Com mudanças climáticas, Doença de Chagas volta ao radar com potencial expansão na Amazônia

O aquecimento global pode tornar regiões antes consideradas seguras mais propícias à presença de vetores, ampliando o risco de transmissão da doença de Chagas

Um estudo recente publicado em Medical and Veterinary Entomology, conduzido por pesquisadores da UFMT, UFPA, Instituto Evandro Chagas, UFRA e da Universidade de Bristol, alerta para o risco de que o aquecimento global favoreça a expansão dos barbeiros, insetos vetores da Doença de Chagas, para novas áreas da Amazônia.

A pesquisa se baseou em mais de 11 mil registros de ocorrência de 55 espécies de triatomíneos (barbeiros) e utilizou modelagem de nicho ecológico para prever cenários até 2080, considerando variáveis como clima, vegetação e relevo. Os resultados indicam que o aquecimento global pode tornar regiões antes consideradas seguras mais propícias à presença desses vetores, ampliando o risco de transmissão da doença.

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| Foto: Erwin Huebner / Wikimedia Commons

Transmissão da doença

A Doença de Chagas, provocada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, é transmitida principalmente por insetos hematófagos conhecidos como barbeiros. Originalmente uma zoonose silvestre que circulava entre animais da floresta, a enfermidade passou a atingir humanos de forma acidental, sobretudo a partir do momento em que populações começaram a invadir habitats naturais desses vetores.

Endêmica na América Latina, a doença tem raízes ligadas principalmente às zonas rurais e a contextos socioeconômicos vulneráveis. As condições precárias de moradia e higiene, como casas de barro e palha, oferecem abrigo aos barbeiros, favorecendo a transmissão.

Além disso, a forma como o ser humano explora e ocupa o território é um fator determinante na expansão ou reemergência da doença: por isso, desmatamentos, construções precárias e a alteração do ecossistema podem levar a novas ocorrências da enfermidade em regiões anteriormente consideradas seguras – é o que projeta o estudo recente.

Com mudanças climáticas, Doença de Chagas volta ao radar com potencial expansão de vetores na Amazônia.
Com mudanças climáticas, Doença de Chagas volta ao radar com potencial expansão de vetores na Amazônia | Foto: Divulgação/UFPA

Segundo matéria do g1, em 2006, o Brasil recebeu da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) a certificação de interrupção da transmissão vetorial pelo barbeiro Triatoma infestans (o principal vetor no país) e por hemotransfusão. Apesar disso, a doença ainda é um desafio de saúde pública, sobretudo em regiões com moradias precárias.

Estratégias de prevenção

As descobertas do estudo oferecem ferramentas valiosas para a antecipação de estratégias de prevenção, monitoramento e fortalecimento do sistema de saúde. Embora ainda não seja possível determinar com precisão quantas pessoas serão afetadas, a identificação de áreas com potencial aumento de risco já representa um avanço fundamental na proteção das populações mais vulneráveis.

Essa metodologia pode ser ampliada para outras doenças tropicais negligenciadas, como dengue, leishmaniose e malária. A geração de dados espaciais detalhados pode servir de base para políticas públicas mais eficientes e direcionadas. Tal como ocorre com os mapas de risco para desastres ambientais, como enchentes e queimadas, é possível criar mapas de vulnerabilidade para doenças infecciosas, o que contribui para a construção de cenários previsíveis e para a elaboração de estruturas de resposta antecipada.

Doença de chagas é estudada no Amazonas.
Doença de chagas é estudada no Amazonas — Foto: Divulgação

Isso permite que medidas de controle e proteção sejam implementadas antes que os surtos se agravem, prevenindo crises sanitárias e garantindo maior resiliência dos sistemas de saúde pública.

Isadora Noronha Pereira
Isadora Noronha Pereira
Jornalista e estudante de Publicidade com experiência em revista impressa e portais digitais. Atualmente, escreve notícias sobre temas diversos ligados ao meio ambiente, sustentabilidade e desenvolvimento sustentável no Brasil Amazônia Agora.

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