Atento e participativo nos desafios da infraestrutura logística na Amazônia, o professor Augusto Cesar Barreto Rocha oferece uma visão crítica e profunda sobre o problema. É eloquente sua percepção dos obstáculos enfrentados: culturais, propositais e circunstanciais. E sua clareza é contundente: “o Brasil, historicamente, não tem integrado a Amazônia como parte essencial da nação”. Falta vontade política e sobra visão econômica predatória de quem prefere explorar a desenvolver a região.
Ele defende o adensamento do Plano Amazonense de Logística e Transportes (PALT) como ferramenta de mobilização para superar os gargalos logísticos históricos que travavam o desenvolvimento econômico sustentável da região. O governo Lula se revelou presente em apoios mas ainda são tímidas as ações. Falta ressonância mais forte e consistente em Brasília.
Rocha faz um alerta: precisamos de humildade para admitir que a Amazônia é maior do que todas as concepções. Carecemos do entendimento profundo e respeitoso da complexidade da Amazônia, para fugir das soluções superficiais que não atendem às necessidades reais da população. Confira!
Coluna Follow-Up
Entrevista com Augusto Rocha por Alfredo Lopes
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Alfredo Lopes – Em seus artigos, você tem alertado para alguns descaminhos do conformismo recorrente para descrever a fragilidade crônica da infraestrutura regional e a inapetência para o devido enfrentamento. Na sua opinião isso é cultural, proposital ou circunstancial?
Augusto Rocha – Entendo que é ao mesmo tempo as três coisas. Gostei de suas classificações. É cultural, na medida em que o Brasil não vê a Amazônia como irmãos em República, resgatando algum inconsciente histórico desde o Grão-Pará. Neste sentido, é proposital, pois não há interesse em desenvolver e transformar, dado o esforço enorme que é necessário, sendo mais rentável se apropriar ou explorar as riquezas e isto é recorrente na fala de muitas pessoas.
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No outro aspecto, é circunstancial, pois as circunstâncias atrapalham a transcendência – falta-nos uma clareza de nossa história e do papel histórico da Amazônia e de sua conexão ao país. Portanto, há uma enorme oportunidade e o que tenho chamado a atenção é que a oportunidade pode transcender estas dimensões e tem, em si, a possibilidade de unir-nos pela ganância ou pelo interesse, para si ou para nós.
AL – A contrapartida fiscal da Indústria se baseia principalmente no gargalo logístico, uma atribuição e dívida federal que se arrastam desde o século XX, na quebra do II Ciclo da Borracha. Como transformar o Plano Amazonense de Logística e Transportes (PALT) numa plataforma de luta efetiva de mudanças estruturais?
Augusto Rocha – Tenho insistido nele porque a infraestrutura é o que mais nos falta. Temos pessoas, inteligência e recursos naturais. Entretanto, no século XXI, sem o transporte com viabilidade tudo se torna impossível. Basta ver o que já fazemos, com todas as limitações. O aeroporto é o terceiro do país em carga – mas o voo de Porto Velho para cá é mais caro do que daqui para a Europa.
Temos um volume de cerca de 40% dos contêineres movimentados do país, mas não temos porto público nem hidrovia. Imagine o que poderia ser feito se houvesse condições minimamente semelhantes ao Sudeste Asiático ou do Brasil. O que lamento é que os discursos de apoio são entusiasmados num primeiro momento regional, mas não temos encontrado toda a ressonância necessária em Brasília.
AL – Os problemas reais da Amazônia e de sua economia estão restritos a velhas narrativas e ocas apologias que reforçam o não enfrentamento local e federal. Podemos supor que essa desesperança é resultado da ausência de lideranças?
Augusto Rocha Temos lideranças. Temos muitas lideranças. Há expressividade nacional – o que precisamos é de mais lideranças e a coragem de oxigenar o ambiente, colocando mais e mais pessoas nos espaços nacionais. Vejo muitos talentos novos na Universidade. Há um universo de jovens ávidos por contribuir e esperando esta chance, mas há um medo de deixar esta nova geração ocupar o espaço.
AL – DNiT, Antaq, Marinha, entre outras entidades e agências públicas e privadas nunca se reuniram tanto para sugerir e prometer tantas ações e intervenções. O que andou e o que faltou, às vésperas de nova vazante extrema, para o debate ser traduzido em providências e soluções?
Augusto Rocha – O que andou é que seguimos o diálogo e a lógica institucional. O Brasil é um país complexo e com regras – respeitamos estas regras e conseguimos compromissos e interações muito produtivas. O que andou? Somos ouvidos. O que não andou? Seguimos a acreditar que todos entendemos tudo de Amazônia e nenhum de nós entende verdadeiramente de Amazônia – ela é muito complexa e devemos ter a humildade para aceitar esta nossa insignificância. Enquanto não assumirmos isto, seguiremos a subutilizar esta dádiva.
Seria bom se ao menos a fome e a pobreza nos unisse, mas a maior parte das pessoas não está disposta nem a enfrentar o problema da mobilidade urbana em Manaus. Seguimos com o pensamento ancorado nos anos 1970, enquanto o mundo está na Indústria 4.0 e intervenções dinâmicas no trânsito repleto de bicicletas. Por aqui, ainda há o sonho de ter um carro, enquanto as pessoas, na média, nem se alimentam direito – nem de livros, nem de comida. O que anima é que há muito por ser feito.
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade
Alfredo é filósofo, foi professor na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo 1979 – 1996, é consultor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas, ensaísta e co-fundador do portal Brasil Amazônia Agora
Coluna Follow-up é publicada às quartas, quintas e sextas feiras no Jornal do Comércio do Amazonas,
sob a responsabilidade do CIEAM e coordenação editorial de Alfredo Lopes, editor do portal BrasilAmazoniaAgora.
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