o ar com dióxido de carbono (CO₂) em níveis projetados para o futuro.
O objetivo é investigar como a floresta responderá às mudanças climáticas, incluindo aumento de 50% na concentração de CO₂ na atmosfera, alterações na dinâmica de carbono, no crescimento das plantas e nos ecossistemas associados para os próximos 35 anos. Assim, o projeto oferece uma oportunidade única para prever os impactos das mudanças globais no bioma amazônico e orientar políticas de conservação e mitigação climática.
Funcionamento da “máquina do tempo”
O experimento AmazonFACE contará com a construção de seis estruturas circulares, denominadas anéis, cada um com 30 metros de diâmetro. Esses anéis serão formados por 16 torres de alumínio com 35 metros de altura, dispostas em círculo, e complementados por quatro guindastes de 45 metros de altura para suporte operacional.
Dos seis anéis, três serão enriquecidos com dióxido de carbono (CO₂) líquido, que será armazenado em grandes tanques isolados e vaporizado através de uma rede de tubos, com dois canos por torre. Os outros três anéis funcionarão como controle, observando o comportamento natural da floresta sem o enriquecimento de CO₂.
O modelo da “máquina do tempo”, que deve estar pronto para início das atividades em maio de 2025, mostrou um bom desempenho ao representar o estoque de carbono da floresta quando comparado a dados de satélite e condições climáticas atuais, destacando sua eficácia em prever como a floresta pode responder a cenários futuros de aquecimento global e aumento de CO₂ atmosférico.
De acordo com David M. Lapola, coordenador científico do experimento, a escolha do Brasil como local para um estudo em nível internacional foi motivada pela necessidade de abordar uma das maiores incertezas sobre o futuro da Amazônia: o impacto do aumento de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera sobre a floresta.
“É uma tecnologia relativamente simples, não é tão complexa. Foi desenvolvida nos Estados Unidos nos anos 1980 e 90, foi aplicada em florestas temperadas nos Estados Unidos e na Europa, mas nunca em nenhum ecossistema tropical, nunca em uma floresta tropical”, explica Lapola.
Investimento a longo prazo
Desde que tornou-se um programa oficial do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em 2014, a iniciativa recebeu um investimento de R$ 32 milhões do governo brasileiro, além de um aporte de 7,3 milhões de libras (cerca de R$ 45 milhões) do Reino Unido.
Um estudo publicado pela equipe do experimento em 2018 projetou que, caso a floresta amazônica alcance o ponto de inflexão – ou seja, o limite a partir do qual a floresta não consegue se recuperar e colapsa -, os danos socioeconômicos globais ao longo de 30 anos podem variar entre U$ 957 bilhões e U$ 3,5 trilhões. Esses dados reforçam a importância do programa para entender os impactos das mudanças climáticas na floresta e prevenir consequências negativas para o meio ambiente e a economia mundial.