O resultado de domingo na Venezuela pode intensificar crise ambiental na região, com impactos diretos no Brasil. Contudo a oposição não representava qualquer avanço real na questão. Entenda o impacto da reeleição de Maduro na Amazônia e na política ambiental regional, incluindo desafios para o Brasil e a crise humanitária.
A reeleição de Nicolás Maduro na Venezuela traz consigo uma série de implicações complexas para a Amazônia e a política ambiental da região, abrangendo questões de governança, imigração e relações internacionais, especialmente com o Brasil e outros países vizinhos.
Maduro, recentemente reeleito em um processo eleitoral polêmico, enfrenta um histórico de governança marcado por aumento da pobreza, crise humanitária e emigração em massa de mais de 7 milhões de pessoas. Sua administração tem sido criticada também por desinvestimentos em áreas essenciais, como saúde e infraestrutura, além da gestão ambiental, especialmente pela exploração não sustentável de recursos na Amazônia, com destaque para a mineração e extração de petróleo sem devidas considerações ambientais.
Raízes da crise econômica
A crise econômica na Venezuela tem suas raízes na dependência excessiva do petróleo, um legado dos governos de Hugo Chávez e Nicolás Maduro. Durante os períodos de alta nos preços do petróleo, a economia venezuelana prosperou, mas essa bonança não foi aproveitada para diversificar a economia. Quando os preços do petróleo caíram drasticamente, de 112 dólares em 2015 para 56 dólares em 2017, o país foi lançado em uma crise econômica severa. A hiperinflação, a escassez de alimentos e medicamentos, e a fome tornaram-se partes comuns do cotidiano venezuelano.
Legitimidade e repercussões internacionais
O resultado de domingo, já contestado internacionalmente, pode afetar a posição geopolítica do Brasil na América do Sul. Reconhecer uma vitória pode complicar as relações do Brasil com outros países sul-americanos que não aceitam os resultados das eleições venezuelanas. Ainda mais se mais informações ou comprovações que levem a desconfiança ou reprovação do lisura do processo eleitoral.
Impactos diretos na Amazônia
A reeleição de Maduro pode intensificar ainda mais a exploração de recursos na Amazônia venezuelana, priorizando um modelo de desenvolvimento econômico em com pouca consideração com a preservação ambiental. Essa abordagem pode aumentar as atividades de mineração e desmatamento, exacerbando os problemas ambientais na região. A falta de regulamentação e fiscalização adequada pode resultar em danos irreversíveis ao ecossistema amazônico, já sob pressão significativa.
Política ambiental contraditória
Apesar da retórica de defesa do meio ambiente e da Amazônia, alinhando-se com líderes progressistas da região, como Lula e Petro, a administração de Maduro tem dado pouco valor ao meio ambiente. Propostas para convocar uma cúpula da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) contrastam com a realidade de aumento do desmatamento e da mineração ilegal na Amazônia venezuelana, além da poluição de ecossistemas como o Lago de Maracaibo e a falta de investimento em infraestrutura e fiscalização ambiental.
Planos futuros
Maduro incluiu em sua agenda propostas sem profundidade ou detalhamento de “atenção à ecologia” e “renovar o modelo de proteção humanista”. O partido fez algumas menções as mudanças climáticas, salvaguardar reservas naturais da Amazônia. No entanto, o histórico sugere que a prioridade continuará sendo a um modelo de desenvolvimento econômico sem muita atenção a pauta ambiental ou climática.
Confira as sete propostas de Maduro apresentadas em sua campanha:
- Modernizar a economia– através de “um novo modelo produtivo de exportação, transformação completa do modelo econômico produtivo”;
- Melhorar o modelo de convivência e gozo dos direitos humanos – atenção à ecologia; renovar o modelo de proteção humanista; geopolítica e repolitização;
- Paz, segurança e integridade territorial – Este ponto inclui, entre outros aspectos, “a salvaguarda e o desenvolvimento da Guiana Esequiba”, um território disputado sobre o qual ocorreram várias travessias diplomáticas nos últimos tempos;
- Acelerar a recuperação do Estado-providência – e fortalecer “os valores do ‘socialismo’”;
- Política – Avançar na consolidação da democracia direta com a ética republicana através de um profundo processo de repolitização
- Ações ecológicas para combater as mudanças climáticas;
- Inserção e liderança da Venezuela na nova configuração mundial, na qual propõe, entre outros pontos, o fortalecimento dos BRICS.
E a oposição?
Para aqueles que esperavam uma virada radical da oposição, o cenário ambiental oferece pouco consolo. Edmundo González Urrutia, com uma campanha envolta em nebulosidade, construiu seu plano eleitoral sobre dois pilares principais: o programa de sua antecessora, María Corina Machado, descrito no manifesto “Venezuela, terra de graça”, e o “Plano País”. O candidato ainda não finalizou suas propostas para os próximos anos de mandato, e suas ideias se baseiam em promessas amplamente vagas como “alcançar a liberdade, a democracia e a prosperidade”.
A oposição defende uma transformação profunda na indústria energética, propondo a privatização do setor petrolífero e a adoção de gás e energia limpa. María Corina Machado, em seus discursos, sublinha a necessidade de uma transição energética e reforça a proteção ambiental como um elemento central de suas políticas.
Relações com o Brasil e imigração
A crise política e econômica na Venezuela tem repercussões diretas nos estados de Roraima e Amazonas. A intensificação da crise pode aumentar o fluxo de imigrantes venezuelanos em busca de melhores condições de vida, pressionando recursos e serviços públicos brasileiros e gerando tensões sociais. O governo brasileiro já está reforçando a presença das forças armadas na fronteira em resposta a esse fluxo migratório.
Consequências humanitárias e ambientais
O estado sofreu apagões devido à dependência energética da Venezuela. A instabilidade no fornecimento de energia gerou problemas significativos para a população local. Além disso, a Amazônia enfrentou um intenso fluxo migratório de venezuelanos, incluindo indígenas Warao, que fugiam da fome e da falta de recursos básicos.
Os indígenas Warao, tradicionalmente caçadores, coletores e pescadores, enfrentaram desafios adicionais ao chegarem ao Brasil. A falta de políticas de proteção em suas terras na Venezuela, agravada por danos ambientais como desertificação e salinização das águas do Alto Orinoco, forçou esses grupos a buscarem sustento em áreas urbanas. Projetos de desenvolvimento, como a instalação de petroleiras no delta do Orinoco, impactaram negativamente suas comunidades, levando muitos a migrar para o Brasil em busca de sobrevivência.
Impactos no passado recente
No mandato de Jair Bolsonaro, a matriz energética de Roraima passou por uma mudança significativa. Anteriormente dependente da energia elétrica proveniente da Venezuela, Roraima teve que se adaptar a uma matriz baseada em usinas termelétricas, que são mais poluentes. Essa mudança ocorreu em um contexto de crise energética no estado, que não está conectado ao Sistema Interligado Nacional (SIN) do Brasil.
Principais ações e consequências
Bolsonaro rompeu o acordo que permitia a importação de energia da Venezuela, alegando questões de “segurança energética”. Essa decisão resultou em um aumento da dependência de fontes de energia mais poluentes, como as usinas termelétricas a diesel. Para suprir a demanda energética de Roraima, o governo federal investiu na construção de usinas termelétricas, que são significativamente mais poluentes e custosas. O custo de produção de energia nessas usinas é de cerca de R$ 1.700 por megawatt-hora, comparado aos R$ 900 a R$ 1.080 que custaria a energia vinda da Venezuela.
A mudança para usinas termelétricas levou a uma série de apagões e interrupções no fornecimento de energia em Roraima, exacerbando a crise energética no estado. A fragilidade da nova matriz energética foi evidenciada por vários apagões significativos, mostrando as consequências de uma dependência maior de fontes de energia mais poluentes e menos confiáveis.
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