“A Zona Franca de Manaus nos desafia a ver além do imediatismo, buscando soluções que honrem a diversidade da Amazônia e a necessidade de prosperidade de seu povo. Como Edgar Morin nos alerta, o futuro pertence àqueles que reconhecem e enfrentam o erro e a ilusão.”
Por Augusto Rocha e Alfredo Lopes
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Coluna Follow-Up
A Zona Franca de Manaus (ZFM) é frequentemente apresentada por todos que a conhecem como uma solução exemplar para o desenvolvimento sustentável na Amazônia. No entanto, como alerta Edgar Morin, “todo conhecimento comporta o risco do erro e da ilusão”. Assim, para compreendermos a real contribuição da ZFM, é essencial um exame filosófico que transcenda as aparências, confrontando tanto suas virtudes quanto seus limites, sem sucumbir a idealizações ou críticas simplistas.
Indústria: pilastras da riqueza regional
A indústria instalada na Zona Franca de Manaus é responsável por aproximadamente 30% da riqueza gerada na região Norte do Brasil e por 52% do Valor Bruto da Produção do estado do Amazonas. Esse impacto econômico a posiciona como um dos principais instrumentos de inclusão econômica e redução de desigualdades regionais. Porém, cabe mais uma vez questionar: seria a ZFM uma solução definitiva ou uma medida paliativa que mascara problemas estruturais, como a dependência logística e a limitada diversificação econômica?
Essa reflexão insiste em nos remeter ao dilema do erro e da ilusão. Não reconhecer o peso transformador da indústria seria um erro, mas também seria uma ilusão considerá-la suficiente para resolver os desafios da Amazônia. Assim como o modelo tem sido crucial para preservar mais de 90% da floresta amazônica no estado do Amazonas, ele enfrenta limites evidentes, especialmente na sua incapacidade de integrar completamente a bioeconomia como força complementar.
Infraestrutura: a necessidade do concreto
Outro aspecto marcante é a questão da infraestrutura. Apesar de sua localização estratégica, Manaus ainda sofre com a ausência de investimentos estruturais, como a pavimentação da BR-319 e melhorias nos portos fluviais. Em 2024, as secas históricas trouxeram sobrecustos de R$ 846 milhões para a indústria, escancarando a fragilidade do sistema logístico. Morin nos lembra que “o erro não se reconhece como tal”; a falta de infraestrutura é frequentemente justificada por argumentos ambientais que, embora válidos, ignoram que é possível harmonizar desenvolvimento e preservação. Fazemos isto há décadas.
Esse “embate ilusório” entre infraestrutura e meio ambiente perpetua a negligência política e as dificuldades econômicas, reforçando a necessidade de uma abordagem que respeite a floresta sem deixar de atender às demandas humanas. Afinal, a sustentabilidade só é possível se incluir as comunidades que dependem da floresta e das cadeias produtivas.
Bioeconomia: a promessa e o vazio
A bioeconomia, frequentemente exaltada como o futuro da Amazônia, permanece, paradoxalmente, distante de sua realização concreta. Apesar da abundância de discursos e potenciais inexplorados, faltam ações efetivas que transformem a biodiversidade em um vetor econômico sustentável. Para superar essa ilusão, é necessário investir em pesquisa, inovação e políticas públicas que conectem a bioeconomia à indústria já consolidada da ZFM.
Aqui, mais uma vez, a reflexão de Morin ilumina o cenário: “o maior erro seria subestimar o problema do erro”. Reconhecer os desafios estruturais da bioeconomia é o primeiro passo para superar o vazio entre o discurso e a prática.
Entre o Erro e a Utopia
A Zona Franca de Manaus não é apenas um modelo econômico; é um experimento social e metafísico que tenta equilibrar desenvolvimento e preservação em uma das regiões mais ricas e vulneráveis do planeta. Sua trajetória evidencia que nem sempre a dualidade entre erro e ilusão é negativa. O erro, quando reconhecido, abre portas para o aprendizado. A ilusão, quando desmascarada, oferece a chance de corrigir rumos e redefinir objetivos.
Com isso, a ZFM permanece como um espaço de esperança. Se fortalecida por políticas consistentes, investimentos estruturais e a inclusão da bioeconomia como complemento à indústria, poderá inspirar outros modelos ao redor do mundo. É necessário, porém, continuar enfrentando o erro e a ilusão, pois somente assim construiremos um futuro verdadeiramente sustentável.
A harmonia possível
A ZFM é uma metáfora viva do dilema humano: ao mesmo tempo em que cria riqueza e preserva a floresta, expõe nossas limitações enquanto sociedade. A filosofia nos ensina que a busca pela verdade não é linear, mas um caminho marcado por questionamentos e revisões. O desafio, portanto, não é apenas preservar a floresta ou desenvolver a indústria, mas harmonizar essas forças em um modelo que respeite a complexidade da vida amazônica.
Este modelo, embora imperfeito, é um testemunho de que desenvolvimento e sustentabilidade não precisam ser inimigos. A ZFM nos desafia a ver além do imediatismo, buscando soluções que honrem a diversidade da Amazônia e a necessidade de prosperidade de seu povo. Como Edgar Morin nos alerta, o futuro pertence àqueles que reconhecem e enfrentam o erro e a ilusão.
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade
Alfredo é filósofo, foi professor na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo 1979 – 1996, é consultor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas, ensaísta e co-fundador do portal Brasil Amazônia Agora
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