“Mesmo quando a rodovia estiver asfaltada, ainda assim haverá estiagem em Benjamin Constant, e a comunidade local de São Francisco, por exemplo, continuará a caminhar 1 Km para obter água, mesmo turva, e mesmo que estejamos em 2023. A BR-319 não é culpada.“
Por Juarez Baldoino da Costa
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Para ter o asfaltamento concluído, a BR-319 – Manaus-Porto Velho nunca dependeu de nenhum ministro e de nenhum presidente da república.
A estrada aguarda no momento a aprovação de um estudo que está sendo elaborado pelo DNIT – Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes a partir de indicações técnicas do IBAMA quando da aprovação da licença prévia aprovada em 2022.
A licença prévia foi aprovada porque o então ministro da Infraestrutura Tarcísio de Freitas, hoje governador de SP e que já foi chefe do DNIT no governo Dilma, aquiesceu que havia falhas na elaboração dos estudos anteriores que inviabilizaram as licenças até então, e coordenou o estudo que o IBAMA finalmente aprovou.
A mídia tem veiculado diversas opiniões ao longo dos últimos anos sobre a rodovia, mas é raro ser alguém envolvido diretamente com o assunto e com autoridade técnica. A legislação federal regula todo este processo, e é indiferente o nome, a opinião e a intenção deste ou daquele personagem; a responsabilização legal por eventual irregularidade ou falha recairá sobre todos os agentes que subscreverem a documentação inerente. Portanto, é lícito que se acautelem o suficiente e com razoabilidade.
Estes agentes sabem que, no caso de incorrerem em futuros eventuais apontamentos do Ministério Público Federal ou da Justiça Federal, os personagens que opinaram não vão socorrê-los. O Ministério Público Federal ou o TCU – Tribunal de Contas da União poderiam verificar e divulgar, no resguardo dos interesses do país, quais as razões que levaram ao estágio atual da situação, e até quais seriam as medidas adequadas para a solução dos entraves.
Estiagem amazônica
Neste domingo 01/10/2023 o Rio Negro em processo de vazante deve chegar a cerca de 15,48 m acima do nível do mar em Manaus (o pico da cheia é 30 m), e desde ontem, sexta-feira, parece ter iniciado o processo de diminuição de baixa tendo descido apenas 23 cm, interrompendo a sequência de descidas diárias acima de 30 cm desde 15/09/2023. O quadro de estiagem parece ter atingido o pico e se reverte a partir de então, segundo o comportamento observado ao longo dos anos.
Como o Rio Negro e o Rio Solimões são os rios que definem a dinâmica básica do Rio Amazonas, o reflexo natural é a reversão da estiagem também no Rio Madeira, principal afluente do Rio Amazonas na margem direita, que afeta inclusive o abastecimento principalmente da capital Manaus.
No caso da estiagem, mesmo que a BR-319 estivesse asfaltada ou quando estará, não alcançará os municípios que mais sofrem com o problema destes fenômenos cíclicos e previsíveis que afetam principalmente o Alto Solimões e nas calhas dos rios Juruá, Javari e Purus, e as regiões de Tefé e Coari, todos a montante de Manaus.
A de 2023 é mais uma estiagem.
Neste contexto, a culpa pela falta de oxigênio em Manaus no lamentável episódio da COVID-19 não foi da ausência da BR-319; ela apenas serviu para trazer os cilindros do Sul em dado momento definido pelas autoridades, e que até poderia ter sido antecipado, mas é uma outra discussão.
Mesmo quando a rodovia estiver asfaltada, ainda assim haverá estiagem em Benjamin Constant, e a comunidade local de São Francisco, por exemplo, continuará a caminhar 1 Km para obter água, mesmo turva, e mesmo que estejamos em 2023.
A BR-319 não é culpada.
Juarez é Amazonólogo, MSc em Sociedade e Cultura da Amazônia – UFAM, Economista, Professor de Pós-Graduação e Consultor de empresas especializado em ZFM.
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