Garantir recursos para que a restauração de paisagens e florestas aconteça é crucial para a implementação de projetos e iniciativas em todo o país. Porém, criar mecanismos financeiros que se mantenham ao longo do tempo ainda é um dos grandes entraves para que a restauração ganhe escala.
Para resolver esse gargalo, entre as ações do projeto Pró-Restaura está a realização de um processo de escuta e articulação abrangente com representantes de organizações interessadas no tema, incluindo instituições financeiras dispostas a investir na restauração. O resultado dessas discussões mostra que, apesar de existirem muitos gargalos, é possível superá-los, aproveitando oportunidades e criando novas estratégias para acessar recursos.
Além disso, esse trabalho identificou que algumas fontes de recursos já estão disponíveis para produtores rurais ou gerentes de projetos de restauração. Confira abaixo os caminhos existentes para se chegar a esses recursos, e quais os desafios que ainda precisam ser resolvidos para acelerar e dar escala à restauração.
As instituições financeiras que financiam a restauração
Produtores interessados podem procurar linhas de crédito em bancos como o Banco do Brasil ou o Sistema de Cooperativas Financeiras do Brasil (Sicoob), sendo que este último pode criar linhas especiais e customizadas para atender à necessidade de produtores ou instituições vinculadas ao banco.
No Banco do Brasil, por exemplo, existem as linhas do Programa Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Programa ABC), criadas pelo BNDES, que colaboram no aporte financeiro para propostas de restauração. O banco também tem linhas como o Investe Agro, que apesar de ter taxas de juros superiores às do Programa ABC, são mais fáceis de serem mantidas pelo banco ao longo do ano, especialmente nos últimos três anos, quando os subsídios do governo vêm sendo reduzidos. É importante destacar que as técnicas de agricultura de baixo carbono incluídas nesta linha não consideram apenas a restauração de florestas, como também atividades para melhorar a qualidade do solo e a resiliência da produção agrícola. Outra opção são as linhas de crédito específicas ao produtor familiar, como o Pronaf Florestal, Pronaf Eco e Pronaf Agroecologia. Essas linhas têm juros subsidiados e maior prazo de carência do que o Programa ABC.
Nos bancos, as propostas são avaliadas por analistas capacitados, que também orientam os produtores na elaboração das propostas. Essa etapa garante ao investidor segurança na destinação do recurso, pois analisa informações como limite de crédito, renda, capacidade de gestão da proposta e a regularização ambiental – já que os bancos não emprestam dinheiro para quem não esteja com a propriedade regularizada e sem denúncias ou problemas jurídicos. Outro item importante que os bancos avaliam é se o cliente não tem dívidas que possam comprometer a aprovação de seu cadastro e a viabilidade econômica da proposta. Arranjos produtivos e espécies a serem utilizadas devem estar bem definidos para que garantam a geração de renda e estejam de acordo com o prazo do financiamento.
Para projetos florestais, é importante ter atenção às espécies de plantas incluídas na proposta. Mogno ou teca são exemplos de espécies cujo retorno econômico (média de 15 anos) pode superar o tempo do financiamento nos bancos que, corriqueiramente, chega a 12 anos. Em casos como esses, o ideal é combinar espécies florestais com outras que deem retorno econômico rápido e considerar a inclusão de culturas tecnicamente estabelecidas. Além disso, o banco ainda deverá analisar se a atividade pretendida enfrenta algum problema climático na região ou de mercado. Por isso, vale a pena dar atenção a tais fatores e fazer uma pesquisa sobre essas condições quando a proposta estiver sendo elaborada.
Outras fontes de recursos
Os bancos não são as únicas fontes de recursos. Produtores que não se enquadram ou não estão dispostos a se comprometer com as taxas praticadas pelas instituições financeiras podem buscar em outras instituições públicas ou privadas opções para elaborar um bom projeto de restauração.
Diversas outras fontes podem ser acessadas, como editais de instituições governamentais, empresas e cooperativas; recursos de fundos estaduais (como o Fundo de Recuperação, Proteção e Desenvolvimento Sustentável das Bacias Hidrográficas do Estado de Minas Gerais, conhecido pela sigla Fhidro, entre outros); doações; recursos de medidas compensatórias; ou recursos de conversão de multas ambientais.
Em geral esses financiadores não exigem um tipo de sistema produtivo específico, mas sim arranjos produtivos que mostrem resultados econômicos e de restauração. Isso significa que produtores podem buscar sistemas produtivos que gerem renda pela combinação de produção e restauração, como Sistemas Agroflorestais (SAFs), Integração Lavoura Pecuária e Floresta (ILPF) ou Lavoura-Pecuária e Silvipastoril. Para sistemas que têm como objetivo puramente a restauração para fins ecológicos, a recuperação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reserva Legal são atrativos, e a regeneração natural assistida tem mais chances de sucesso do que o enriquecimento com mudas, já que exige menor mão-de-obra para a manutenção.
Como superar os gargalos no financiamento da restauração
Os principais desafios relacionados a recursos financeiros destinados a restauração estão no acesso a linhas de financiamento, no estabelecimento de mercados para os produtos da restauração, além de capacitação e assistência técnica sobre o funcionamento de linhas de crédito. As experiências das aplicações da Metodologia de Avaliação de Oportunidades de Restauração (ROAM), e também as atividades desenvolvidas no projeto Pró-Restaura mostram que é importante difundir as possibilidades de financiamentos existentes e estabelecer uma nova cultura para acesso aos fundos, com adequação de editais e capacitação para elaboração de projetos. Não são só os produtores que têm dificuldades de avaliar um bom projeto: muitas vezes, os próprios funcionários dos bancos não têm informações disponíveis ou seguras dos sistemas produtivos propostos nem dos rendimentos esperados, o que aumenta muito o risco do banco e restringe a possibilidade de oferta de crédito.
Os principais meios para superar os gargalos envolvem a construção de um conhecimento conjunto entre produtores, técnicos, academia, centros de pesquisa, analistas financeiros e de mercado para produtos florestais, além do engajamento de atores desde a esfera de governo, por meio da participação de órgãos públicos e da incorporação desta demanda no escopo do planejamento das instituições, até o engajamento no nível local de técnicos e produtores. Entre as ações necessárias estão capacitar produtores, incorporar novas tecnologias, criar selos para que produtores envolvidos com a restauração sejam reconhecidos e melhor remunerados e capacitar técnicos para a elaboração de projetos de restauração que atendam às demandas dos produtores.
Recomendações e proposições
O rico debate entre organizações da sociedade civil, representantes de instituições governamentais e instituições financeiras permitiu elaborar algumas recomendações e propostas que podem viabilizar mecanismos financeiros e, assim, resultar em um cenário mais favorável à restauração:
- Elaboração de projetos que incorporem a geração de renda e a assistência técnica especializada contínua e com foco nas demandas de cada produtor.
- Alinhamento entre as empresas que financiam e as instituições responsáveis por projetos de restauração de paisagens e florestas.
- Formação de parcerias para a implementação, acompanhamento, monitoramento e suporte aos projetos e ao produtor.
- Manutenção dos investimentos ou subsídios por parte dos governos, especialmente do nível federal.
- Ampliar o escopo do financiamento para a unidade produtiva e não apenas para o produto.
Para que essas estratégias tenham maior alcance, uma perspectiva integrada pode ser mais eficiente. Isso significaria fazer um planejamento a partir de arranjos municipais com financiamentos complementares. Nesta proposta, é possível impulsionar a restauração com a combinação de financiamentos (como as linhas de crédito em bancos, por exemplo) entre produtores mais capitalizados e menos capitalizados, reduzindo riscos para financiadores e abrindo mais oportunidades para pequenas unidades produtivas.
O planejamento da restauração, quando observado a partir da escala sociopolítica da paisagem, pode abranger um número maior de unidades produtivas. Assim, há maiores chances de todos saírem ganhando e haver menos entraves para se atingir o objetivo de dar maior escala à restauração no Brasil.
Agradecemos aos participantes das entrevistas que colaboraram com informações e reflexões sobre como desenvolver Mecanismos Financeiros eficientes que apoiem a Restauração Florestal e de Paisagens. A identidade destes informantes é preservada por questões éticas que envolvem entrevistas, mas o reconhecimento ao trabalho das instituições das quais fazem parte fica registrado aqui: Banco do Brasil (BB), Sicoob Crediminas, MAPA (Gestão do Plano ABC), Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (FAEMG), Sebrae, Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), Empresa Assistência Técnica Extensão Rural (Emater), Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (IEMA-ES), Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (IDAF), Sindicato de Cruzeiro, Programa Arboretum e Agroicone.
Esse é o segundo de uma série de três textos do WRI Brasil sobre financiamento e fontes de recursos para a restauração. A série faz parte do projeto Pró-Restaura.
Fonte: WRI Brasil
Comentários