Por Thomaz Nogueira
Enquanto o Mundo tenta se desviar do caos e se reencontrar em Glasgow (COP26), a gente segue aqui torcendo para que dê certo. Nunca o já clássico mote ambiental “Think globally, act locally” (pense globalmente, aja localmente) se mostrou tão pertinente. Um olho no pires, outro no gato. Um olho em Glasgow e outro em Pindorama.
O que preocupa é ignorarmos os sinais de Glasgow, para agirmos localmente. Esqueça Paulo Guedes, porque esse não entrega resultados, é um falastrão.
Lá, o início dos trabalhos trouxe alguma esperança. A dúvida é: as promessas, os compromissos assumidos, serão honrados? O ceticismo é grande, mas o passo à frente está sendo dado. Não na velocidade que muitos gostariam, mas na direção correta.
O desafio é ajustar bússola e relógio. O Primeiro-ministro Britânico, o conservador Boris Johnson, alertou na abertura da Conferência: “It´s one minute to midnight.”. Agora é “um minuto para a meia-noite”, na corrida para evitar que o aquecimento global ultrapasse um limite crítico. Barack Obama disse que “não estamos nem perto de onde deveríamos estar.”
O interessante de acompanhar mais de perto esses debates e reuniões é verificar o quanto o posicionamento dos líderes mundiais dá uma embolada conceitual, quando comparado com o posicionamento das nossas correntes políticas. É interessante ouvir os alertas de Boris Johnson e outros líderes conservadores, porque por aqui mudanças climáticas e conservação da Amazônia são praticamente coisas de comunista. Mas, vamos ao que interessa, esqueçamos as picuinhas.
Ok, Think globally, act locally. Vamos lá. Queiramos ou não, estamos no coração da maior floresta tropical do planeta, e temos de fazer nossa parte, dar nossa contribuição.
Se é fato que recorrentemente citamos na defesa do PIM (Polo Industrial de Manaus) o seu papel como vetor de preservação da floresta. É fato, também, que nos últimos anos consolidou-se o consenso de que precisamos diversificar a Matriz Econômica do Estado. Devemos buscar atividades inclusivas das comunidades interioranas, baseadas na Bioeconomia. (Foi daqui que Paulo Guedes copiou suas ideias originais, expostas em Glasgow)
Queiram ou não, já mostramos à exaustão o papel “ambiental” que o Polo Industrial desempenha, ao oferecer uma alternativa formal de atividade econômica, centralizada no espaço urbano da capital. Ou seja, em menos de 0,003% do território do Estado o PIM gera emprego, renda e receita pública bastante para nossa sustentação econômica, e contribui com a preservação da floresta. De novo essa estória? Claro. Como diria o Cel. Gissoni, meu professor de matemática no Colégio Militar, “isso tem de ir para a massa do sangue”. Tem de ficar claro!!
Por isso, acting locally, é que entendo ser importante chamar atenção para um assunto de natureza técnica, é fato, mas que deveria estar sendo discutido intensamente pela sociedade organizada, e tem a ver com a preservação da floresta. Mas um silêncio ensurdecedor está a incomodar. Afinal, do que se trata? Simples: É a proposta da nova Lei de Incentivos Fiscais do Amazonas.
Para o entendimento dos leigos. O prazo final do modelo Zona Franca de Manaus estava estabelecido para 2023, aí o Governo Dilma Rousseff propôs a prorrogação por mais 50 anos. Então, agora o prazo é 2073. Isso engloba os incentivos federais e os estaduais. Só que a Lei Estadual de Incentivos atual tem vigência só até 05 de outubro de 2023. Então uma nova lei tem de ser feita.
A nova lei é uma oportunidade, não apenas para um ajuste, mas para nos adequarmos às profundas mudanças econômicas ocorridas nos últimos 20 anos. É uma oportunidade para avaliarmos a eficácia e a necessidade de incentivos em cada situação concreta. É momento de corrigir rumos, de rever fragilidades, de considerar as críticas que sofremos. É momento de construirmos as pontes para o futuro. De estabelecermos os mecanismos de “esverdeamento” da nossa economia.
Há inúmeras questões postas. “O tempo ruge”, investimentos precisam de segurança jurídica. Ninguém vai fazer um projeto sem saber o que acontece daqui a dois anos. A segurança jurídica é apenas o pilar fundamental, mas há muitas outras questões mais e a sociedade precisa ser ouvida. As instituições de classe, sejam as empresariais (FIEAM e CIEAM), sejam de trabalhadores (Centrais e Sindicatos), precisam ser consultadas.
No entanto, ainda que importante, essas instituições representam os interesses presentes, mas é preciso pensar em algo diferente para o futuro.
Não tenho a pretensão de ter sido o primeiro, ou o único, a falar sobre a necessidade dessa diversificação da matriz econômica do estado, mas tenho a satisfação de ter participado, com representantes da academia, servidores públicos qualificados e empreendedores, do esforço de consolidação de uma proposta consistente e factível.
Uma primeira diversificação, a que chamamos de endógena, seria do próprio polo industrial, atraindo novos segmentos e setores distintos do que já temos; e uma outra diversificação mais qualitativa que por meio da utilização dos recursos naturais, faça uma ocupação econômica racional do interior do estado.
O Polo Industrial joga um papel fundamental nessa evolução, primeiro porque fazendo sua própria evolução ganhamos todos, mais empregos, mais renda, mais conservação. Segundo, porque dele virá os recursos necessários para a diversificação econômica fundada na Bioeconomia.
E o que diz a nova lei sobre isso? Muito pouco ou nada. Há múltiplos e possíveis caminhos, o debate e a discussão pública podem gerar a luz.
Há um ano, em discussão conduzida pela FAS- Fundação Amazônia Sustentável, foi proposto a criação de um fundo dedicado a essa diversificação, ao desenvolvimento da Bioeconomia. Hoje, insistimos na proposta. Há espaço fiscal para isso. Nem precisa aumentar a carga tributária, basta direcionar, de forma mandatória, recursos que hoje já são arrecadados.
Veja como o Polo Industrial é importante no financiamento dessas alternativas, uma alavanca. O Orçamento Estadual proposto para 2022 é da ordem de R$ 24,0 bilhões. Prevê-se a arrecadação de R$ 14,0 bilhões de ICMS. Não esqueça que o PIM é o motor da economia, sem ele mesmo a arrecadação do comércio despencaria. Já a contribuição direta das indústrias para a UEA está prevista na ordem de R$ 560,0 milhões, e para o FTI – Fundo de Fomento ao Turismo, Infraestrutura, Serviços e Interiorização do Desenvolvimento do Estado do Amazonas, serão mais R$ 1,35 bilhões. O FTI redesenhado pode ser esse vetor de aceleração da nossa economia.
Ademais, é preciso avaliar e definir se e quais subsídios são necessários, ainda que alguns tenham insônia com o tema. Diríamos que parte sim, além do efeito China – o mais importante, outros Estados também concederam subsídios de forma irregular, que foram convalidados em Lei Complementar, e se não os mantivermos o Amazonas perde a produção, empregos e arrecadação. Mas alguns, mesmo oriundos do setor industrial, afirmam que há produtos que devemos avaliar, se o incentivo fiscal federal pode ser bastante e suficiente para manter o diferencial competitivo. Há que se aprofundar a análise.
Defendemos o debate para extrairmos da divergência a solução correta.
Não é simples. Alguns defendem que Televisões e Motocicletas seriam produtos cuja proteção federal, possivelmente, seria forte o bastante, a dispensar o incentivo estadual. No entanto, os dois produtos vivem cenário incerto. Vivem situações em que a mudança tecnológica têm impactado profundamente a correlação hoje estabelecida.
Os aparelhos de TV´s, tal como os conhecemos, tenderiam a se modificar no futuro imediato. Grande parte do público já usa, na maior parte do tempo, os serviços de streaming ou internet diretamente. As próprias TV´s abertas já disponibilizam seus conteúdos nessa modalidade (Globoplay, Bandplay etc.) e aí abre-se a possibilidade de se intensificar a produção de displays, via Lei de Informática, fora de Manaus. Outros afirmam que por razões técnicas seria inviável.
As motocicletas também estão vivendo o desafio da mudança. Mudança de paradigma da motorização. A motocicleta elétrica já é uma realidade e a sua “generalização” está ali na esquina. E nessa mudança, a produção em outros Estados, antes incipiente, começa a crescer. Precisamos agir para preservar esse polo.
Mas não há consenso entre os que estudam essas questões. E antes de ser um defeito, essa falta de consenso, intensifica, impõe a necessidade do debate.
O Governo já entregou sua proposta para análise do Centro das Indústrias. É preciso ampliar esse debate.
A Prefeitura de Manaus, que criou comitê específico para tratar das questões específicas do modelo Zona Franca, com certeza deve estar interessada em opinar. O prefeito conta nos seus quadros, neste comitê, com um ex-Superintendente da Suframa, um ex-Secretário de Fazenda, além de ex-parlamentar conhecido pela expertise no tema.
Em que momento se aprofundará o debate? Antes ou depois do envio à Assembleia Legislativa? Em cada hipótese estratégias especificas, são possíveis. Quantas audiências públicas estão planejadas?
Insistimos. O assunto reverbera na vida de cada um, seja um profissional vinculado diretamente ao Distrito Industrial ou não. O PIM é o motor de nossa economia. É chegado o momento de implementarmos o que temos discutido sobre a diversificação da economia.
E se a Reforma Tributária mudar tudo? Perguntam alguns. A questão aqui é simples. Se não houver reforma precisamos ter a melhor lei possível para os próximos anos. Se vier a reforma, ela precisará respeitar os direitos adquiridos estabelecidos.
Nosso objetivo, neste texto, não foi discutir a proposta colocada, e há inúmeros pontos a criticar, mas sim suscitar o debate. Não é possível que um tema tão relevante tramite de forma tão silenciosa e não submetida ao crivo da discussão pública.
É a nossa contribuição!
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