Entrevista com Niro Higuchi
Especialista na dinâmica florestal amazônica do carbono, pesquisador do INPA e ABC, além de co-fundador do portal BrasilAmazôniaAgora, Niro Higuchi liderou em 2014 uma equipe com os maiores pesquisadores do planeta em biomas tropicais para decifrar como se comporta a floresta Amazônica em relação ao carbono no processo de fotossíntese. Quem o contratou foi o governo japonês, através da Universidade de Tóquio. Neste vídeo e entrevista, ele compartilha algumas informações sobre o assunto e diz porque o plantio de mogno é plantio de dólares. Confira!
BrasilAmazoniaAgora – Plantar mogno na Amazônia é plantar dólares? Como se dá o processo de produção e certificação deste modelo de plantio e seu aproveitamento comercial?
Niro Higuchi – Plantar mogno é plantar dólares desde que o plantador tenha um bom conhecimento de silvicultura e, acima de tudo, que seja muito paciente e teimoso. Há a larva de uma mariposa (Hypsipylla grandella) que se alimenta das gemas apicais da planta, desde a fase de mudas até a fase adulta. A planta que sobrevive acaba se bifurcando, que compromete a qualidade do tronco; não é fácil conseguir um tronco limpo de 5 metros de comprimento. Para conseguir um tronco limpo de 5 m é preciso muito tratos culturais e, em especial, podas constantes.
O Sr. Sakai foi muito paciente e muito teimoso. Há 27 anos, ele plantou mais de 30 mil mudas de mogno em Novo Remanso, perto de Itacoatiara. Atualmente, ele deve ter em torno de 20 mil pés de mogno no ponto de colheita com tronco de 4 a 6 m de comprimento e diâmetro médio acima de 35 cm. Só com o tronco dá para fazer 2-3 mesas de 1 m de largura e 4 m de comprimento. Com os resíduos do tronco e com galhos e as raízes dá para fazer um punhado de pequenos objetos de madeira, instrumentos musicais, objetos de decoração etc. Neste momento, ele tem licença do IPAAM (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) para comercializar 7 mil pés de mogno.
Não há espaço para a certificação florestal tradicional por uma questão de escala. No entanto, a empresa Hdom deve desenvolver um sistema de rastreabilidade com base na tecnologia blockchain; uma solução mais simples, mais confiável e mais barata.
Assista ao vídeo no canal do Instituto Nacional de Pesquisas Amazônia aqui:
BAA -Temos um compromisso de reflorestar 12 milhões de hectares pelo Acordo de Paris. Qual a contribuição das instituições de pesquisa e agências de fomento para estimular este compromisso?
N.H. -.As Contribuições Nacionalmente Determinadas (CNDs, ou NDC na sigla em inglês), sob o Acordo de Paris, foram encaminhadas em 2016. Seis anos depois, eu desconheço qualquer iniciativa em direção ao cumprimento das metas estabelecidas nas CNDs, relacionadas com restauração e reflorestamento. Também não vi as agências de fomento com editais de chamada direcionados para o cumprimento das metas. Estamos em 2022; logo, faltam apenas 8 anos para o cumprimento das metas. Só para o fornecimento de mudas florestais, nós vamos precisar de ~5 mil viveiros (padrão Fazenda Aruanã) trabalhando intensamente para atender essa demanda. Melhor rever as metas. Eu reduziria para 1.200 hectares.
As instituições de pesquisas da região, ao contrário, têm muito contribuir. O INPA, por exemplo, tem plantios experimentais com espécies nativas desde 1960. Da mesma forma, há ainda a Embrapa em todos os estados da Amazônia com experiências semelhantes, além das universidades locais. A Embrapa herdou os plantios experimentais do PRODEPEF (do IBDF, atual IBAMA) e os mantém até hoje. A Companhia Vale do Rio Doce e a Jari também instalaram vários experimentos de plantios na década de 1980.
BAA – Na contabilidade ambiental, é possível fazer uma estimativa da agregação de valor neste empreendimento?
N.H. – Com certeza! O mogno, como qualquer outra planta clorofilada, realiza fotossíntese e respiração. Nesse processo, o mogno utiliza o CO2 atmosférico e a água para produzir a matéria orgânica. O CO2 da atmosfera é fixado em suas várias partes (folhas, flores, frutos, galhos, caule e raízes), assim como a água e libera oxigênio. Ao realizar fotossíntese e respiração, o mogno consome muita energia solar. Nessa contabilidade há necessidade de estimar os estoques de carbono e água em toda a árvore. Mais importante do que os estoques, entretanto, há necessidade de estimar o quanto a planta troca com a atmosfera em ocasiões sucessivas, para manter os seus estoques. E cabe ainda a seguinte pergunta: para onde iria a energia solar se não houvesse o plantio de mogno?
BAA – Mogno, Castanheira, Jatobá tucumã… quais as espécies potencialmente adequadas para reflorestamento na Amazônia?
N.H. – De uma forma ou de outra, todas as principais espécies florestais da Amazônia já foram estudadas, em escala de laboratório. Fisiologia e tecnologia de sementes, produção de mudas, plantios experimentais em plena abertura e sob sombra, tecnologia da madeira etc. Agora, plantios comerciais são poucos. As exceções são o plantio de castanheira da Fazenda Aruanã, o plantio de mogno da Fazenda Sakai e outros em outros estados da Amazônia. Plantar espécies florestais amazônicas é plantar dólares.
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