O Brasil tem larga experiência em promover políticas de desenvolvimento, conforme os avanços do agribusiness podem atestar. Conta com diversas instituições de pesquisa e desenvolvimento a altura do desafio das pesquisas voltadas para o fomento da bioeconomia na região. Além disso, a região é geradora de recursos suficientes para colocar a roda a girar. O que falta?
Márcio Holland
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A Amazônia virou o centro do mundo, em plena luta para superar a pandemia da covid-19. Em uma pesquisa simples no Google da palavra “Amazônia” encontram-se mais de 23 milhões de resultados; sem o acento, “amazonia”, encontram-se mais de 58 milhões de resultados. Ao mesmo tempo, líderes mundiais e nacionais têm se mobilizado em torno do tema.
Um grupo respeitável de líderes políticos dos Estados Unidos divulgou seu “Plano de Proteção da Amazônia”. São recomendações para a atuação do governo americano em prol da floresta. Aqui no Brasil, ao longo do ano passado, os três maiores bancos privados apresentaram um conjunto de dez medidas voltadas para a conservação ambiental, o desenvolvimento da bioeconomia e investimentos em infraestrutura sustentáveis.
Lá no Norte do Brasil, um grupo de empresários, investidores em grandes projetos industriais a partir do Polo Industrial de Manaus, mobilizaram esforços para discutir sobre como viabilizar a bioeconomia na região. Setores produtivos, como o automotivo, já anunciam medidas ousadas de alterar suas matrizes produtivas, voltando-se, em definitivo, para a produção de carros elétricos. Consumidores brasileiros começam a absorver informações e alterar comportamentos sobre a importância do consumo consciente.
O mundo está mudando. As ideias e opiniões sobre onde moramos precisam mudar rapidamente. Dados internacionais sobre aquecimento global, emissão de dióxido de carbono, aumento dos níveis dos oceanos, de desmatamento de florestas, entre outros, são alarmantes. O mundo está em exaustão. Precisamos modificar hábitos e comportamentos e alinhar nossas políticas públicas em prol de um desenvolvimento econômico inclusivo e sustentável.
O Brasil é a parte estratégica global e altamente relevante deste processo. A floresta Amazônica ocupa quase metade do território brasileiro. Conta com ampla sociobiodiversidade, de imensa complexidade e incrível diversidade de plantas, animais e micro-organismos. Em meio à tamanha riqueza natural, coexistem municípios com baixos níveis de IDH (índice de Desenvolvimento Humano), moradias e saneamento precários e infraestrutura incapaz de integrar a região de modo adequado.
Ao mesmo tempo, o Brasil carece de forças para seu crescimento econômico sustentado. Há mais de três décadas que o País experimenta baixas taxas de expansão da produtividade do trabalho. Quando prosperou, nos anos 2000, foi mais graças aos fatores globais, que nos levaram a surfar sobre o super ciclo de commodities, do que por causa dos próprios esforços.
O Brasil não deixa de ser um grande puzzle global. Já superou dificuldades inimagináveis de solo e avançou suas fronteiras de produção agropecuária, de modo altamente sustentável. Construiu um amplo e diversificado complexo agroindustrial, altamente produtivo e com preservação ambiental exemplar. Se tornou líder mundial em setores como grãos e proteínas. Mas ainda não descobriu a importância da
sociobiodiversidade amazônica como motor de prosperidade e redução de desigualdades.
Contudo, não estamos falando de terra arrasada. Lá no Norte do Brasil tem um dos mais dinâmicos polos industriais do país, o Polo Industrial de Manaus, que gera, entre empregos direto, indiretos e induzidos, mais de 400 mil empregos formais. No final do primeiro semestre de todos os anos, acontece uma das mais extraordinárias manifestações socioculturais do planeta, o Festival Folclórico de Parintins.
Aqui começam as especificidades da região. Mesmo estando a 370 quilômetros em linha reta de Manaus, para se chegar em Parintins de barco pode se levar até 24 horas, conforme a embarcação. Essa é apenas uma ilustração sobre quais as especificidades da região em termos de investimentos em infraestrutura intrarregional.
No Estado do Amazonas, tem-se a maior universidade multi-campi do País, a Universidade Estadual do Amazonas (UFAM), e ainda conta com a famosa Torre ATTO (Observatório de Torre Alta da Amazônia), uma iniciativa importante para a compreensão do papel do ecossistema amazônico tropical em condições de mudanças climáticas. Inpe e EMBRAPA possuem muitas iniciativas relevantes para a região.
Também não é por falta de recursos que estamos discutindo políticas de desenvolvimento para a Amazônia. Há dinheiro de fundos como FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), o FTI (Fundo de Fomento ao Turismo, Infraestrutura, Serviços e Interiorização do Desenvolvimento do Amazonas), e o FMPES (Fundo de Fomento às Micro e Pequenas Empresas), e do investimento em P&D como compensações por incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus, que poderiam ser agrupadas em um grande fundo de desenvolvimento da bioeconomia, sob nova governança, com avaliação transparente de usos e relatórios periódicos.
Há recursos advindos ainda das vastas receitas tributárias geradas pelo Polo Industrial de Manaus para a União (cerca de R$ 18 bilhões anuais) ou para o Estado do Amazonas (cerca de R$ 4,7 bilhões) que poderiam ter parcela voltada para o próprio desenvolvimento destas atividades interior adentro da Amazônia.
O Brasil tem larga experiência em promover políticas de desenvolvimento, conforme os avanços do agribusiness podem atestar. Conta com diversas instituições de pesquisa e desenvolvimento a altura do desafio das pesquisas voltadas para o fomento da bioeconomia na região. Além disso, a região é geradora de recursos suficientes para colocar a roda a girar. O que falta?
Antes de lançar propostas, é preciso conhecer a região. Por causa disso, a Fundação Getulio Vargas, através da Escola de Economia de São Paulo (FGV EESP), lançou a plataforma digital Diálogos Amazônicos, para discutir temas da Amazônia. O Brasil precisa conhecer a si próprio e entender seus potenciais e oportunidades. Como essas reuniões são quinzenais, como essa minha coluna, procurarei trazer para cá resumos das discussões plurais e independentes de meus convidados. Vamos falar mais sobre a Amazônia?
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