“É imperativo que as empresas, reguladores e investidores trabalhem juntos para criar um sistema onde a sustentabilidade seja uma prioridade real, baseada em dados concretos e verificáveis. Apenas assim poderemos enfrentar os desafios ambientais e sociais de nosso tempo e construir um futuro mais justo e sustentável para todos aqueles alcançados pelos benefícios da Zona Franca de Manaus, na Indústria da Floresta”.
Por Régia Moreira Leite
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Comissão ESG do CIEAM
Coluna Follow-Up
A implantação da agenda ESG (Environmental, Social, and Governance) no Polo Industrial de Manaus é um esforço fundamental para alinhar as práticas empresariais aos padrões globais de sustentabilidade. A comissão ESG do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (CIEAM) tem trabalhado arduamente para garantir que as empresas locais se adaptem às exigências formais e adotem uma postura ética e transparente. No entanto, a fragilidade e inconsistência dos relatórios de sustentabilidade apresentados por grandes empresas a nível nacional e internacional lançam um alerta preocupante para todos nós.
Desconfiança generalizada
A desconfiança generalizada em torno dos relatórios ESG é um problema grave. E a imprensa especializada tem alertado frequentemente para o problema. Pesquisas chegam a indicar que 98% dos investidores brasileiros e 94% dos investidores globais desconfiam das informações apresentadas nesses documentos. Essa alta desconfiança é em grande parte atribuída à prática do “greenwashing”, onde empresas divulgam informações falsas ou exageradas sobre suas iniciativas sustentáveis. A falta de padronização e regulamentação consistente contribui para esse cenário, permitindo que narrativas superficiais sejam priorizadas em detrimento de dados reais e substanciais.
Conformidade ambiental de fachada
A regulamentação poderia brecar a prática de “greenwashing”, que envolve a promoção de uma imagem ambientalmente responsável sem que as ações concretas da empresa reflitam essa imagem. Isso pode incluir desde alegações infundadas sobre reduções de emissões de carbono até programas de reciclagem ineficazes. Essa prática é prejudicial porque engana os consumidores e investidores, mas também porque desvia a atenção das mudanças necessárias para enfrentar desafios ambientais reais.
Ausência de dados objetivos
Os relatórios ESG frequentemente falham em apresentar indicadores de desempenho específicos e relevantes para cada setor. Temos apontado, por exemplo, a ausência de controles relacionados às condições de trabalho de fornecedores. O monitoramento das questões trabalhistas não é adequadamente abordada. A complexidade dos dados necessários para criar relatórios ESG precisos e transparentes é um desafio delicado pois podem resultar em documentos que não refletem fielmente a realidade das práticas empresariais. A ausência de informações claras sobre a mitigação de riscos críticos, por outro lado, enfraquece ainda mais a credibilidade desses relatórios.
Os impactos na motivação
A falta de dados objetivos nos relatórios ESG também impede a avaliação precisa do desempenho ambiental e social das empresas. Sem indicadores claros e padronizados, é difícil comparar o desempenho entre diferentes empresas e setores. Isso cria uma lacuna significativa na capacidade dos investidores e outras partes interessadas de tomar decisões informadas sobre onde alocar seus recursos. Além disso, sem dados robustos, as empresas têm pouca motivação para melhorar suas práticas, perpetuando um ciclo de relatórios inadequados e falta de progresso real.
Danos precários de Governança
Escândalos de governança, como o recente caso da Americanas, aumentam a desconfiança dos investidores e do público em geral. Esses episódios destacam a necessidade urgente de regulamentações mais rigorosas e de uma fiscalização eficiente. A percepção de que os relatórios ESG podem ser manipulados para ocultar práticas empresariais inadequadas mina a confiança na sustentabilidade corporativa e nos esforços de governança.
Transparência é fundamental
A governança corporativa é um componente crítico da agenda ESG, pois estabelece as estruturas e processos pelos quais as empresas são dirigidas e controladas. Quando ocorrem escândalos de governança, como fraudes contábeis ou desvios éticos, a confiança dos investidores e do público é gravemente abalada. Isso afeta o valor das ações e a reputação da empresa, como também enfraquece a credibilidade de todo o movimento ESG. Para restaurar a confiança, é essencial que as empresas adotem práticas de governança transparentes e responsáveis, e que os reguladores imponham penalidades rigorosas para violações.
Expectativas para o futuro
Em meio a essas dificuldades, há sinais de progresso. O Brasil foi o primeiro país a adotar oficialmente as normas globais de reporte ESG (IFRS), o primeiro passo significativo para adoção da a transparência e a credibilidade dos relatórios. A partir de 2026, empresas de capital aberto serão obrigadas a publicar relatórios ESG, uma medida que se espera trazer maior clareza e reduzir a prática de “greenwashing”. Os investidores têm grandes expectativas de que essas novas regras proporcionem uma transparência genuína. A adoção de normas globais de reporte é vista como um passo crucial para a reconstrução da confiança e para assegurar que as informações divulgadas sejam precisas e úteis para a tomada de decisões.
Auditoria independente
A obrigatoriedade dos relatórios ESG é um avanço importante, mas para que seja eficaz, deve ser acompanhada de mecanismos robustos de verificação e auditoria. Apenas através de uma fiscalização rigorosa e independente será possível garantir que os relatórios refletem a realidade das práticas empresariais. Além disso, é imperativo que as empresas invistam em capacitação e infraestrutura para coletar, analisar e relatar dados ESG de maneira precisa e transparente. Isso inclui o desenvolvimento de sistemas internos que possam monitorar e reportar de forma contínua as métricas ambientais, sociais e de governança.
Tropeços e recomeços
Os esforços da comissão ESG do CIEAM são um exemplo efetivo de como a indústria pode se comprometer com a sustentabilidade e a transparência. Com efeito, o desafio de superar a desconfiança e assegurar a integridade dos relatórios ESG é uma tarefa contínua. A implementação de regulamentações rigorosas, juntamente com a adesão a normas globais, é essencial para garantir que as práticas empresariais no Polo Industrial de Manaus e em todo o Brasil sejam verdadeiramente sustentáveis e transparentes. A construção de um futuro onde a sustentabilidade muito mais que simples narrativa, mas uma realidade mensurável, depende desses avanços cruciais.
Benefícios da ZFM
A agenda ESG, quando implementada de forma genuína e transparente, tem o potencial de transformar as práticas empresariais, e de gerar um impacto positivo duradouro na sociedade e no meio ambiente. É imperativo que as empresas, reguladores e investidores trabalhem juntos para criar um sistema onde a sustentabilidade seja uma prioridade real, baseada em dados concretos e verificáveis. Apenas assim poderemos enfrentar os desafios ambientais e sociais de nosso tempo e construir um futuro mais justo e sustentável para todos aqueles alcançados pela Indústria da Floresta.
Em tempo, deixamos registrada a nossa participação em mais um Diálogos Amazônicos, dessa vez presencialmente na sede da Fundação Getúlio Vargas, em Brasília, com a presença de autoridades e convidados, neste 6 de junho. Uma chance de contarmos ao país o que fazemos, quais os propósitos, contribuições e avanços da Zona Franca de Manaus.
Régia é economista, administradora, empresária, coordenadora da Comissão ESG e conselheira do CIEAM, Centro da Indústria do Estado do Amazonas
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