“Enquanto isso, os aposentados continuam na fila. A democracia segue sendo corroída por dentro. E os criminosos — sejam golpistas de farda ou tecnocratas de gabinete — aguardam sua vez de serem anistiados. Em nome da ‘paz’, da ‘conciliação’ ou da ‘governabilidade’. É a ideologia do ódio que silencia a justiça e normaliza a impunidade.”
A anistia — entendida como perdão jurídico concedido a quem cometeu crimes — deveria ser um instrumento de reconciliação nacional. No entanto, no Brasil, ela se converteu em arma ideológica. A proposta de anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro de 2023, que tentaram subverter a ordem democrática, representa mais que um gesto político: simboliza a tentativa de apagar responsabilidades históricas e transformar crimes em bravatas, criminosos em patriotas, destruição em retórica.
Nesse cenário, a ideologia do ódio não apenas se manifesta em atos extremos de violência e vandalismo. Ela se infiltra nas engrenagens do Estado, como no escândalo recente do INSS, onde 1,5 milhão de aposentados e pensionistas, comprovadamente, já foram vítimas de descontos indevidos, resultantes de acordos entre o governo e associações obscuras que exploraram os mais vulneráveis. E o pior está por vir. A campeã das fraudes, a Ambec, que em 2020 tinha três associados, movimentou irregularmente R$ 231 milhões em 2024.
Esses dados, revelados pela Controladoria-Geral da União (CGU), apontam que os acordos de cooperação com essas entidades foram firmados entre 2021 e 2022, durante o governo passado. E é justamente aí que a narrativa ideológica se arma novamente: cada lado da disputa tenta usar os fatos como munição para culpar o outro. O governo atual aponta os ex-ministros Onyx Lorenzoni e José Carlos Oliveira. A oposição acusa o Planalto de aparelhamento e conivência.
No meio disso, a verdade vira refém. A democracia, desfigurada. E o povo, sempre ele, é sacrificado no altar do cinismo.

No meio disso, a verdade vira refém. A democracia, desfigurada. E o povo, sempre ele, é sacrificado no altar do cinismo.
É nesse contexto que o conceito de anistia ganha nova camada de significado: não apenas como um perdão jurídico, mas como um projeto de impunidade. Uma forma de suspender a justiça em nome de interesses narrativos. Anistiar os vândalos de 8 de janeiro é tão perigoso quanto anistiar administrativamente os operadores de fraudes no INSS. Em ambos os casos, o que se busca é evitar a responsabilização, contornar o devido processo legal e manter as estruturas de poder intactas.
A ideologia do ódio, ao contrário do que muitos pensam, não se resume a discursos inflamados ou redes sociais tóxicas. O ódio é um modo de operar o Estado com desprezo pelo bem comum, transformando a máquina pública em instrumento de guerra simbólica. É a caverna de Platão em versão digital: sombras projetadas com algoritmos e palanques. Aparências transformadas em verdades. Fraude travestida de direito.
Enquanto isso, os aposentados continuam na fila. A democracia segue sendo corroída por dentro. E os criminosos — sejam golpistas de farda ou tecnocratas de gabinete — aguardam sua vez de serem anistiados. Em nome da “paz”, da “conciliação” ou da “governabilidade”.
Mas não há reconciliação sem verdade. Nem democracia sem justiça. Anistiar o que destrói é permitir que se destrua de novo.