“Se não resolvermos a questão energética, a floresta até pode permanecer em pé, entretanto, quem habita a a Amazônia permanecerá à margem da História. Garantir acesso a energia limpa, acessível e sustentável para todos é um passo essencial para construir um futuro onde o desenvolvimento humano e a preservação ambiental caminhem juntos”.
Anotações de Alfredo Lopes
__________________________
Coluna Follow-Up
A pobreza energética é um desafio global que afeta milhões de pessoas em diversas realidades, do Norte ao Sul do planeta. No Brasil, o tema ainda é subexplorado, mas sua presença é sentida de maneira profunda, especialmente em regiões como a Amazônia. Nesta região, as dificuldades vão além do simples acesso à energia e refletem um mosaico de problemas interligados, que incluem infraestrutura inadequada, dependência de combustíveis poluentes e desigualdades socioeconômicas que impactam diretamente a qualidade de vida das populações locais.
O cenário da pobreza energética no Brasil e no mundo
O conceito de pobreza energética foi amplamente estudado pelo Instituto Polis em 2022, destacando que, no Brasil, ele está associado a fatores como baixa renda, infraestrutura deficiente e políticas públicas pouco eficazes. Apesar de avanços, como o programa Luz para Todos, que levou energia elétrica a 17 milhões de pessoas em 20 anos, a realidade em muitas comunidades amazônicas ainda é marcada por sistemas precários e alto custo da energia. Mesmo em áreas com eletrificação universalizada, a falta de condições econômicas para usufruir de energia de forma segura e eficiente perpetua desigualdades.
O Brasil não está sozinho nesse desafio. Países desenvolvidos também enfrentam o problema, especialmente em cenários de crises econômicas e mudanças climáticas. Na Europa, 35 milhões de pessoas vivem em condições de pobreza energética. Portugal, um exemplo emblemático, se destaca pela proporção elevada de famílias incapazes de manter suas casas aquecidas, mas estabeleceu uma meta ambiciosa de erradicar a pobreza energética até 2050, com base em estratégias focadas em eficiência energética, combate às desigualdades e transição para fontes renováveis.
Pobreza energética e seus impactos multidimensionais
A pobreza energética é mais do que a falta de eletricidade; ela atinge diretamente saúde, educação, segurança alimentar e bem-estar. No contexto amazônico, onde o clima quente e úmido exige dispositivos de conforto térmico como ventiladores e ar-condicionados, os custos elevados de energia se tornam uma preocupação constante. O dilema entre pagar a conta de luz ou garantir alimentação cria um ciclo de precariedade que perpetua a vulnerabilidade social.
Além disso, a instabilidade no fornecimento de energia e a ausência de políticas robustas para lidar com eventos climáticos extremos aumentam a sensação de insegurança. Em janeiro de 2024, relatos como o de famílias em Maricá, que passaram a dormir na praia devido ao calor insuportável e à falta de energia, ilustram como essa realidade impacta diretamente o cotidiano. A pobreza energética transcende o acesso técnico à energia, ampliando-se para abarcar desigualdades sociais e territoriais.
A Amazônia e o papel estratégico da transição energética
A Amazônia, com sua rica biodiversidade e potencial energético, enfrenta desafios únicos na luta contra a pobreza energética. A dependência de combustíveis fósseis e fontes poluentes, como a lenha, ainda é uma realidade em muitas comunidades, enquanto as longas distâncias e a ausência de infraestrutura moderna agravam o custo e a eficiência do fornecimento de energia.
No entanto, a região também carrega a promessa de soluções inovadoras. A transição energética, que envolve a substituição de fontes fósseis por alternativas renováveis, apresenta-se como uma resposta eficaz não apenas para mitigar a pobreza energética, mas também para promover o desenvolvimento sustentável na Amazônia. Fontes como energia solar, eólica, biomassa e hidrogênio verde possuem grande potencial na região, podendo ser implementadas em sistemas descentralizados que atendam às necessidades locais com eficiência e sustentabilidade.
Caminhos para o futuro
O combate à pobreza energética na Amazônia requer uma abordagem integrada que inclua políticas públicas, participação comunitária e inovação tecnológica. Experiências internacionais, como a estratégia de Portugal, mostram que é possível enfrentar este desafio por meio de investimentos em eficiência energética, ampliação do acesso a tecnologias limpas e promoção de programas sociais que reduzam o impacto dos custos de energia para as famílias mais vulneráveis.
No caso brasileiro, é fundamental que a transição energética seja vista como uma prioridade nacional, considerando a Amazônia como uma peça central dessa estratégia. Além de melhorar as condições de vida das populações locais, o avanço em tecnologias renováveis na região pode posicionar o Brasil como líder global na luta contra as mudanças climáticas e no desenvolvimento de uma economia de baixo carbono.
Por fim, o enfrentamento da pobreza energética na Amazônia não é apenas uma questão técnica ou econômica, mas uma decisão ética. Garantir acesso a energia limpa, acessível e sustentável para todos é um passo essencial para construir um futuro onde o desenvolvimento humano e a preservação ambiental caminhem juntos.
Alfredo é filósofo, foi professor na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo 1979 – 1996, é consultor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas, ensaísta e co-fundador do portal Brasil Amazônia Agora
Comentários