Diálogos da Amazônia com Paulo Roberto Haddad UFMG e Rodemarck Castelo Branco – UFAM
Um debate digno de ser incluído na agenda parlamentar amazônica e brasileira nas próximas eleições. Um debate denso sobre redução das desigualdades regionais do Brasil foi travado neste primeiro de agosto de 2022 por dois economistas de peso, Paulo Roberto Haddad – PRH professor emérito da UFMG e Rodemarck Castelo Branco – RCB professor da UFAM e consultor de empresas, em Manaus. O evento se deu no âmbito dos Diálogos da Amazônia, da Fundação Getúlio Vargas, sob a coordenação de Márcio Holland e Daniel Vargas, professores da instituição.
Notas de Alfredo Lopes
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Coluna Follow-up
O abandono das políticas de desenvolvimento regional
O ponto de partida de ambos foi a falência das políticas públicas de desenvolvimento regional que descrevem o desempenho dos últimos governos, notadamente nas duas décadas deste século. A Zona Franca de Manaus é o único programa fora dessa curva e que deu certo como como empurrão em seus acertos na política de redução das diferenças brutais entre o Sul e o Norte do Brasil. Muito esforço e muitos obstáculos para evoluir na diversificação, adensamento e interiorização de suas oportunidades econômicas, é a Zona Franca de Manaus. Os dois economistas apontam algumas causas do esvaziamento dessas políticas e, no caso da ZFM, eles sugerem algumas medidas de curto e médio prazo, descrevendo os instrumentos e premissas dessas iniciativas. Ambos concordam que as saídas são endógenas, ou seja, não cairão do espaço nem podem ser geridas por propostas fechadas, impostas e exógenas.
RCB identifica na crise de estabilização da economia brasileira os primórdios do abandono das políticas de desenvolvimento regional. “O Brasil praticamente concentrou seus esforços nessa busca de estabilização da economia através de análises e medidas macroeconômicas. Restaram iniciativas isoladas, com investimentos tímidos e ações descontinuadas a cada gestão, com ações na contramão das demandas regionais, além da ausência de planejamento de curto e médio prazo. No caso do Amazonas, o TCU e o MPF-AM flagraram a absoluta desconexão da presença federal no Estado, a falta de coordenação e ação compartilhada ocasionando desperdício de recursos humanos e materiais e mais distanciamento entre o ente federal e os desafios locais. O PIB da Amazônia cresceu, porém os problemas sociais explodiram. Faltaram os investimentos em infraestrutura e as instituições federais e locais de fomento, pesquisa e desenvolvimento foram deprimidas em seus recursos e rendimento.
As desigualdades regionais
“As desigualdades regionais não são apenas econômicas, são desequilíbrios sociais, educacionais e tecnológicos e essas diferenças precisam ser atacadas”. Tínhamos a SUDAM, a SUDENE, a SUDECO, uma autarquia para cada uma das regiões menos desenvolvidas, Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e pouco ou quase nada resta de seus recursos e atuação. Quem escapou do esvaziamento foi a SUFRAMA, que não se enfraqueceu no mesmo nível que as demais organizações regionais porque mantém um foco muito bem definido de administração dos 8% de incentivos que nos restam.
Em ação conjunta com as empresas e o poder público local e parlamentar, e com planejamento técnico e industrial, busca manter o Polo Industrial de Manaus voltado para expansão tecnológica e produtiva de sua capacidade fabril instalada. Infelizmente, só há bem pouco tempo os recursos de P&D&I passaram por rigorosas análises e estudos para que sejam majoritariamente aplicados na região. Afinal, com a transição tecnológica, os produtos da ZFM correm o risco da obsolescência.
O que nos leva a afirmar categoricamente que o futuro da região está condicionado a investimentos em ciência, tecnologia e inovação, com apostas robustas em qualificação dos recursos humanos e parques de inovação tecnológica e biotecnológica. Essa diversificação e adensamento vão evoluir na direção da produção regional de produtos com tecnologia mais avançada, bioeconomia pujante e aproveitamento sustentável dos recursos minerais e dos serviços ambientais. Para RCB, as atividades sustentáveis resultantes dessa movimentação vão criar uma civilização tropical evoluída que levará consigo o país como um todo na medida em que temos recursos de toda ordem e riquezas das mais diversas para fazer do Brasil uma grande nação.
Paulo Roberto Haddad – PRH
Com a bagagem de quem atua na Amazônia efetivamente há mais de quarenta anos, o ex-ministro da Fazenda e do Planejamento, PRB, começou sua exposição contando os avanços alcançados em outros países, como os Estados Unidos, no pós-guerra, com suas respectivas políticas de desenvolvimento regional e os resultados desastrosos do abandono posterior dessas políticas. Ou seja, a descontinuidade das políticas de desenvolvimento não podem ser interrompidas abruptamente sob pena de deixar a comunidade em estado de depressão socioeconômica pior do que a paisagem original.
No Brasil, o processo se deu por falta de planejamento e de conhecimento. Os programas de desenvolvimento regional e nacional, iniciado no pós-guerra, com a falência do II Ciclo da Borracha na Amazônia, e no Brasil com o Plano de Desenvolvimento da era JK, 50 anos em 5. Tais foram descontinuados, notadamente, pela exploração predatória dos recursos naturais. A Mata Atlântica que cobria a orla marinha com 8.000 km de floresta, hoje só tem 8% da cobertura original. Os 2800 municípios dessa área hoje, em sua maioria, tem a economia deprimida por obra e graça da destruição de suas florestas, mananciais e recursos hídricos.
Hoje o Estado de Rondônia começou a diversificar sua produção agrossilvopastoril porque priorizou a recomposição florestal. É o maior produtor nacional de peixe e, em breve, de café. A economia se torna robusta com quem assim procede. Afinal, as florestas oferecem umidade, sombra, pesticidas naturais, polinização, captação de carbono, expansão da presença do oxigênio na atmosfera, entre outras e infinitas vantagens e possibilidades.
A partir de 2008, as riquezas de cada país, tradicionalmente traduzidas pelo PIB, passaram a incorporar os valores de uso e não-uso de suas florestas e rios, econômicas, suas redes de águas e de outros minerais e da biodiversidade. “E quando este cálculo passou a ser adotado, englobando o acervo econômico financeiro, a Amazônia passa a ser a região mais rica do Brasil, com seus estoques naturais, seus recursos hídricos, genéticos, minerais e de serviços ambientais”. Ora, com as queimadas e o desmatamento, se a Amazônia perdeu 20% de sua cobertura vegetal isso representa 1/5 a menos de seus recursos genéticos, bióticos, farmacológicos, dermocosméticos e de alimentação funcional e integral. O mesmo se dá com a destruição da bacia hidrográfica com a mineração criminosa, onde perdemos ativos e vidas, nas águas, nas comunidades primitivas e na reputação diplomática.
E o prejuízo extrapola o bioma e compromete o clima, os reservatórios no continente, a agricultura do Centro-Oeste. Os rios voadores que se formam a partir da umidade florestal da Amazônia, reconhecidos pela Ciência, não podem ser deprimindo pois deixam em seu lugar os desastres ambientais, a crise hídrica, o esvaziamento do agronegócio. Em suma, perdas e mais perdas em nosso acervo nacional de riqueza e cadeia de valor. Essa gestão equivocada tem causado as crises do setor agrícola, perdas na economia do café, uma cadeia de valor onde já ocupamos o topo do ranking mundial.
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