Como a maior espécie de primata das Américas pode ser peça-chave para reflorestamento da Mata Atlântica?

Área em reflorestamento de 292 hectares no interior de São Paulo abriga cinco dos cerca de 1300 indivíduos remanescentes na natureza da espécie de primata muriqui-do-sul, ou mono-carvoeiro

Uma espécie de primata encontrada na cidade de Anhembi, interior de São Paulo, se tornou “garoto propaganda” de medidas de conservação de uma unidade de conservação e peça-chave para o reflorestamento da Mata Atlântica. Cercada de pastagens, plantações de cana-de-açúcar, eucalipto e laranja, a Estação Ecológica do Barreiro Rico, criada em 2006, abriga cinco dos cerca de 1.300 indivíduos remanescentes na natureza de muriqui-do-sul, ou mono-carvoeiro (Brachyteles arachnoides), a maior das Américas.

Barreiro Rico se tornou recentemente parte de um grupo formado por cerca de 50 áreas atualmente monitoradas pelo NewFor, um projeto temático da FAPESP em parceria com a Organização Neerlandesa para a Pesquisa Científica (NWO). Em todas elas, são selecionadas parcelas de 900 metros quadrados de floresta em que todas as árvores com diâmetro acima de cinco centímetros na altura do peito são medidas e monitoradas. Ao todo, o projeto já monitorou cerca de 800 parcelas, distribuídas ao longo de quase toda a Mata Atlântica.

Pesquisadores estão coletando dados das plantas mais usadas pelos muriquis-do-sul na região de Anhembi. O objetivo é guiar reflorestamento que deve conectar fragmentos de Mata Atlântica
Pesquisadores estão coletando dados das plantas mais usadas pelos muriquis-do-sul na região de Anhembi; objetivo é guiar reflorestamento que deve conectar fragmentos de Mata Atlântica. (Foto: Beatriz Robbi/UFV)

Corredores ecológicos

No total, são 12 indivíduos conhecidos na chamada Área de Proteção Ambiental do Barreiro Rico, que junto com a Estação Ecológica compõem um mosaico de cerca de 30 mil hectares, com fazendas, empresas e fragmentos de Mata Atlântica. Entretanto, existe um obstáculo: “No caminho entre essas porções de floresta, existem estradas, fios de alta tensão, plantações, pastagens e construções, o que atrapalha, quando não impossibilita, os grupos de se encontrarem e se reproduzirem entre si”, pontua a doutoranda Beatriz Robbi, do Laboratório de Manejo e Conservação de Fauna da Universidade Federal de Viçosa (UFV).

A principal forma de driblar essa questão são os chamados corredores ecológicos, que consistem em florestas que conectem os fragmentos de Mata Atlântica isolados. Esse é o objetivo de um grupo de pesquisadores, ONGs e da Fundação Florestal, órgão que administra as unidades de conservação do Estado de São Paulo.

A importância dessa espécie de primata

Conectar a população de muriquis é essencial para sua conservação. Medidas com esse objetivo podem contribuir especialmente com outras quatro espécies presentes na área: bugio-ruivo, macaco-prego, sagui-da-serra-escuro e sauá. Além disso, trazem impactos positivos para mais de 200 espécies de aves e mais de 30 de mamíferos terrestres, como quatis, jaguatiricas, onças-pardas, tamanduás-bandeira, dentre outros.

Mãe carrega filhote de espécie de primata na Estação Ecológica do Barreiro Rico, em AnhembiÁrea em reflorestamento de 292 hectares no interior de São Paulo abriga cinco dos cerca de 1300 indivíduos remanescentes na natureza da espécie de primata muriqui-do-sul, ou mono-carvoeiro
Mãe carrega filhote na Estação Ecológica do Barreiro Rico, em Anhembi; combate aos incêndios contribuiu para que dois muriquis nascessem em 2023 e 2024, mas corredores ecológicos são fundamentais para grupo se conectar com outros (Foto: Beatriz Robbi/UFV)

“Os muriquis são considerados os jardineiros da floresta, importantes na manutenção da Mata Atlântica. Por se alimentarem de frutos com sementes grandes, são os principais dispersores de espécies arbóreas como cambuí, jatobá e copaíba, que outros animais não conseguem dispersar”, explica Luana Carvalho, mestranda no Laboratório de Silvicultura Tropical (Lastrop) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), que também desenvolve pesquisa no local.

Por meio do estudo da ecologia da paisagem e de sensoriamento remoto, será possível identificar fragmentos florestais de maior valor ecológico para o muriqui, ou seja, aqueles que ainda possuem qualidade para sua reprodução, alimentação e abrigo. “A partir disso, poderemos determinar onde e como conectar esses fragmentos”, diz Carvalho. “Estamos priorizando espécies arbóreas importantes para a alimentação e uso pelo muriqui, o que nos permitirá orientar uma restauração florestal focada nessa espécie. Assim, poderemos criar corredores ecológicos que, além de expandir a cobertura florestal, oferecerão os recursos alimentares necessários, respeitando as exigências de cada espécie arbórea”, afirma.

Mais informações podem ser encontradas no artigo completo da Agência Fapesp, clicando aqui.

Isadora Noronha Pereira
Isadora Noronha Pereira
Jornalista e estudante de Publicidade com experiência em revista impressa e portais digitais. Atualmente, escreve notícias sobre temas diversos ligados ao meio ambiente, sustentabilidade e desenvolvimento sustentável no Brasil Amazônia Agora.

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