CBA: as métricas da transparência

A celebração de Tiradentes, o herói nacional que pagou com a vida a ousadia de contrariar a ganância fiscal da Coroa Portuguesa, teve manifestação curiosa e sombria envolvendo os interesses da Amazônia, da Zona Franca de Manaus e o futuro desta região. Na calada sombria do autoritarismo, a direção do InMetro removeu a equipe responsável pela gestão do Centro de Biotecnologia da Amazônia, como se dele fosse o proprietário e não um servidor. E, momento seguinte, tão autoritário quanto, já comunicou à praça um de seus apadrinhados para dirigir essa instituição tão emblemática e controversa.

Tudo isso, num momento em que o país clama por transparência e trato competente, construtivo e colaborativo na gestão dos recursos públicos. Cabe recordar que o CBA é obra construída com os recursos pagos pela indústria, as taxas da Suframa, verba não-orçamentária, ora retomada pelo governo federal depois de suspensa pela Suprema Corte do Brasil, que entendeu como inconstitucional sua cobrança.

O CIEAM, através de seu presidente, Wilson Périco, já anunciou que, se não for criado um conselho gestor desses recursos, representativo de toda a Amazônia Ocidental, área da Suframa, para reter e aplicar as novas taxas na região, as empresas voltarão a questionar as cobranças na Justiça. Cabe recordar, ainda, que a equipe do CBA, ora destituída, foi credenciada pelas entidades do setor produtivo após montar seu plano de trabalho ouvindo as demandas, sugestões e assegurando canais interativos de gestão local compartilhada.

Esta aproximação – cabe também registrar – gerou um formato não-governamental de associação, reunindo cientistas, empresários e profissionais liberais comprometidos com os destinos da região.
A estória sem agá da inclusão do InMetro – a Suframa não tem profissionais com perfil de gestão de bionegócios –  se deu com data marcada e o prazo se esgota em dois meses. Também se esgota o prazo do Acórdão TCU/MPF, de abril de 2016, para conferir o CNPJ do CBA. E ainda para que a União defina um gestor responsável pela coordenação da ação federal na Amazônia, preferencialmente a Suframa por seus atributos e histórico de acertos.

Trabalhar com InMetro tinha por finalidade compartilhar expertises de P&D e mercado. Quem continua pagando a conta, porém, é Suframa, gestora dos incentivos da ZFM, que recolhe aos cofres federais mais de 50% da riqueza aqui produzida. Todos os ministérios correlatos ao CBA se arvoram seus donos e desde 2003, por conta dessa predatória e insana fogueira de vaidades, o CBA continua sem a definição de seu modelo de gestão.

Existem 120 encomendas da indústria, tanto local, nacional e internacional de produtos e serviços do CBA, o mundo está de olho nas resinas, polifenóis, fibras, insumos cosméticos, farmacológicos e nutracêuticos já descobertos pelo CBA. Só lhes falta um CNPJ para começar a executar tudo aquilo que seus patrocinadores esperam em troca dos mais de R$ 120 milhões investidos nas instalações do prédio e laboratórios monumentais.

Isso é caso de polícia, no caso, polícia psiquiátrica, pois os rumores dão conta de intrigas pessoais e passionais envolvidas. Razões semelhantes, dizem os bastidores, explicaram a estúpida expulsão da Novartis, que iniciara uma parceria com o CBA no início do milênio, que transformaria Manaus numa cidade de Biotecnologia como a empresa suíça instalou nos trópicos de Cingapura.

O CBA não pertence ao InMetro, nem pode ser governado a partir do Rio de Janeiro, muito menos pelos burocratas despreparados e apadrinhados pela classe política. Não abrimos mão do apoio do ministério do Desenvolvimento, da Ciência e Tecnologia, das Forças Armadas, do Meio Ambiente, Agricultura e Planejamento, mas a gestão pertence a quem paga a conta, as entidades do setor produtivo da ZFM, a quem entende dos serviços, os cientistas, e por quem precisa, em última instância, de seus benefícios, o cidadão.

Precisamos de debater e fazer a gestão da Amazônia e do Brasil dentro das métricas do conhecimento, taxas de retorno dos investimentos, da partilha de benefícios, das métricas do compromisso e da transparência, este insumo vital para fazer florescer um novo Brasil, enfim, a hora e a vez da Amazônia. “Se a coisa pública é de todos nós, nós temos de tomar conta da coisa pública”, bradou a ministra Carmem Lúcia, presidente da Suprema Corte do Brasil, a propósito da bandalheira reinante.

Alfredo Lopes
Alfredo Lopes
Alfredo é consultor ambiental, filósofo, escritor e editor-geral do portal BrasilAmazôniaAgora

Artigos Relacionados

Estudo global revela maior número de grupos de tartarugas marinhas fora de risco crítico de extinção

Apesar do avanço positivo nas populações de tartarugas marinhas, o estudo também reforça a necessidade de continuidade e ampliação dos esforços de conservação.

Amazônia: Mãe Generosa, Filhos Ingratos

Amazônia não é cenário. É personagem. É protagonista. E é tempo de tratá-la como tal. Aos que vêm de fora: sejam bem-vindos. Mas venham com respeito. Venham com humildade. Venham dispostos a ouvir e a aprender. Porque aqui a gente dorme na rede, mas sonha de olhos bem abertos.

Noronha vive melhor temporada de desova de tartarugas-verdes da história recente

Até o início de maio, foram contabilizados 772 ninhos no arquipélago, superando os recordes anteriores de desova de tartarugas das temporadas de 2022/2023 e 2016/2017, que tiveram 430 e 420 ninhos, respectivamente.

Ilha do Combu vira modelo de ecoturismo na Amazônia

O ecoturismo comunitário se consolidou como uma nova alternativa de renda local e também como um símbolo de resistência e reinvenção na Amazônia paraense.

Povos da Amazônia ganham voz e imagem em exposição na França

A exposição sobre povos da Amazônia em Paris apresenta o cotidiano e as lutas de grupos como os seringueiros de Xapuri, os indígenas Sateré-Mawé, os catadores de açaí e os quebradores de coco babaçu.