“Utilizando seus ativos ambientais e cumprindo seus compromissos de proteção florestal, a Zona Franca de Manaus tem uma oportunidade única de se posicionar como um polo global de inovação tecnológica sustentável, integrando-se às cadeias de suprimento e às novas regras tecnológicas globais com uma visão de preservação e desenvolvimento equilibrado.”
Por Alfredo Lopes
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Coluna Follow-Up
Como temos pontuado, a parceria entre Brasil e China, consolidada ao longo das últimas décadas, emerge como um dos eixos mais relevantes do comércio global, com um fluxo crescente de investimentos e trocas que beneficiam ambas as nações. A inclusão do Brasil na Nova Rota da Seda, iniciativa chinesa conhecida como Belt and Road Initiative (BRI), trouxe novos desafios e oportunidades, especialmente nos campos de infraestrutura e logística. Este ensaio explora essas dinâmicas, analisa dados e reflete sobre os limites do pragmatismo diplomático em tempos de redefinições globais.
Leia a parte 1 do artigo de Alfredo Lopes clicando aqui
Variável tecnológica
Seguindo a trilha analítica para avaliar as relações entre Brasil e China, na Parte I do ensaio destacamos a necessidade de inserção da variável tecnológica como uma evolução necessária e estratégica, aproveitando as lições da pandemia. Afinal, a tecnologia descreve o movimento transversal e multilinear da inovação chinesa. A China está, de fato, moldando as novas regras tecnológicas globais, especialmente nos campos da inteligência artificial, telecomunicações, semicondutores e energias renováveis. Ao disseminar essas inovações, a China não só influencia seus parceiros econômicos, mas também exporta padrões tecnológicos, colocando pressão sobre os atores ocidentais para se adaptarem a essas transformações.
Essa tecnologia, além de ser um instrumento de poder econômico, exerce uma influência geopolítica estratégica. A China oferece soluções tecnológicas competitivas e rápidas integrações em sistemas de infraestrutura crítica. Ao adotar essas inovações, países ocidentais — inclusive o Brasil — devem equilibrar os benefícios com a proteção de suas soberanias tecnológicas e seus ativos socioambientais
Grande roçado é delírio do passado
Incorporar essa variável na análise de parcerias com a China reforça a importância de o Brasil acompanhar essas inovações e se posicionar de forma ativa, não apenas como receptor de tecnologias, mas também como criador de alternativas tecnológicas autônomas que protejam seus interesses estratégicos e seu patrimônio econômico e industrial. Isso é obrigatório e decisivo. A ideia do Brasil como um grande roçado tem que ser abandonada em nome de nossa sobrevivência e saúde precária do planeta.
Ao longo dos anos, o Brasil viu parte de sua indústria ser prejudicada pela dificuldade de competir com a China, que se consolidou como fornecedora de bens manufaturados de baixo custo. Em seu artigo de 14/10 último, “China: o chão de fábrica do mundo”, Augusto Rocha recomenda que o país deve somar sua competitividade mineral e agrícola ao fortalecimento de uma indústria de transformação robusta. Este alerta para não apenas exportar commodities como a soja, mas agregar valor a esses produtos internamente, é inadiável. Nesse contexto, o papel da Zona Franca de Manaus (ZFM) é crucial, posicionando-se como polo de inovação da Indústria 4.0.
Alertas e palpites
O artigo de Rocha destaca ainda o impacto das mega plataformas tecnológicas e como elas prejudicam a competitividade nacional. A China, por outro lado, soube balancear a entrada de empresas estrangeiras com o fortalecimento de suas próprias plataformas. O Brasil poderia adotar uma abordagem similar, promovendo a inovação tecnológica local e reforçando suas indústrias digitais com políticas de incentivo e regulação clara. Isso evitaria que nossa economia se tornasse refém de plataformas internacionais, sejam elas ocidentais ou asiáticas.
A China se destacou tanto na produção quanto na inovação tecnológica, e isso reforça a necessidade de o Brasil acompanhar esse movimento. A disseminação das inovações chinesas entre os atores ocidentais é um fato inegável. O Brasil deve aproveitar essa dinâmica, negociando parcerias tecnológicas que tragam ganhos reais para a indústria e permitam a criação de polos de alta tecnologia, como o de semicondutores em Manaus.
Agregação tecnológica
A pandemia mostrou a fragilidade de concentrar cadeias de suprimento em um único país, como a China. Isso deve servir de lição para o Brasil diversificar suas cadeias produtivas, fortalecendo a indústria interna e criando parcerias estratégicas com outros países. A transição para um modelo de produção mais equilibrado, que inclua a fabricação local de bens de alto valor agregado, é essencial para reduzir essa dependência.
O professor Rocha também aborda a necessidade de uma competitividade justa, com regras que assegurem um campo de jogo nivelado, especialmente em relação à tributação. Isso é ainda mais relevante no contexto da ZFM, que já enfrenta desafios para manter sua atratividade. O Brasil deve continuar protegendo sua indústria, mas de forma que incentive a inovação e o valor agregado, em vez de uma dependência contínua de sua maturidade tecnológica com validação estrangeira desnecessária.
Cadeia integradas de suprimentos
É essencial que o país analise melhor as realidades globais e ajuste suas estratégias. O Brasil já tem a maturidade tecnológica necessária, e a diplomacia continua sendo uma de suas forças. Se conseguirmos reconhecer, usar e fortalecer o que já sabemos, vamos descobrir que estamos preparados para enfrentar as pressões globais. A China não só dominou as cadeias globais de produção, mas também está moldando a economia digital. Para o Brasil se posicionar de maneira competitiva, precisamos equilibrar nossa indústria com investimentos em tecnologia, políticas fiscais justas e integração em cadeias de suprimento que beneficiem nossa economia como um todo.
O comentário do professor Rocha, de que “não é só uma blusinha”, faz muito sentido: a questão é estrutural e vai além da auto-estima industrial. O porto chinês de Chancay, no Peru, não é apenas um mega benefício para o Acre, mas também uma dor de cabeça para os Estados Unidos e, potencialmente, para o Polo Industrial de Manaus. Se o Brasil não agir com rapidez e habilidade para proteger e expandir seu papel na economia global, especialmente no Norte e nos mercados emergentes do Sul, estaremos perdendo oportunidades valiosas.
Valorizando nossos ativos
As empresas já instaladas em Manaus devem se mobilizar para debater, sugerir e escolher os caminhos adequados que a indústria, no coração da floresta amazônica, pode apontar. Utilizando seus ativos ambientais e cumprindo seus compromissos de proteção florestal, a Zona Franca de Manaus tem uma oportunidade única de se posicionar como um polo global de inovação tecnológica sustentável, integrando-se às cadeias de suprimento e às novas regras tecnológicas globais com uma visão de preservação e desenvolvimento equilibrado.
Alfredo é filósofo, foi professor na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo 1979 – 1996, é consultor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas, ensaísta e co-fundador do portal Brasil Amazônia Agora
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