Documentos revelam que a Exxon destinou recursos a think tanks para influenciar governos do Sul Global e propagar o negacionismo climático em momentos-chave da agenda da ONU.
Uma investigação do site DeSmog, repercutida pelo jornal britânico The Guardian, revela que a petroleira ExxonMobil financiou ações para disseminar o negacionismo climático em países da América Latina, como Brasil e Argentina. Segundo os documentos obtidos, a empresa destinou recursos à Atlas Network, rede internacional de think tanks de orientação liberal e pró-mercado, com o objetivo de enfraquecer o apoio de nações do Sul Global aos acordos climáticos da ONU.
As evidências incluem cheques, cartas e comunicações trocadas entre o fim da década de 1990 e o início dos anos 2000, indicando uma campanha articulada para deslegitimar o consenso científico sobre a crise climática. Os recursos teriam sido usados para traduzir livros negacionistas para o espanhol e o chinês, patrocinar eventos públicos e financiar viagens de palestrantes norte-americanos que propagavam o negacionismo climático e negavam a influência humana no aquecimento global.
Entre os beneficiados estariam instituições como o Instituto Liberal, no Brasil, e a Fundación República para una Nueva Generación, na Argentina. Essas entidades lideraram seminários e publicações estratégicas às vésperas da COP4, realizada em Buenos Aires em 1998. Um dos nomes convidados foi Patrick Michaels, conhecido por suas posições negacionistas, que chegou a chamar o aquecimento global de “histeria”.
Um dos materiais traduzidos pela Atlas Network foi o livreto “O Caso Científico Contra o Tratado Climático Global”, de Fred Singer, que negava a existência de evidências científicas consistentes sobre os impactos do aquecimento.
De acordo com a investigação, a Exxon buscava construir uma rede global de aliados capazes de influenciar políticas públicas e retardar medidas de regulação ambiental, estratégia que já era adotada nos EUA com apoio a instituições, como a Heritage Foundation, associadas ao negacionismo climático.
A Atlas Network declarou que os documentos foram escritos por ex-colaboradores há mais de 25 anos e que a Exxon não contribui financeiramente com a rede há quase duas décadas. A petroleira não se manifestou sobre o caso.
O episódio evidencia o papel de diversas grandes corporações no atraso da ação climática, cujos efeitos são sentidos hoje, com o aumento contínuo das emissões e a aproximação de pontos de não retorno, como a destruição irreversível de recifes de corais. A denúncia surge em um momento simbólico, em que o Brasil se prepara para sediar a COP30, em Belém (PA).