“Cada real recolhido pela indústria deve se converter em resultado mensurável para a população. Sem isso, os bilhões continuarão sendo apenas números. Com isso, podem se tornar a senha de uma nova configuração social e econômica do estado”.
Coluna Follow-Up
A Zona Franca de Manaus é mais que um polo produtivo. É, cada vez mais, um agente estruturante da arrecadação pública e do desenvolvimento regional. Movida por engrenagens de trabalho formal, inovação tecnológica e compromisso legal, a indústria incentivada sustenta parte expressiva das finanças estaduais e municipais do Amazonas.
No primeiro semestre de 2025, os números comprovam essa contribuição com clareza:
• R$ 1,2 bilhão recolhidos ao Fundo de Turismo, Infraestrutura e Interiorização (FTI);
• R$ 469 milhões destinados à Contribuição para o Ensino Superior, que financia a Universidade do Estado do Amazonas (UEA);
• R$ 198 milhões ao Fundo de Fomento às Micro e Pequenas Empresas (FMPES);
• R$ 728 milhões pagos em ICMS, tornando a indústria o maior contribuinte isolado do Estado;
• e, ainda, R$ 2,36 bilhões investidos em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) pelas empresas de bens de informática.
Somados, esses valores ultrapassam R$ 6 bilhões em apenas seis meses — o que projeta um total anual entre R$ 11,5 e 12 bilhões. Recursos legalmente vinculados a áreas decisivas: educação superior, turismo, infraestrutura, micro e pequenas empresas e inovação tecnológica.
O paradoxo inaceitável
E, no entanto, a realidade social do Amazonas continua a expor um paradoxo doloroso: a abundância de recursos convive com a persistência da miséria estrutural.
• O estado segue entre os últimos colocados em Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), ao lado do Maranhão.
• Menos de 20% da população têm acesso a saneamento básico.
• As taxas de evasão escolar no ensino médio permanecem alarmantes, sobretudo no interior.
• A mortalidade infantil supera a média nacional.
• Quase 40% da população vive em situação de pobreza ou extrema pobreza.
Essa equação revela que não faltam recursos — falta gestão
Um olhar científico e compartilhado
É chegada a hora de encarar essa realidade com o rigor de uma lente econométrica e científica: avaliar o impacto real de cada fundo, de cada repasse, de cada programa. Não basta anunciar milhões destinados a determinada finalidade; é preciso demonstrar quantos jovens ingressaram na universidade, quantos empreendedores foram fortalecidos, quantos empregos foram gerados no interior, quantas comunidades tiveram sua infraestrutura transformada.
Para isso, defendemos uma governança compartilhada:
• Indústria incentivada, que gera e repassa os recursos;
• Academia, como espaço de ciência e formação de capital humano;
• Setor público, responsável por políticas e gestão;
• Sociedade civil, como beneficiária e fiscalizadora.
Somente com esse arranjo coletivo será possível transformar bilhões em educação, saúde, cidadania, oportunidades e dignidade.
O retrato da exclusão social
O próprio relatório do Estado, por meio da Secretaria de Assistência Social (SEAS), confirma o que se vê nos números do desenvolvimento humano: o Amazonas vive altos índices de exclusão e vulnerabilidade social. O documento aponta que os segmentos mais afetados são crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, povos indígenas, populações ribeirinhas e famílias em situação de pobreza extrema.
A luta cotidiana pela sobrevivência marca gerações que crescem sem acesso regular à alimentação adequada, sem proteção social efetiva e, muitas vezes, sem perspectiva de inclusão produtiva. O relatório enfatiza que o ciclo da exclusão se perpetua, limitando as chances de mobilidade social e fragilizando a coesão comunitária.
O planejamento oficial
O PEAS 2024-2027 não ignora esse cenário. Pelo contrário, apresenta um planejamento detalhado em propósitos, estratégias e metas. Entre seus objetivos centrais estão:
• Ampliar a rede de proteção social, garantindo maior cobertura de serviços nos municípios;
• Fortalecer a gestão descentralizada e participativa, com conselhos de assistência atuando de forma mais efetiva;
• Integrar políticas públicas, conectando assistência social, saúde, educação e geração de trabalho e renda;
• Aprimorar indicadores de monitoramento e avaliação, para acompanhar resultados concretos na vida das pessoas .
A urgência do pacto necessário
O Amazonas precisa, portanto, firmar um pacto de corresponsabilidade social.
Não se trata de buscar culpados, mas de assumir que a solução está em criar mecanismos de gestão integrados, transparentes e participativos.
Cada real recolhido pela indústria deve se converter em resultado mensurável para a população. Sem isso, os bilhões continuarão sendo apenas números. Com isso, podem se tornar a senha de uma nova configuração social e econômica do estado.
Follow-Up é publicada às quartas, quintas e sextas feiras no Jornal do Comércio do Amazonas sob a responsabilidade do CIEAM e coordenação editorial de Alfredo Lopes, editor do portal Brasil Amazônia Agora