“Com tecnologias para produção e uso de biogás e fertilizantes a partir do tratamento de dejetos animais no âmbito do plano ABC”, a Rede BiogásFert, quer oferecer para a sociedade soluções tecnológicas para a produção e uso integrados de biogás e biofertilizantes orgânicos e organominerais a partir de dejetos animais nos diferentes sistemas de produção agropecuários. Tudo isso, visando estratégias de desenvolvimento sustentável com foco em agricultura de baixo carbono”
Por Brasil Amazônia Agora
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Emissões de Gases de Efeito Estufa na pecuária
A produção animal é uma atividade de alto impacto, tanto pelo grande volume de resíduos gerados como pela emissão de gases poluentes, odores e particulados, os quais podem causar poluição atmosférica e prejuízos para o bem-estar e saúde humana e animal. A expansão dessas atividades tem sido frequentemente apontada como uma das causas do agravamento das questões relativas ao aquecimento global. Entretanto, a real contribuição do setor ainda suscita dúvidas e controvérsias, principalmente pela falta de confiabilidade nos dados existentes e a falta de informações, sobretudo em condições tropicais.
Nos sistemas em confinamento de suínos no Brasil, o manejo adotado em mais de 95% das granjas consiste no armazenamento do dejeto em esterqueiras para estabilização parcial seguido da aplicação no solo para fertilização de lavouras e pastagens. Durante o armazenamento, os dejetos emitem principalmente o CH4 e NH3 e a sua aplicação ao solo resulta em um incremento na emissão de CO2 e N2O. A substituição de esterqueiras por biodigestores pode reduzir a contribuição dos sistemas confinados no fluxo de emissões dos gases de efeito estufa (GEE), decorrente da retenção e combustão do CH4, o qual é convertido em CO2 e energia.
A Rede BiogásFert mediu a emissão de GEE nos arranjos tecnológicos com biodigestores, considerando todo o ciclo do efluente; desde o CO2 resultante da queima do biogás passando pelas emissões do CH4 residual dos depósitos de efluentes pós-biodigestor até a aplicação destes ao solo. O referencial, ou linha base para comparação, também foi medido, o qual foram as emissões de esterqueiras e do solo após a aplicação do dejeto. Foram usadas metodologias aprovadas pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), utilizando câmaras dinâmicas para amostragem e a composição dos gases foi determinada pelo equipamento fotoacústico Innova 1412.
Fator de emissão de esterqueiras em sistemas integrados predominantes na Região Sul do Brasil
O fator de emissão de CH4 encontrado foi de B0 = 0,48 m3.kg-1 de SV, tendo sido o mesmo calculado a partir de estudos realizados a campo. Este resultado está em consonância com dados da literatura, os quais relatam valores que variam de 0,29 a 0,53 m3.kg-1 SV. No entanto, de acordo com as Diretrizes do IPCC, o B0 estimado para o manejo de dejetos na América Latina seria de 0,29 ± 0,04 m3CH4.kg-1 SV, enquanto na Europa e nos EUA estes valores referenciais do B0 seriam, respectivamente, 0,45 ± 0,07 e 0,48 ± 0,08 m3CH4.kg-1 SV.
Portanto, o fator de emissão encontrado nos estudos realizados no âmbito do Projeto BiogásFert se apresentou mais próximo ao B0 europeu e americano do que o da América Latina. Isso pode ter ocorrido porque as medidas foram conduzidas em uma região onde a produção pecuária é altamente industrializada, sendo o estado de Santa Catarina um dos principais exportadores da carne suína brasileira. Consequentemente, a fim de satisfazer os padrões de qualidade exigidos pelo mercado internacional, tanto os sistemas de produção, como a alimentação e a genética animal que prevalecem nessa região não diferem muito dos adotados pelos seus principais concorrentes no mundo.
A produção de suínos no Brasil, entretanto, é muito heterogênea. Nas regiões Norte e Nordeste (18% do rebanho do país), por exemplo, a produção de subsistência ainda é bastante significativa; já no Sudeste e Centro Oeste (28% das rebanho do país) a alta diluição do esterco resultante do uso excessivo de água pode implicar em emissões com uma menor relação CH4/CO2.
Assim, com base nessas considerações, o valor de B0 = 0,48 m3CH4.kg-1 SV seria atualmente um valor de referência que poderia ser usado apenas na região Sul do Brasil (que concentra 54% do rebanho suíno). No entanto, é preciso salientar que existe uma forte tendência de que este modelo, hora prevalente apenas no Sul, seja replicado para as demais regiões brasileiras, fruto da expansão da produção industrial de carnes e da crescente preocupação com as questões ambientais relacionadas a conservação dos recursos hídricos.
Práticas agropecuárias para mitigação da emissão de GEE na produção e uso de biogás
Por meio do monitoramento contínuo das emissões de GEE (CH4, CO2 e N2O) provenientes de lagoas de armazenamento do digestato e depósitos de dejetos brutos (esterqueira), determinou-se o potencial aquecimento global (PAG em EqCO2.kg-1dejeto).
A lagoa que armazena o efluente de um biodigestor com TRH = 30 dias emite 84% menos GEE (em PAG) que a esterqueira, e foi estimado que o arranjo com biodigestor (onde se considera os gases produzidos no biodigestor e a queima do CH4) emite 53% menos gases.
Simulações realizadas mostram que a redução do tempo de armazenamento do dejeto nas esterqueiras de 120 para 50 dias (o qual foi viabilizado em 2014 pela Legislação de Santa Catarina por meio da Instrução Normativa 11) resulta em uma redução de 80% na emissão de metano dos depósitos.
Contribuição do uso do biofertilizante em sistemas de produção agrícola na emissão de GEE
Avanços significativos no conhecimento sobre a contribuição do uso do biofertilizante em sistemas de produção agrícola na emissão de GEE já foram conquistados. Um exemplo muito utilizado no sul do País é o cultivo de milho no verão e de aveia-preta para cobertura de solo no inverno. Nesse sistema, a aplicação dos dejetos não tratados aumentou em 59% as emissões de N2O do solo sob plantio direto. Quando os dejetos são tratados por compostagem ou biodigestão ocorre redução das emissões de N2O em 17% e 47%, respectivamente.
Outra informação importante é que os dejetos não tratados e o biofertilizante apresentaram eficiência em fornecer nitrogênio para o milho similar aos fertilizantes minerais e o composto orgânico pode ser usado para recuperação de áreas degradadas em função do aporte de matéria orgânica ao solo.
Neste sentido, não houve diferença significativa entre os estoques de carbono do solo adubado com fertilizantes minerais, dejeto não tratado ou biofertilizante. No entanto, a aplicação do composto orgânico em áreas de plantio direto promoveu uma taxa de sequestro de C de 1 Mg.ha-1.ano-1 em relação ao solo adubado com fertilizantes minerais.
Os resultados obtidos apontam um efeito sinérgico quanto a mitigação de gases de efeito estufa pelo tratamento dos dejetos por biodigestão ou compostagem e a reciclagem do biofertilizante como fonte de nutrientes para a agricultura ou recuperação de áreas degradas pelo adubação com o composto orgânico.
Os tratamentos cujas emissões são monitoradas são:
- Testemunha sem adubação
- Fertilizante mineral
- Dejetos líquidos de suínos não tratados
- Dejeto de suíno tratado por compostagem
- Fração líquida do dejeto de suínos tratado por biodigestão (biofertilizante)
Estes tratamentos são monitorados sob sistema plantio direto e preparo convencional do solo.
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