O ano de 2024 marcou um avanço significativo no uso de inteligências artificiais generativas. Textos, imagens, áudios e vídeos foram produzidos de forma massiva por meio de diferentes aplicativos e dispositivos. Contudo, a crescente popularidade dessas tecnologias tem levantado questões sobre seu impacto ambiental, conforme aponta a pesquisa “Impulsionando a inteligência artificial – Um estudo sobre a pegada ambiental da IA — hoje e no futuro”, da Deloitte, compartilhada com exclusividade pelo portal Um Só Planeta.
Consumo energético em alta
De acordo com o estudo, o uso global de eletricidade por data centers, que suportam os serviços de IA, alcançou mais de 380 TWh em 2023, o equivalente a 1,4% do consumo mundial de eletricidade e cerca de 0,3% das emissões globais de gases de efeito estufa. A expectativa é que esse consumo triplique na próxima década, chegando a 1.000 TWh, o que representará 3% da energia mundial, o dobro do percentual atual.
A Deloitte obteve esses dados junto a concessionárias de energia elétrica de diversos países. O impacto é atribuído à demanda crescente de servidores físicos e supercomputadores usados para processar as informações geradas pelas IAs, um processo que exige altíssima capacidade computacional.
Investimentos no setor e o paradoxo energético
A pesquisa também destaca que os investimentos na indústria da IA devem ultrapassar US$ 200 bilhões até 2025. Setores como o de energias renováveis e economias limpas planejam expandir o uso da IA para otimizar seus processos. Embora as empresas reconheçam o potencial dessas tecnologias para colaborar com a transição energética, elas enfrentam o desafio de equilibrar a expansão com o aumento do consumo energético.
Guilherme Lockmann, sócio-líder da Deloitte para Sustentabilidade e o segmento de Power, Utilities e Renewables, afirmou que a eficiência energética dos data centers será crucial para a sustentabilidade: “Adequar o uso da energia nos data centers é parte dos movimentos que cada empresa precisa fazer para apoiar o compromisso de mudança climática a favor do planeta.”
Impactos nas emissões de carbono
O estudo ressalta que o impacto das IAs nas emissões de dióxido de carbono (CO2) ainda é incerto, devido a fatores como:
- Escala da adoção de tecnologias de IA, determinando a demanda por poder computacional.
- Avanços nas eficiências dos data centers.
- Disponibilidade de fontes de eletricidade limpa para reduzir as emissões de CO2.
A modelagem da Deloitte prevê que, se a taxa de crescimento atual continuar, o consumo de energia por data centers de IA pode atingir 2.000 TWh até 2050, correspondendo a 3% do consumo global de eletricidade, mesmo em um cenário de emissões líquidas zero.
Desafios regionais e possíveis soluções
Atualmente, grande parte das emissões (escopo 2) está ligada ao consumo de eletricidade. Para mitigar esses impactos, empresas de tecnologia têm investido em contratos de aquisição de energia de baixo carbono (PPAs). Contudo, a demanda por eletricidade limpa tem crescido mais rapidamente que sua disponibilidade, especialmente nos Estados Unidos e na região Ásia-Pacífico.
A Ásia-Pacífico concentra 59% das emissões dos data centers devido à alta intensidade de carbono de sua rede elétrica, enquanto a Europa Ocidental, com menor intensidade de carbono, responde por apenas 4% das emissões globais do setor. Segundo o estudo, se a Ásia-Pacífico adotasse uma matriz energética semelhante à europeia, suas emissões poderiam ser reduzidas em até 70%.
A rápida expansão das fontes de energia renovável é vista como essencial para mitigar o impacto ambiental do crescente consumo de eletricidade pelos data centers, especialmente com o aumento da demanda impulsionado pelas tecnologias de inteligência artificial (IA). Segundo a pesquisa da Deloitte, alcançar um pico nas emissões de CO2 dessas infraestruturas até o início da década de 2030 será possível apenas com ações coordenadas entre empresas de tecnologia e formuladores de políticas públicas.
Governos e empresas têm uma função central na redução do impacto climático da IA, destaca Guilherme Lockmann, sócio-líder da Deloitte. Para ele, alinhar incentivos de mercado com práticas sustentáveis, investir em tecnologias inovadoras e apoiar regulações favoráveis são medidas cruciais para impulsionar a transição energética.
Embora o consumo crescente de energia nos data centers preocupe, oportunidades para ganhos de eficiência e sustentabilidade já estão em desenvolvimento. Soluções como tecnologias de resfriamento avançado, otimização de cargas de trabalho e o uso ampliado de energia limpa podem minimizar o impacto ambiental, ao mesmo tempo em que atendem à demanda do setor.
Cenários para o crescimento da IA
A pesquisa da Deloitte apresenta dois cenários para o futuro da IA:
- Cenário Linha de Base: Integração gradual da IA em sistemas e indústrias, limitada às aplicações mais simples e economicamente viáveis. Esse cenário prevê um crescimento mais moderado entre 2024 e 2030, contrastando com o ritmo acelerado observado nos anos anteriores.
- Cenário Alta Adoção: Manutenção das tendências atuais de crescimento, com aumento significativo nas cargas de trabalho e na adoção de tecnologias generativas (GenAI). Este cenário projeta um avanço mais acelerado, refletindo o apetite por soluções tecnológicas inovadoras em diversas indústrias.
Inovação para uma IA sustentável
A busca por uma “Green AI” (IA Verde) exige inovação constante. Um exemplo promissor é o uso de resfriamento líquido por imersão, no qual racks de data centers são submersos em fluidos dielétricos, eliminando a necessidade de ventiladores e reduzindo o consumo de água. Gigantes da tecnologia, como a Google, estão testando métodos alternativos de resfriamento, incluindo o uso de águas residuais e água do mar.
Essas iniciativas visam não apenas a eficiência energética, mas também o alinhamento com metas globais de neutralidade climática. Para isso, governos e empresas devem trabalhar juntos para garantir que a demanda crescente por eletricidade seja atendida exclusivamente por fontes limpas.
Conforme o estudo, a descarbonização dos ativos energéticos deve ser uma prioridade para atender às metas globais de sustentabilidade. A adoção de energias renováveis, aliada a práticas eficientes, é essencial para transformar a IA em uma força impulsionadora da transição energética, ao invés de um fator agravante para o aquecimento global.
A combinação de avanços tecnológicos, políticas públicas robustas e compromisso do setor privado será determinante para que a revolução da inteligência artificial ocorra em harmonia com os objetivos de preservação ambiental.
O crescimento das IAs é inevitável e traz inovações para diversos setores. No entanto, a expansão desse mercado precisa ser acompanhada de medidas que mitiguem seus impactos ambientais, desde investimentos em energia limpa até a busca por maior eficiência nos data centers. A transição para uma matriz energética mais sustentável será essencial para que a revolução tecnológica não se transforme em uma ameaça ambiental.
*O estudo foi compartilhado com UM SÓ PLANETA
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