Nesta terça-feira, o Amazonas celebra a memória de Gilberto Mestrinho, um de seus mais ardorosos defensores, e um dos críticos mais ferozes da hipocrisia ambiental, ainda em voga. Em 1992, quando o planeta reuniu-se no Rio de Janeiro para acusar supostas queimadas na Amazônia, como causa do aquecimento global, ele chamou algumas lideranças do Planeta a passear na floresta, entre as quais o primeiro-ministro da Alemanha, Helmuth Kohl, com quem sobrevoou a mata, pedagogicamente, apontando a diferença entre fumaça e neblina. No ano seguinte, Kohl empenhou-se em estreitar colaboração com o Amazonas, de olho, naturalmente, no ordenamento institucional para o manejo florestal. Afinal, o sindicato dos madeireiros, que inclui a indústria plástica, é a maior força política tedesca. Com isso, ambos começaram a desmontar o sofisma do primado da ecologia sobre a sociologia, uma desfaçatez política sem precedentes na qual muita gente dita consciente ainda embarca. Enquanto os dirigentes do planeta queriam “salvar” a Amazônia deixando-a intocada, Gilberto, o Boto, fazia barulho no Fórum Global, evento simultâneo da Conferência da ONU, com entrevistas – ao lado de Alvim Toffler, um escritor visionário e polêmico – erguendo a bandeira da biotecnologia como premissa do desenvolvimento e equilíbrio climático. O Brasil, afirmava, paga um preço muito alto por seu atraso na corrida biotecnológica, repetindo o equívoco de fazer o que fez com a reserva de mercado para a informática. Nada mais atual.
Com esta convicção e missão, e de braços com a representação acadêmica local, Ufam e Utam, Mestrinho, pós-Rio 92, foi convidar pessoalmente o Instituto Tecnológico de Massachussets e o Technion, o Instituto de Tecnologia de Israel, as maiores referências de tecnologia e biotecnologia nos anos 90, para instalarem-se em Manaus. Foi boicotado pelos arautos da paranoia e do atraso. Depois, no Senado, tratou de assegurar recursos no Orçamento – cuja comissão mista do Congresso dirigiu por três oportunidades – para a Ufam e Embrapa, com quem mantinha estreita interlocução. Empenhou-se na instalação de uma unidade da Embrapa em Tabatinga, sede da mesorregião do Alto Solimões, a mais pobre do Estado e uma das mais ricas em recursos naturais. Com sua saída da vida pública e falecimento, o núcleo perdeu o padrinho e a existência. Na criação do CBA (Centro de Biotecnologia da Amazônia), atuou junto a FHC e Marco Maciel, filho e marido de amazonenses, para resguardar o apoio político e material da empreitada, fulminada, em seguida, pelos arautos da sombra.
Nessa interlocução visionária, em discurso polêmico no Senado em março de 2003, Gilberto chamava a atenção para a ausência do Brasil nos negócios da biotecnologia, cobrava do INPA a transformação de seus inventários em oportunidades de mercado para impulsionar a economia cabocla sem biotecnologia, resta ao país a ausência nos negócios dos defensivos agrícolas, com passe livre para os pesticidas importados contaminarem livremente a genética humana, o solo e a água. E para denunciar os defensores da intocabilidade amazônica, respaldava e defendia a adoção inteligente dos sistemas de integração desenvolvidos pela Embrapa, dentro das áreas que a lei permite manejar, para a produção de grãos, fibras, madeira, energia, leite ou carne numa única área, em plantios em rotação, consorciação e/ou sucessão. Nas estações climáticas da Amazônia, indagava, por que não incentivar o plantio durante o verão de culturas agrícolas anuais (arroz, feijão, milho, soja ou sorgo) e de árvores, associado a espécies forrageiras? Só mais recentemente, com a credibilidade de entidades como a Faea (Federação de Agricultura do Estado do Amazonas), o Amazonas começou a acordar para a combinação equilibrada entre os componentes agrícola, pecuário e florestal, considerando espaço e tempo disponível, resultando em diferentes sistemas integrados, desenvolvidos com sucesso como lavoura-pecuária-floresta, entre outros. Um avenida de oportunidades. Dia 29, Amazonas vai reunir a tribo para combinar caminhos alternativos, a produção de novas matrizes de negócios, bionegócios, coerentes com sua vocação e focados na interiorização do desenvolvimento do Beiradão, como o Boto sempre quis.
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Eu conheci Gilberto Mestrinho através de uma carta. Vi nela a importância que meu pai tinha. Ele, Gilberto, escreveu para meu pai, acho que era Natal, desejando Boas Festas e Feliz Ano Novo. Meu pai era um simples trabalhador braçal e acho que nunca viu Gilberto na vida, mas eu não tinha a consciência disto. Só achava que alguém que escrevesse ao meu pai, a quem eu amava tanto, só poderia ser importante. Por isso votei nele naquela eleição.