“Os desafios globais pedem outra postura: precisamos de flexibilidade regulatória, celeridade nas decisões e respeito à inteligência produtiva regional. O Polo de Ar-Condicionado de Manaus é um exemplo vivo de sucesso e resiliência. E, como tal, deveria ser tratado com políticas de fomento — e não com barreiras”
Poucos brasileiros sabem que Manaus abriga o segundo maior polo industrial de produção de aparelhos de ar-condicionado do mundo. São 15 fábricas que geram empregos, tecnologia e arrecadação, além de consolidarem a Zona Franca de Manaus (ZFM) como um centro estratégico de fabricação de bens duráveis para todo o país. No entanto, esse polo está sob ameaça — e o inimigo não está no mercado externo ou nas oscilações da demanda. Está na burocracia interna.
A exigência de que o motocompressor, principal componente dos aparelhos de ar-condicionado, seja obrigatoriamente de origem nacional representa hoje um gargalo crítico. A razão? O Brasil tem apenas uma fabricante nacional do item — e ela não atende à contento as necessidades das empresas do Polo. Isso é mais do que um problema logístico: é um gargalo estrutural artificial, fabricado por um modelo de regulação que transformou a exceção em regra, e a exceção — neste caso, a Zona Franca — em vitrine para vetos disfarçados.
Essa imposição parte de um instrumento tecnocrático conhecido como PPB – Processo Produtivo Básico. Concebido como uma diretriz para estimular a industrialização nacional, o PPB virou, na prática, uma engrenagem que trava, engessa e penaliza justamente quem cumpre seu papel produtivo com competência e excelência. E aqui se impõe uma pergunta: a quem interessa manter travada a cadeia produtiva de um dos setores mais dinâmicos da ZFM?
Na última semana, o secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação do Amazonas, Serafim Corrêa, fez um apelo direto ao governo federal: rever o PPB para os condicionadores de ar ou apresentar uma solução viável que permita à indústria continuar competindo com regularidade. Um pleito sensato, objetivo, técnico e que expressa o compromisso do Governo do Amazonas com a viabilidade de seus polos industriais.
É preciso dizer com clareza: o PPB, tal como operado hoje, não tem respaldo constitucional. Ele não consta da legislação originária da ZFM e tampouco foi pensado como um mecanismo de restrição. Foi um instrumento criado por pressão de lobbies, que passou a ser manipulado como se fosse uma doutrina de política industrial. Não é. É um filtro disfarçado, um veto invisível que empurra para o gargalo o que poderia estar na dianteira da inovação.
Enquanto isso, os desafios globais pedem outra postura: precisamos de flexibilidade regulatória, celeridade nas decisões e respeito à inteligência produtiva regional. O Polo de Ar-Condicionado de Manaus é um exemplo vivo de sucesso e resiliência. E, como tal, deveria ser tratado com políticas de fomento — e não com barreiras.
O alerta está dado. O risco é real. Se a cadeia de suprimentos não funcionar com regularidade, como alertou Serafim, o mercado será perdido. Não por falta de capacidade. Mas por falta de visão.