Pelo menos 11 editais de privatização dos setores de energia elétrica, abastecimento, portos, tecnologia, ativos imobiliários e da área de gás natural serão lançados até o fim de 2021, de acordo com a lista de projetos de desestatização organizada pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
A relação inclui empresas em todo o território nacional. Estão lá Emgea (Empresa Gestora de Ativos), Dataprev (Empresa de Tecnologia de Informações da Previdência) e Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados).
No caso de projetos de concessões, há cinco operações já anunciadas –Parque Nacional do Iguaçu (PR), ativos de saneamento em Porto Alegre (RS) e rodovias no Paraná, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.
As chamadas PPPs (parcerias público-privadas) previstas para este ano contam com projetos de iluminação pública na cidade de Curitiba (PR) e de saneamento no estado do Ceará.
Existe grande expectativa também em relação às privatizações prometidas pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), com destaque para Eletrobras e Correios.
Segundo os especialistas, a nova rodada de desestatização tende a elevar a participação estrangeira em ativos nacionais. A percepção é que a queda nos investimentos estrangeiros diretos em 2020 teria sido uma reação pontual à pandemia, e o movimento de saída de algumas empresas do Brasil ocorreu em setores localizados, que não tinham boas condições de mercado, como o automotivo.
“Há excesso de liquidez no mercado internacional, aumento do capital intensivo. Há frentes de atuação em programas de privatização do governo federal, concessões estaduais e municipais. Com a aprovação do marco legal do gás, é possível que a privatização do setor acelere na esfera estadual”, diz Luiz Claudio Campos, responsável pela área de governo e setor público no Brasil e América do Sul na consultoria EY.
O apetite estrangeiro pelo Brasil tem crescido especialmente entre os fundos de investimentos, segundo Maurício Elon, sócio da área de governo da consultoria KPMG. Fundos soberanos e de pensão, como o GIC, de Singapura, e os canadenses CDPQ e CPPIB, que antes buscavam ativos nos EUA, Europa e Japão, começaram a investir em países em desenvolvimento.
O líder da área de governo e serviços públicos da consultoria Deloitte, Elias de Souza, conta que boa parte das operações anunciadas no Brasil já está no radar de investimentos estrangeiros, especialmente as de saneamento. O tamanho do apetite, porém, vai depender da forma como esses ativos serão ofertados. “Questões como liberação do financiamento, modelo de venda e estimativas de retorno da variação cambial influenciam o interesse do investidor”, diz.
Os estrangeiros têm atuação relevante nas privatizações brasileiras desde os anos 1990. De nove companhias privatizadas nesse período, ao menos cinco têm 15% ou mais das ações nas mãos de investidores estrangeiros.
A Vale, que atua como mineradora global, tem 57% dos papéis detidos por acionistas no exterior. Na Embraer, terceira maior fabricante de aviões comerciais do mundo, com escritórios, unidades industriais e centros de distribuição de peças e serviços nas Américas, África, Ásia e Europa, 15,1% das ações estão com estrangeiros.
No caso das concessões, a antiga Eletropaulo, que opera na capital paulista, já foi do grupo americano AES e depois foi assumida pela italiana Enel. A CPFL, outra empresas de energia que atua no interior do estado de São Paulo, tem 83% de capital nas mãos dos chineses da State Grid (veja infográfico ao lado).
Apesar desse histórico, a participação de estrangeiros em empresas brasileiras ainda é um tema que inspira debates – no mercado, na academia e até no governo, onde há uma ala mais nacionalista que pressiona pela permanência do Estado e do capital nacional em áreas consideradas sensíveis, como energia nuclear.
Para um grupo de especialistas, como Elon, da KPMG, o aumento da participação estrangeira em companhias nacionais se mostrou positiva, pois fortaleceu a internacionalização das empresas e a modernização da cultura e da gestão dos negócios.
“Essa abertura insere empresas nas cadeias globais e aprimora seus processos de governança e transparência, liberando o Estado para concentrar esforços em serviços de assistência social, saúde, educação e segurança nacional”, afirma.
Outra corrente, porém, defende que as privatizações precisam ser mais criteriosas e pensadas como parte de uma política pública. O economista e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) Nelson Marconi, que atuou na campanha de Ciro Gomes (PDT) na eleição presidencial de 2018, defende que o governo preserve empresas em setores estratégicos para o desenvolvimento do país.
“Os americanos estão impedindo a compra por estrangeiros de empresas tecnológicas estratégicas, e a gente aqui está privatizando, por exemplo, a Ceitec (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada), empresa pública de semicondutores no Rio Grande do Sul”, afirma.
“Empresas estrangeiras têm seus interesses também em outros países na forma como distribuem a produção. Elas deixam, muitas vezes, para desenvolver o que é mais estratégico em sua matriz e produzem em outros países as etapas menos relevantes”, disse.
Fonte: Amazonas Atual
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