Veja quais as principais causas das mudanças climáticas, termos centrais utilizados para debater o tema e o que está sendo feito para mitigar seus impactos no planeta
De um lado, rios que atingem seu nível mais baixo em décadas devido a secas prolongadas. Do outro, enchentes históricas que trazem grandes impactos sociais e ambientais. Não muito longe, cidades que vivenciam temperaturas altas – ou baixas – demais, modificando a rotina da população e até as atividades econômicas. Tudo isso corresponde a fenômenos e consequências atreladas às mudanças climáticas, que recebem influência direta da ação humana.
Selecionamos dez perguntas – com respostas – para entender quais os impactos dessas mudanças, quem são os mais afetados e como podemos, em âmbito tanto individual, quanto global, trabalhar para que as nações enfrentem a crise climática de forma eficaz.
1- O que são mudanças climáticas e como elas afetam o planeta?
Segundo definição da ONU, as mudanças climáticas são transformações a longo prazo nos padrões de temperatura e clima, que podem ser tanto naturais, devido a alterações no ciclo solar e na inclinação do planeta, por exemplo, quanto resultantes da atividade humana, que têm sido o principal impulsionador desde a Revolução Industrial.
Nesse caso, a queima de combustíveis fósseis, como carvão, petróleo e gás, é a principal causa, liberando gases de efeito estufa (GEE), como dióxido de carbono (CO₂) e metano (CH₄). Esses gases formam uma camada que retém o calor na atmosfera, intensificando o aquecimento global e colaborando para o aumento acelerado das temperaturas globais nos últimos 100 anos. Atividades como transporte, aquecimento de edifícios e uso de combustíveis em indústrias contribuem significativamente para essas emissões. Além disso, o desmatamento e a decomposição de resíduos em aterros também liberam grandes quantidades de gases de efeito estufa.
A geração de eletricidade e calor por combustíveis fósseis, de acordo com a ONU, também está entre as principais fontes de emissões globais de GEE. A queima de carvão, petróleo e gás domina a produção elétrica, liberando dióxido de carbono e óxido nitroso, que contribuem significativamente para o aquecimento global. Atualmente, apenas cerca de 25% da eletricidade mundial vem de fontes renováveis, como vento e sol, que emitem poucos ou nenhum gás de efeito estufa ou poluentes atmosféricos.
2- Quais são os principais impactos já observados das mudanças climáticas no meio ambiente e na economia?
As consequências das mudanças climáticas já aceleraram fenômenos como o degelo das calotas polares e agravaram a perda de biodiversidade em uma série de biomas, além de alterarem padrões de precipitação, promovendo secas severas e enchentes. Já na economia, destacam-se os desafios econômicos em setores turísticos, por exemplo, que dependem de um clima estável, e a diminuição na produtividade de culturas agrícolas sensíveis, elevando preços dos alimentos.
Derretimento de calotas impacta no tamanho dos oceanos
Com o degelo, o aumento do nível do mar ocorre cada vez mais rápido, colocando em risco a existência de cidades litorâneas e nações insulares. Além disso, os oceanos absorvem dióxido de carbono, reduzindo sua concentração na atmosfera, mas isso acidifica a água e ameaça tanto a vida marinha, quanto os recifes de corais.
Além de ilhas como Maldivas e Tuvalu, Bangladesh, país da Ásia, já sofre com as consequências do aumento dos oceanos: sua localização geográfica e a topografia fazem do país um dos mais propensos a inundações do mundo. Em uma análise feita com 99 cidades costeiras ao redor do mundo, Chittagong, localizada na baía de Bengala, em Bangladesh, está entre as 10 primeiras da lista que afundaram mais de um centímetro por ano entre 2015 e 2020.
Espécies ameaçadas
Um exemplo real da conexão entre a crise climática e a biodiversidade são os peixes na Amazônia, principal fonte de proteínas para uma população de 38 milhões de pessoas. Estudos mostram que a diversidade de peixes amazônicos está diretamente relacionada à cobertura florestal, destacando o papel crucial das florestas na manutenção da biodiversidade aquática. Entretanto, desde 1985, 13% das florestas naturais da Amazônia foram perdidas, segundo o Mapbiomas, um dado preocupante para a segurança alimentar.
Mudanças nos padrões de temperatura e precipitação também afetam a disponibilidade de flores e o comportamento das abelhas, essenciais para a polinização de diversas plantas. Declínios nas populações desse inseto têm sido observados em várias regiões, ameaçando a produção agrícola e a biodiversidade vegetal.
Transformações na economia
A mudança climática representa uma grave ameaça à estabilidade econômica global. Ondas de calor diminuem a produtividade, enquanto furacões, ciclones e tufões devastam cidades, tornando cenários de pobreza ainda mais críticos. Já as secas comprometem colheitas e dificultam a alimentação de uma população projetada para 10 bilhões em 2050 (Perspectivas da População Mundial 2019, ONU).
“O calor extremo pode reduzir a água e o pasto para o gado, levando a uma diminuição na produção agrícola e afetando a pecuária”, diz a ONU. Com isso, o Banco Mundial alerta que, sem ações urgentes, os impactos climáticos podem levar mais 100 milhões de pessoas à pobreza até 2030.
3- De que forma as mudanças climáticas intensificam eventos climáticos extremos, como furacões e secas?
Eventos como furacões e enchentes têm gerado prejuízos bilionários, exigindo gastos crescentes em infraestrutura resiliente nas cidades. Em paralelo, secas histórias, como as observadas nos rios Negro e Madeira em 2024, trazem impactos econômicos e sociais significativos.
De acordo com um artigo da National Geographic dos EUA, a cada grau de aumento na temperatura global, o ar retém 7% mais umidade. Isso pode intensificar inundações, furacões, tempestades de neve e outros eventos extremos. O aquecimento dos oceanos também amplifica a frequência e a força de tempestades tropicais, como ciclones e furacões, que dependem de águas quentes da superfície para ganhar energia.
Um exemplo recente foi o furacão Milton, que em outubro de 2024 devastou o estado da Flórida, causando destruição de casas, alterações na paisagem, prejuízos à agricultura, inundações e mortes, afetando gravemente comunidades, animais e infraestrutura.
Já no outro extremo, o aquecimento global também agrava a escassez de água em regiões áridas e intensifica secas agrícolas que prejudicam as colheitas, assim como as secas ecológicas, que tornam os ecossistemas mais vulneráveis, alerta a ONU. Além disso, mudanças climáticas levam ao aumento de tempestades de areia e poeira, bem como à expansão dos desertos.
Segundo estudo do grupo internacional de cientistas World Weather Attribution (WWA), a histórica seca que atingiu a Amazônia em 2023 foi majoritariamente atribuída à mudança climática provocada por atividades humanas. A pesquisa revelou que o fenômeno natural El Niño, frequentemente associado a condições secas na região, teve uma influência significativamente menor nesse evento.
Em algumas áreas, os rios da Bacia Amazônica alcançaram os níveis mais baixos em mais de um século, afetando gravemente as comunidades ribeirinhas. A estiagem também aumentou os incêndios florestais, piorando a poluição do ar com a disseminação de fumaça. Além disso, temperaturas elevadas da água resultaram em grandes perdas de vida aquática, incluindo a morte de mais de 150 golfinhos cor-de-rosa, uma espécie ameaçada de extinção.
4- O que diferencia o aquecimento global natural das mudanças climáticas causadas por atividades humanas?
O aquecimento global “natural” corresponde, na verdade, ao que chamamos de efeito estufa, fenômeno natural fundamental para a manutenção da vida no planeta que retém parte do calor emitido pela Terra por meio de uma camada de gases. Já o aquecimento global é o aumento anormal da temperatura média do planeta e está diretamente relacionado às ações antrópicas, ou seja, vindas do homem. Estas aumentam a concentração de gases do efeito estufa além do ideal, fazendo com que o planeta retenha mais calor e aumente sua temperatura.
5- Por que o limite de 1,5°C de aquecimento global é considerado crucial para o futuro do planeta?
No Acordo de Paris, um tratado internacional com quase todos os países que visa limitar o aumento da temperatura global em relação aos níveis pré-industriais, foi estabelecida a meta de manter o aquecimento abaixo de 2 ºC, com a meta preferencial de restringi-lo a 1,5 ºC, incentivando ações globais para enfrentar as mudanças climáticas.
Esse número foi determinado com base em análises científicas conduzidas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) como o ideal para reduzir o risco de atingir “pontos de não retorno”, como o colapso da camada de gelo da Antártica Ocidental ou o desaparecimento da floresta amazônica, que poderiam desencadear mudanças irreversíveis no sistema climático global.
O painel sugere que o aquecimento induzido pelo ser humano no planeta está atualmente próximo de 1,31 °C. De acordo com o relatório do IPCC de 2022, um aquecimento de 1,5 ºC exporia cerca de 350 milhões de pessoas à escassez de água causada por secas severas, número que subiria para 420 milhões com 2 ºC de aquecimento. Chuvas torrenciais e furacões aumentariam em 7% com 1,5 ºC e em 15% com 2 ºC.
Em cenários extremos, com aquecimento entre 3ºC e 4 ºC, países como Itália, Espanha e Grécia enfrentariam clima desértico. Já com 5ºC a 6ºC de aquecimento, furacões aumentariam em frequência e intensidade em 37%, enquanto a cobertura de gelo global se reduziria em 75%.
6- Como as mudanças climáticas afetam comunidades vulneráveis?
Eventos como as enchentes no Rio Grande do Sul em 2024 afetam de forma desproporcional as populações mais vulneráveis, incluindo pessoas pobres, negros, mulheres, crianças, idosos, comunidades indígenas, quilombolas, pescadores e agricultores familiares. Segundo dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), mais de 80 comunidades tradicionais foram impactadas, afetando cerca de 8 mil indígenas das etnias Guarani Mbya, Kaingang, Xokleng e Charrua em 50 municípios da região.
O cenário condiz com o sexto relatório de avaliação do IPCC, divulgado pela ONU em 2023, no qual a organização destaca que as populações mais afetadas pela crise ambiental são as que menos contribuem para o aquecimento global. “Nas regiões mais pobres e marginalizadas, o número de mortes por calor, secas, enchentes e tempestades foi 15 vezes maior, na última década, do que nas regiões com mais infraestrutura”, aponta a jornalista e ativista ambiental Mariana Belmont ao portal do Sesc SP.
O modelo urbano brasileiro, caracterizado por favelas e comunidades sem infraestrutura e recursos adequados, contribui para perpetuar desigualdades sociais. Após o temporal e os deslizamentos em São Sebastião, por exemplo, no litoral norte de São Paulo, a disparidade ficou evidente: os mais ricos deixaram a área de helicóptero, pagando até R$ 30 mil pelo transporte. “Enquanto isso, as pessoas mais atingidas e prejudicadas foram os moradores dos morros, que acabaram, inclusive, sendo culpabilizados pela situação que os atingiu”, lembra Raquel Rolnik, professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP), completando a fala de Belmont.
7- Qual é o papel de eventos internacionais, como a COP29, na busca por soluções globais para as mudanças climáticas?
A COP (Conference of the Parties), criada pela ONU em 21 de março de 1994, é uma convenção anual que busca prevenir intervenções humanas perigosas no sistema climático global, funcionando como um fórum multilateral para decisões sobre mudanças climáticas. Eventos como a COP reúnem quase todos os países do mundo: na edição de 2023, eram esperados representantes dos 198 membros: 197 países e a União Europeia, assim como na COP29, a edição mais recente, sediada em Baku.
De modo geral, é na COP que se discutem formas práticas de atingir objetivos como limitar o aumento da temperatura global a 1,5 ºC, apoiar comunidades vulneráveis na adaptação aos impactos das mudanças climáticas e alcançar emissões líquidas zero até 2050, em conformidade com as metas estabelecidas pelo Acordo de Paris de 2015. Em uma década decisiva para a ação climática, trazer diálogos e mudanças efetivas em escala global torna-se crucial.
Financiamento climático e os países em desenvolvimento
A grande questão da COP29 foi o financiamento climático, termo essencial dentro do debate sobre mudanças climáticas. Ele refere-se aos recursos financeiros, públicos ou privados, destinados a cumprir as metas do Acordo de Paris, como a redução de emissões de gases de efeito estufa e o fortalecimento da resiliência às mudanças climáticas. Isso abrange investimentos em energia limpa (eólica, solar, nuclear, hidrogênio), veículos elétricos, agricultura sustentável, reflorestamento, infraestrutura de saneamento e água segura, isolamento térmico de edifícios e medidas para lidar com o aumento do nível do mar, como a construção de barragens.
Estima-se que as necessidades globais de “financiamento climático” giram em torno de US$ 10 trilhões anuais (R$ 55 trilhões na cotação atual) entre 2030 e 2050. Entretanto, alguns países, por suas vantagens econômicas em relação a outras nações mais pobres, precisam ajudar os demais a financiar ações em prol da sustentabilidade em seus territórios, visando uma transição climática menos desigual.
Mesmo com uma nova meta de financiamento climático, a COP29 terminou com críticas e insatisfação dos países em desenvolvimento, alegando que os US$ 300 bilhões (R$ 1,74 trilhão) anuais destinados com esse objetivo até 2035 ainda é uma quantia insuficiente e pouco ambiciosa.
8- O que os governos estão fazendo para alcançar a meta de “net zero” de emissões de carbono até 2050?
Para ajudar a manter o aquecimento global dentro do limite de 1,5°C acordado em Paris, as emissões de CO2 precisam ser “neutras em carbono” até 2050, segundo a ONU. Basicamente, isso significa reduzir as emissões de gases de efeito estufa ao máximo e remover ativamente quaisquer emissões restantes da atmosfera, ou realizar a compensação dessas emissões.
A maioria dos países, como Japão, Reino Unido e França, já estabeleceu ou está considerando metas de neutralidade de carbono para 2050. Houve avanços em algumas áreas, incluindo no crescimento das energias renováveis , como solar e eólica, e dos veículos elétricos. Dentro de empresas, a transformação de processos produtivos, em etapa denominada “carbon negative”, pretende retirar mais carbono da atmosfera do que o emitido por elas.
Segundo Luís Augusto Navarro, diretor de Compliance e Riscos do BNDES, em declaração na COP29, deter ou até reverter a devastação das florestas nacionais pode fazer com que o Brasil seja o primeiro país do G20 a alcançar a neutralidade em carbono.
No entanto, os níveis de gases de efeito estufa continuam aumentando rapidamente, e o mundo “provavelmente” ultrapassará o limite de 1,5°C, de acordo com o IPCC. Assim, alcançar efetivamente o “net zero” exigirá uma ampla gama de ações, incluindo esforços para manter uma expansão significativa do uso de energias renováveis, que devem compor entre 70% e 85% da eletricidade global até a metade do século. Além disso, será crucial repensar os combustíveis no transporte, priorizando alternativas mais limpas, e melhorar a eficiência na produção de alimentos para reduzir emissões associadas ao setor agrícola.
9- Quais avanços em energia renovável e veículos elétricos podem ajudar a conter o aquecimento global?
Enquanto setores tradicionais da economia são impactados negativamente, o mercado de tecnologias limpas cresce no contexto das mudanças climáticas, criando novas oportunidades. Nesse contexto, a transição energética se torna um conceito cada vez mais em pauta: ela envolve a transformação significativa na produção e no consumo de energia, substituindo fontes fósseis tradicionais, como carvão, petróleo e gás, por energias limpas e sustentáveis, como solar, eólica e hidrogênio, contribuindo para a redução de emissões de gases de efeito estufa.
Para que isso seja possível, são necessários investimentos. No Brasil, a projeção de verbas destinadas ao setor de energias renováveis calculada pelo governo é de R$ 200 bilhões até 2028. “Vamos gerar milhares de empregos em diversas regiões do país, desde a produção de cabos, de componentes elétricos, que acontecem no Sudeste do país, a aerogeradores, que ocorre hoje em estados do Nordeste”, afirmou o ministro da Casa Civil, Rui Costa.
Com isso, os carros elétricos se consolidam como uma forte tendência global devido à sua maior eficiência energética e menor impacto ambiental em comparação com veículos a combustíveis fósseis. Segundo estudos, a adoção do uso da energia renovável para carregar veículos elétricos minimiza as emissões indiretas associadas à geração de eletricidade e, em larga escala, essa dupla tem o potencial de reduzir significativamente as pegadas de carbono e mitigar os impactos das mudanças climáticas.
A Noruega tornou-se o primeiro país do mundo onde os veículos elétricos superam os carros a gasolina, segundo dados divulgados pela federação norueguesa de estradas (OFV) em 17 de setembro. Apesar da liderança dos veículos a diesel no país, representando um terço da frota, dos 2,8 milhões de carros de passageiros registrados, 26,3% são totalmente elétricos, ultrapassando os movidos a gasolina.
10- O que indivíduos podem fazer para contribuir com a redução das emissões de gases de efeito estufa?
Segundo o WWF, a chave, no âmbito individual, é mudar hábitos: reduzir a produção de lixo, optando por comprar produtos com menos plástico, é uma boa alternativa, assim como consumir produtos locais e fortalecer esses comércios, o que evita longas distâncias de transporte e a emissão de gases por caminhões.
Promover mudanças dentro das empresas, mesmo que pequenas de início, também desempenham um papel crucial na redução das emissões de gases de efeito estufa. Medidas como investir em eficiência energética, adotar fontes de energia renovável, desenvolver produtos e serviços sustentáveis, combater a obsolescência programada e reduzir a extração e o uso de recursos naturais são essenciais para promover práticas mais responsáveis e mitigar impactos ambientais.
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