“Na primeira noite eles se aproximam/e roubam uma flor/do nosso jardim./E não dizemos nada.” – por Eduardo Alves da Costa com o poema “No caminho com Maiakovski
Por Alfredo Lopes
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Coluna Follow-Up
O ano de 2022 será marcado como o ano dos editais do fim do mundo, tal a quantidade e a voracidade com que saíram da fornalha com o ímpeto de alguém que quisesse desconstruir – por todos os flancos, e progressivamente – o objeto que lhe inspirou a trama. O último foi o de n. 11.182, de 24 de agosto.
Este prometia corrigir os estragos do anterior, o Decreto n. 11.158, de 29 de julho de 2022 que, por sua vez, prometia revogar os Decretos n. 10.923/2021 e 11.055/2022 e assegurar: “… o objetivo de viabilizar a redução de 35% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) da maioria dos produtos fabricados no Brasil e, ao mesmo tempo, cumprir decisão judicial (ADI 7153) que determinou a preservação da competitividade dos produtos produzidos na Zona Franca de Manaus (ZFM)” No primeiro momento, os interessados acreditaram que apenas 5% dos produtos – como foi alardeado – seriam penalizados. Todos se enganaram e redondamente.
“Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores,/matam nosso cão,/e não dizemos nada.”
Poucas imposições da burocracia brasileira são tão desgastantes como o licenciamento do PPB, Processo Produtivo Básico, uma Via Crucis do legalismo que a lei determina seja concluída em 4 meses. Temos histórico, entretanto, como o da Novamed, para a produção de medicamentos genéricos, que demorou cinco anos para ser liberado. Pois bem, o último Decreto, no universo de 528 PPBs, a duras penas conquistados pelo investidor, apenas 170 foram liberados para seguir incentivados no Polo Industrial de Manaus. Como assim, e os demais ficarão fora do quadro sob nocaute ostensivo?
Nesta segunda-feira, o Centro das Indústrias do Estado do Amazonas convocou seus associados para conhecer/debater informações sobre o rescaldo: investimentos perdidos, custos de toda ordem, perda de postos de trabalho, um clima de indignação generalizada… São 358 produtos glosados pelo novo decreto, fator evidente da desindustrialização anunciada. Esses são os 5% mais aloprados de toda a história da Aritmética, desde o filósofo Pitágoras e seu teorema, ora sob suspeição.
“Até que um dia,/o mais frágil deles/entra sozinho e nossa casa,/rouba-nos a luz e,/conhecendo nosso medo,/arranca-nos a voz da garganta./E já não podemos dizer nada”.
Do ponto de vista da proporcionalidade, as empresas prejudicadas vão involuntariamente, reduzir o número de estabelecimentos industriais em Manaus, há muito tempo 0,6% das empresas fabris do Brasil. Aqui, as taxas de nascimento e óbito das empresas são similares.
Quem se beneficiará com essa depredação? Os empregadores asiáticos que vão ocupar novos colaboradores? Os importadores que tem voz e voto nas entidades da indústria do Sudeste? Ou os empreendedores que não emitem nota fiscal, que não pagam impostos nem terão mão de obra a rodo sem precisar de dar trela aos custos trabalhistas…
A proteção à competitividade da ZFM está assegurada?
O que dizem os juristas? Ao proclamar que o novo Decreto atenderia a medida cautelar do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que acolheu Ação direta de inconstitucionalidade n. 7153, conquistada pela Bancada Parlamentar do Amazonas, através do partido Solidariedade, configurou-se aquilo que os juristas chamam de burla. A manutenção da alíquota do IPI para mais 109 produtos produzidos na Zona Franca de Manaus (ZFM), acrescidos dos 61 itens da lista anterior, o Decreto n. 11.182/2022) condenou à própria sorte uma infinidade de produtos fabricados no Polo Industrial de Manaus e seus investidores. É como se o que eles fazem, ao gerar oportunidades, empregos, renda e tributos… não tivesse qualquer importância.
Até as últimas consequências…
E os indícios da desconstrução paulatina não se esgotam com tais burlas. A redução crescente do imposto de importação, visível e implacável com a manipulação em desfavor da ZFM do ex-tarifário, sinalizam a pulsação da agenda oculta. A nosso favor, uma bancada parlamentar obstinada e vigilante, um partido de nome Solidariedade e a consciência de que é preciso ir até as últimas consequências para assegurar na Justiça a legitimidade dos direitos de todas as empresas, posto que cada uma delas, ao firmar contrato de integrar e proteger a Amazônia, está fazendo sua parte e são credoras da reciprocidade republicana.
Notas:
1. Em epígrafe alguns versos do poema de Eduardo Alves da Costa, com o título No caminho com Maiakovski.
2. As citações jurídicas foram inspiradas no parecer dos juristas Noronha&Ghetti.
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