O mundo precisa da Amazônia e vai precisar submeter-se a suas leis para acessar seus benefícios e opulência. As categorias e o valor de uso de troca das commodities do Centro-Oeste, na verdade, precisam ajustar-se às similaridades do valor e da riqueza amazônica. E curvar-se aos resultados da nanobiotecnologia. Bioeconomia não é extrativismo disfarçado, é mimese do bioma e da bioética, onde a dinâmica natural e florestal vira paradigmas a serem utilizados como ferramentas da inovação tecnológica, reunindo a nanobiotecnologia, tecnologia da informação e da comunicação.
Por Alfredo Lopes
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Curiosa a movimentação de diversos atores – que se acham especialistas em Amazônia – em condenar a alternativa da bioeconomia como o formato econômico e ecológico mais coerente como desenvolvimento inteligente da região. As razões são múltiplas, especialmente por parte daqueles que já definiram seus negócios, a prosperidade a qualquer custo, mesmo que seja a substituição da biodiversidade por capim e pasto. Ou será o caso de sentar e esperar o Green-bounds de nossa colaboração climática para a intocabilidade radical deste almoxarifado de fármacos, dermocosméticos e alimentos funcionais. Bioeconomia é sustentabilidade e prosperidade em movimento e interação. E viabilizar essa trilha é o mote da mudança.
O artigo do economista/financista Mário Ramos Ribeiro, Miçangas e espelhos, publicado no jornal O Globo do último sábado, no banzeiro do “índio quer apito” ilustra o que queremos rebater. Nossos índios querem mesmo é nanobiotecnologia com clareza e determinação e adoção nacional. Nada contra o extrativismo. O avanço é outro. Doutorado pela FEA-USP e com uma experiência profissional no sistema financeiro, o vizinho paraense Ribeiro detalhou suas preocupações com relação ao divórcio entre as alternativas amazônicas de desenvolvimento e os formatos globais de grandes negócios. Sua inquietação procede pois as manifestações, em âmbito mundial sobre os destinos da Amazônia nunca foram tão prolixas e ao mesmo tempo tão estéreis. Multiplicam-se as soluções de algibeira, tiradas do colete da superficialidade e do achismo que levam a lugar algum. O maior interessado em encaminhar a questão amazônica, o Estado Brasileiro, perdeu-se numa aloprada política ambiental baseada na destruição do bioma. No auge da depredação, depois de um levante mundial contra o fogaréu, a ministra da Agricultura escreveu um artigo para alertar as distorções e pedir o fim do desmatamento. “O agro negócio não precisa da Amazônia para crescer”, temendo as retaliações ao agro.
Miçangas e espelhos, ou apitos, índios e não-índios estão propondo um debate vital sobre a Amazônia: a começar pela obrigatoriedade de esclarecer os conceitos utilizados. Porém, é inaceitável tratar a economia da biodiversidade como extrativismo rebatizado. A comparação apressada denota um absoluto desconhecimento de muitas das ações já em andamento que postulam a bioeconomia como matriz econômica baseada em inovação tecnológica. Essa matriz resulta de uma convergência de saberes da nanobiotecnologia em consonância com tecnologia da informação e da comunicação.
Leia aqui “Bioeconomia, alguns dos melhores ensaios do BrasilAmazôniaAgora, por Alfredo MR Lopes”
Recomendamos conhecer os programas desenhados pelo doutorado interinstitucional entre USP-UEA, (Universidades de São Paulo e Amazonas, sob a FEA, Faculdade de Economia, Contabilidade e Administração) que está qualificando mais de duas dezenas de doutores em gestão da Amazônia, justamente na perspectiva de uma economia da biodiversidade. Grupos e redes de empreendedores já abriram picadas na floresta da inovação. Nessa mesma pegada, os programas prioritários da Suframa, que utilizam recursos da Lei de Informática, estão formando empreendedores nessa perspectiva da convergência tecnológica, reunindo empreendedorismo, bioeconomia e indústria 4.0, ou seja, tecnologia da informação e da comunicação. Parabéns para a Fundação Paulo Feitoza – FPF Tech, IDESAM, duas entidades pioneiras, aptas e ávidas a esculpir uma nova história de transformação. Está será a mais deliciosa farofa amazônica. – É essencial esclarecer que essa mistura e os recursos que a viabilizam são provenientes do programa ZFM e representam um importante e irreversível polo de diversificação bioindustrial deste acerto fiscal extraordinário de redução das desigualdades entre o Norte e o Sul do país.
O que não pode – na conexão da economia global pretendida – é enveredar pela extração predatória de madeira, queimadas para transformar biodiversidade em pasto e diluição/esvaziamento de todos os mecanismos de proteção da floresta e de seus preciosos serviços ambientais. Sem conhecer nossa realidade ninguém pode chegar aqui acusando a Zona Franca de Manaus de ofertar verbas a fundo perdido para a fabricação de bicicletas. Isso é difamação barata e covarde. É curioso como alguns indivíduos assumem o poder sem qualquer preparo de conhecimento e envolvimento com os biomas nacionais. E o que é pior: achando que aqui não tem governança nem punição pensam que podem impunemente chefiar um esquema de comércio ilegal de madeira para os países civilizados. Que vexame gozado!
Leia também “EUA entregaram ao Brasil detalhes que levaram PF a Salles por suspeita de contrabando de madeira ilegal”
O Amazonas se ufana, historicamente, de preservar mais de 95% de seu território, por ter um programa de desenvolvimento regional que não destrói a floresta. Entretanto, de tanto ver seus recursos gerados pela ZFM serem drenados para os cofres da União, algo em torno de 75% das riquezas aqui produzidas, viu a fronteira do agronegócio invadir o Sul do Estado em busca de expansão. O Sul do Amazonas, onde fica Apuí, Boca do Acre, Manicoré, Lábrea e Humaitá, virou a bola a vez. Vale lembrar que esta região foi a única a ser objeto de Zoneamento Econômico e Ecológico de suas fragilidades e potencialidades. Serviu pra quê? De quebra, ao longo dos anos, foi-se formando na região uma Serra Pelada no Rio Madeira, com farta distribuição de mercúrio para envenenar ribeirinhos e sua maior fonte proteica, os abundantes peixes da região.
Além das Serras Peladas, são muitos os fatores que unem Amazonas e Pará e, entre as inquietações de seus estudiosos e gestores, agregou-se mais um. Os dois estados, os mais aquinhoados territorialmente agora disputam o ranking de quem consegue ser mais desmatador. Nada mais deplorável para quem acredita ser possível promover o desenvolvimento sustentável a partir de uma gestão inteligente de nossa diversidade biológica. Esse pacto predatório pode dar o tiro de misericórdia tão temido pelos empresários do Polo Industrial de Manaus. Há décadas eles alegam que as empresas evitam o desmatamento oferendo milhares de empregos e oportunidades que poupam a derrubada da mata. Não evitam mais? A ordem é questionar o poder público e seus organismos de proteção florestal. Será suficiente, considerando que a mão que afaga o desmatamento é a mesma das promessas de proteção florestal?
É preciso mobilizar a inteligência e os atores do desenvolvimento socioeconômico regional para conter essa política insana que nos envergonha e condena a promover inevitavelmente o empobrecimento socioeconômico a partir do desmate. O estudo do Imazon sobre IPS, Índice de Progressão Social, efetuado em 722 cidades da Amazônia, mostrou que quanto maior o indicador de desmatamento, menores são os indicadores de setores como saúde, saneamento, moradia, segurança, educação, comunicação, equidade de gênero e qualidade do meio ambiente.
Leia “Desmatamento é sinônimo de subdesenvolvimento e pobreza na Amazônia” clicando aqui
O mundo precisa da Amazônia e vai precisar submeter-se a suas leis para acessar seus benefícios e opulência. As categorias e o valor de uso de troca das commodities do Centro-Oeste, na verdade, precisam ajustar-se às similaridades do valor e da riqueza amazônica. E curvar-se aos resultados da nanobiotecnologia. Bioeconomia não é extrativismo disfarçado, é mimese do bioma e da bioética, onde a dinâmica natural e florestal vira paradigmas a serem utilizados como ferramentas da inovação tecnológica, reunindo a nanobiotecnologia, tecnologia da informação e da comunicação.
A Convergência Tecnológica de que precisamos é o nosso desafio e a melhor saída para uma obviedade surpreendente. https://www.cidp.pt/revistas/rjlb/2020/5/2020_05_0557_0578.pdf Aqui na Amazônia essa discussão está apresentando rápidos avanços, com produtos e procedimentos altamente inovadores e grandes impactos econômicos e sociais. Veja a questão do açaí, a solução de infraestrutura do Grupo Bertolini. As chamadas TICs e a revolução das nanotecnologias, possibilitam grandes sinergias, produzindo resultados espetaculares e inimagináveis há bem pouco tempo. O laboratório nacional de nanotecnologia em São Carlos, SP, da Embrapa Instrumentação, que era uma fantasia faz poucos anos, hoje atende as empresas de fabricação de preservativos, pneus e produtos hospitalares. Elas encomendam clones da floresta amazônica a partir da seringueira, a Hévea brasiliensis, coletadas no Rio Juruá Amazonas, onde brota uma espécie considerada perfeita em sua configuração biomolecular. Isso não é extrativismo e sim um acontecimento científico e tecnológico de manejo florestal sustentável que qualquer país civilizado que investe e respeita o conhecimento gostaria de chamar de seu. O economista Denis Minev, atualmente CEO do Grupo Bemol acredita que, em breve, o Brasil vai entender, degustar e abraçar a Amazônia, suas oportunidades e potencialidades. Quem sabe este assunto possa substituir o debate estéril da política menor nas próximas eleições e ganhe o fôlego e a abordagem de que a Amazônia precisa para emprestar sua grandeza à construção do país.
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