“A notícia da criação da Secretaria das Hidrovias, dada pelo ministério dos Portos e Aeroportos, sacudiu o setor de logística da economia local, empenhado em administrar fatos e sobressaltos decorrentes da crise hídrica e seus reflexos na logística fluvial regional. Uma luz que precisa virar uma poronga nessa escuridão do descaso histórico com a infraestrutura competitiva da Amazônia.”
Por Alfredo Lopes
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Coluna Follow-Up
A paisagem da Amazônia sempre foi representada por seus rios sinuosos, florestas densas e uma biodiversidade inigualável. O recente fenômeno da seca extrema nos rios amazônicos despertou preocupações globais não apenas sobre as implicações ambientais, mas também sobre a infraestrutura da região. A interrupção de alguns trechos entre Manaus e Belém ressaltou a vulnerabilidade no sistema de navegação. Aquecimento do planeta, fenômeno do El Niño, desmatamento acentuado dos últimos anos são informações conectadas à vazante histórica.
O que teria evitado a crise da navegabilidade? Medidas simples na ótica da engenharia naval. De tão simples, elas foram proteladas historicamente. Dragagem corretiva dos canais de navegação para assegurar um calado superior a 8 metros, balizamento das hidrovias, cabotagem com segurança tecnológica e institucional, recuperação da BR-319, para começo de conversa e da diversificação das opções de modal. Para compreender a magnitude do problema, é preciso entender a dependência histórica da região na hidrovia. Durante séculos, os rios foram a principal via de transporte, conectando comunidades e facilitando o comércio.
Portanto, qualquer interrupção nessa rede fluvial não é apenas um problema logístico, mas uma crise socioeconômica. E isso nos compete saber evitar. Mais do que um alerta, entretanto, esta seca representa uma oportunidade. Uma chance para repensarmos e reconstruirmos uma infraestrutura naval que não apenas atenda às necessidades atuais, mas também seja resiliente às adversidades futuras, tendo em mente as condições climáticas e geográficas da região.
O desafio, pois, é identificar as possibilidades de Infraestrutura da Amazônia em uma era de Mudança Climática. Assim, podemos demonstrar que a Amazônia não está longe do centro consumidor como bufam seus desafetos que omitem a favor de quem alugam os próprios teclados. Estamos, a rigor, mais perto dos mercados jamais alcançados no Norte do Continente, e mais perto do Canal do Panamá, só precisamos de suporte federal para assegurar as conexões competitivas. É uma aberração alguém desconhecer essas informações.
O contraste entre a riqueza natural da Amazônia e o descaso com sua infraestrutura é, sem dúvida, uma das grandes ironias de nossa era. A vastidão da região e sua importância estratégica global tornam imperativo que haja uma abordagem inteligente, integrada e sustentável para o desenvolvimento infraestrutural.
No entanto, com a recorrente mudança climática e seus efeitos amplificados, a Amazônia está em uma encruzilhada. As soluções do passado, muitas das quais eram paliativas, não são mais viáveis. É necessária uma visão mais holística que considere as adversidades geográficas e climáticas, aliada a uma execução rápida e eficaz. Os ingleses investiram fortunas nos estaleiros de Glasgow para produzir embarcações adequadas à geopolítica da Amazônia.
A latência das ações emergenciais em curso não deve obscurecer a necessidade de uma reflexão profunda e contínua sobre como a infraestrutura da região pode ser reconstruída de forma sustentável e resiliente.
Através de suas Comissões Setoriais, a propósito, o CIEAM, que reúne as empresas do Polo Industrial de Manaus, vem desenvolvendo estratégias empresariais com os parceiros públicos e do setor produtivo. O foco é promover o desenvolvimento sustentável na Amazônia frente às adversidades logísticas, atento às potencialidades e fragilidades da região. Uma delas, a Comissão de Logística, sob a batuta do professor Augusto Rocha, é um exemplo disso.
Empresas e comunidades locais sempre desenvolveram estratégias para lidar com as oscilações naturais do ciclo anual das águas, vazante e enchente na região. A economia se estrutura nesse contexto. No entanto, a recente interrupção do tráfego naval em alguns trechos obrigaram a medidas mais ousadas, maior mobilização coletiva para enfrentar a sombra de incerteza que pairou sobre a economia local. As empresas, porém, acostumadas a navegar pelas águas turbulentas da infraestrutura precária da região, tiveram que enfrentam um desafio sem precedentes. Cabe destacar a disposição da Antaq, DNiT e CPRM, organismos federais que ingressaram na empreitada.
Mas em meio a essa crise, surge uma oportunidade para repensar estratégias e adaptar-se a uma nova realidade. O fortalecimento da infraestrutura, aliado a uma melhor gestão e planejamento, pode não apenas atenuar crises futuras, mas também aproveitar ao máximo o potencial econômico da região. No coração da Amazônia, a propósito, a rodovia BR-319 tem sido uma testemunha silenciosa do progresso e do abandono. Ligando Porto Velho a Manaus, esta rodovia poderia ser uma alternativa vital ao transporte fluvial, especialmente numa vazante com as proporções atuais. No entanto, sua deterioração e o trecho desprovido de asfalto tornaram-na praticamente intransitável.
A atual crise de transporte na Amazônia ressalta a urgência de reavaliar e revitalizar a BR-319. Mas isso não é apenas uma questão de pavimentação. Qualquer tentativa de recuperação deve ser equilibrada com as devidas salvaguardas ambientais, considerando a fragilidade da região. De uma coisa estamos certos: será mais fácil e rápido assegurar a vigilância e fiscalização do traçado e seus ramais com manutenção de primeira. Deixar como está é um prato cheio para grileiros e seus parceiros de desmatamento.
A notícia da criação da Secretaria das Hidrovias, dada pelo ministério dos Portos e Aeroportos, sacudiu o setor de logística da economia local, empenhado em administrar fatos e sobressaltos decorrentes da crise hídrica e seus reflexos na logística fluvial regional. Uma luz que precisa virar uma poronga nessa escuridão do descaso histórico com a infraestrutura competitiva da Amazônia.
A proposta de um Grupo de Trabalho sob a coordenação da Suframa é uma sugestão antiga de um Acórdão de 2016, firmado entre o TCU e a PGR-AM, que recomendava um trabalho integrado da presença federal na Amazônia sob a batuta da Suframa. Um passo positivo e necessário. Através de colaboração e visão que isso representa, o gargalo da infraestrutura seria muito mais exequível do que se poderia pensar. E a novela BR-319, há 30 anos sem manutenção, pode virar realidade e, não apenas conectar cidades, mas também unir uma região em busca de desenvolvimento sustentável e progresso, integrada e alinhada com os interesses e propósitos do Brasil.
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