A Amazônia das águas e o protagonismo da ciência pública

O Amazonas, estado conhecido por sua monumentalidade fluvial, ainda dá passos inaugurais rumo à soberania sobre sua própria engenharia das águas. Neste cenário, emerge com vigor um marco histórico: a construção do primeiro Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do rio Tarumã-Açu, sob a liderança da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), com apoio do Governo do Estado e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).

A Iniciativa Representa um Avanço Técnico-Científico e uma Inflexão Política

Estamos afirmando que o conhecimento hidrológico da Amazônia deve ser produzido, apropriado e governado por seus próprios povos, com apoio das instituições locais. Em tempos de mudança climática, urbanização desordenada e crises ecológicas globais, dar centralidade à ciência das águas é reposicionar a Amazônia não como uma periferia a ser estudada, mas como uma matriz civilizatória capaz de ensinar novos paradigmas de convivência entre sociedade e natureza.

Do Saber Acadêmico à Engenharia da Esperança

A UEA não atua como mera operadora técnica desse plano. Nosso papel é o de articuladora de múltiplos saberes — indígenas, tradicionais, acadêmicos, tecnológicos — em prol de uma governança hídrica que seja democrática, inclusiva e ancorada em evidências. A bacia do Tarumã-Açu, pressionada pela expansão urbana de Manaus, é também símbolo de resistência hídrica e sociocultural.

Amazônia DAS AGUAS
Bacia do Tarumã

Desenvolvendo Modelos Preditivos e Sistemas de Monitoramento

Com o Plano de Recursos Hídricos, pretendemos desenvolver modelos preditivos, sistemas de monitoramento e propostas de uso racional das águas, com base em dados concretos e inteligência territorial. Mais do que um documento, o plano é infraestrutura de conhecimento. Ele nos permite antecipar cenários de escassez, aprimorar a alocação de água para abastecimento humano, agricultura e indústria, e estruturar uma política hídrica regional com base em justiça socioambiental.

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Ciência Amazônica para o Mundo

A Amazônia, como maior reservatório de água doce superficial do planeta, não pode continuar refém de diagnósticos exógenos e intervenções fragmentadas. O conhecimento deve emanar da floresta para o mundo, com protocolos próprios de escuta, pesquisa e validação. Por isso, este plano é também uma semente de soberania: a soberania científica das águas.

UEA: Uma Universidade Fluvial

Com este projeto, a UEA reforça sua identidade como uma universidade fluvial, comprometida com a floresta em pé, os rios livres, as comunidades ribeirinhas e a justiça climática. A Amazônia precisa de planos — sim —, mas sobretudo de sentido e direção. O Plano de Bacia do Tarumã-Açu é um plano com alma: nasce do chão, corre como rio, escuta como floresta.

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(Dado Galdieri/Hilaea Media)

Planejando para Resistir, Pesquisando para Transformar e Educando para Cuidar

Seguiremos assim: planejando para resistir, pesquisando para transformar e educando para cuidar. Que o exemplo da Bacia do Tarumã-Açu nos inspire a inaugurar uma nova era de políticas públicas em que a água amazônica seja tratada não apenas como recurso, mas como patrimônio ecológico, espiritual e civilizatório.

André Zogahib
André Zogahib
André Zogahib é Reitor da Universidade do Estado do Amazonas e Doutor em Administração pela UFMG

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