Monstro-de-gila, lagarto que inspirou o Ozempic, pode perder dois terços de seu habitat até 2082

As temperaturas projetadas para os próximos anos podem dificultar a regulação térmica corporal do lagarto monstro-de-gila, afetando seu comportamento, alimentação e reprodução

O monstro-de-gila (Heloderma suspectum), um lagarto típico dos desertos do sul dos Estados Unidos e norte do México, é conhecido por produzir uma toxina que inspirou o desenvolvimento da semaglutida, princípio ativo presente em medicamentos populares como Ozempic, Wegov e Rybelsus. Apesar de sua resistência e características únicas, a espécie enfrenta sérias ameaças decorrentes das mudanças climáticas.

De acordo com um estudo publicado na edição de março da revista Ecology and Evolution, o aquecimento contínuo do habitat desses animais pode ultrapassar os limites de tolerância térmica da espécie. As simulações feitas pelos pesquisadores indicam que as temperaturas projetadas para os próximos anos podem dificultar a regulação térmica corporal desses lagartos, afetando seu comportamento, alimentação e reprodução.

Com isso, a falta de capacidade de adaptação rápida ao novo cenário climático pode colocar a espécie em risco de extinção, especialmente em áreas onde os desertos estão se tornando ainda mais quentes e secos.

Monstro-de-gila fotografado no American International Rattlesnake Museum .
Monstro-de-gila fotografado no American International Rattlesnake Museum | Foto: Blueag9/Wikimedia Commons

Perda de habitats e migração adaptativa

Segundo o estudo, em um cenário de controle efetivo das emissões de gases de efeito estufa, poucas mudanças significativas ocorreriam nos habitats do monstro-de-gila até 2082. No entanto, caso as emissões globais continuem em níveis elevados, os impactos serão drásticos: os ambientes adequados para a sobrevivência da espécie poderão ser reduzidos em até dois terços.

Isso porque, embora habite desertos, o monstro-de-gila prefere micro-habitats mais frescos, abrigando-se em tocas subterrâneas e caçando principalmente à noite durante os períodos mais quentes. Com o avanço das mudanças climáticas e aquecimento global, áreas de menor elevação, atualmente ocupadas por esses lagartos, poderão se tornar inabitáveis. Em contrapartida, regiões montanhosas, historicamente mais frias, podem aquecer o suficiente para se tornarem novos refúgios viáveis para a espécie, representando uma potencial rota de migração adaptativa.

Monstro-de-gila, lagarto que inspirou o Ozempic, pode perder dois terços de seu habitat até 2082.
Monstro-de-gila, lagarto que inspirou o Ozempic, pode perder dois terços de seu habitat até 2082 | Foto: Mohd Fazlin Mohd Effendy Ooi/Flickr

Contudo, a equipe liderada pelo pesquisador Steve Hromada, líder do estudo, constatou que os monstros-de-gila apresentam limitações significativas em sua capacidade de locomoção, o que dificulta deslocamentos por grandes distâncias ou a subida de terrenos montanhosos. Mesmo que as futuras mudanças climáticas tornem as regiões de maior elevação termicamente mais adequadas, os pesquisadores alertam que isso não garante a sobrevivência da espécie.

Além da questão da temperatura, há incertezas quanto à disponibilidade de alimentos, abrigo e outros fatores ecológicos fundamentais nesses novos ambientes.

Proteção da espécie

Os pesquisadores calcularam que mais de 90% do habitat atual e futuro do monstro-de-gila, no deserto de Mojave, encontra-se dentro de terras públicas. A maior parte dessas áreas já conta com algum tipo de proteção, seja em nível federal, estadual ou local.

“Manter esses status de proteção — seja nos parques nacionais ou nas áreas de conservação nacional ao redor dessas regiões — pode ser realmente importante para garantir a presença da espécie na paisagem,” afirma Steve em matéria da CNN Brasil.

Isadora Noronha Pereira
Isadora Noronha Pereira
Jornalista e estudante de Publicidade com experiência em revista impressa e portais digitais. Atualmente, escreve notícias sobre temas diversos ligados ao meio ambiente, sustentabilidade e desenvolvimento sustentável no Brasil Amazônia Agora.

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