Não consigo compreender a dificuldade de diálogos construtivos para transformar a Amazônia em uma área desenvolvida. Por outro lado, agora que a seca é uma certeza, já se vê armadores cobrando mais caro, com taxa da seca antes da seca, há terminal portuário privado que agrava seu preço de armazenagem em até 357%. A crise super anunciada está se transformando em uma gigante oportunidade de ganhar mais dinheiro.
Por Augusto Rocha
_________________
Poucos eventos logísticos foram tão anunciados quanto a seca deste ano na Amazônia. Desde o evento histórico do ano passado, poucos foram os temas tão ansiados, comentados, discutidos e antecipados quanto este. Talvez apenas a Copa do Mundo e a Olímpiada no Brasil tenham sido questões logísticas relevantes que tenham tido mais atenção nacional.
O destaque se deve a variados motivos. O impacto social severo, imagens impressionantes e o estado crítico dos vastos rios da maior bacia hidrográfica mundial, secos ou com níveis bem reduzidos. Somam-se a isso os custos adicionais que superaram R$ 1,4 bilhões, apesar dos esforços para mitigar, que se mostraram pouco eficazes ou inúteis, conforme o olhar.
Assim, o que se esperava para 2024 seria um cenário diferente. Será que teremos algo diferente? Em um primeiro momento eu e outros prevíamos que a chance de acontecer algo semelhante ao ano passado era de apenas 20%. Hoje, próximo ao momento crítico, já se antevê ao menos 80% de certeza de ser igual ou pior do que o ano passado e a provável causa está associada mais ao aquecimento global do que ao El Niño, que agora se tornou um culpado menor.
Dito isso, era de se esperar um conjunto amplo de ações. Temos até Decreto de Emergência antecipado, que este ano foi em 01/03, quando no ano passado foi em 12/09, mas, até a hora da publicação deste texto, mesmo com incontáveis interações com o DNIT não consegui confirmar que a ordem de serviço da dragagem tenha sido emitida. Também não se percebem os projetos e estudos já acontecendo, além de todos os rotineiros para a região, para entender melhor o fenômeno e onde exatamente deve acontecer a dragagem na principal “hidrovia”.
A BR-319 que tem o potencial de ser uma alternativa segue sendo ignorada. A Amazônia segue sendo ignorada, em meio a um potencial gigante de riquezas, em meio a pobreza, em meio as atividades industriais ou em meio as crises. O tom do Brasil é ignorar a Amazônia. Quais podem ser os conjuntos de motivos razoáveis para isso? O que leva o país a ignorar a sua maior área e seu maior potencial?
Leia também:
Não consigo compreender a dificuldade de diálogos construtivos para transformar a Amazônia em uma área desenvolvida. Por outro lado, agora que a seca é uma certeza, já se vê armadores cobrando mais caro, com taxa da seca antes da seca, há terminal portuário privado que agrava seu preço de armazenagem em até 357%. A crise super anunciada está se transformando em uma gigante oportunidade de ganhar mais dinheiro. Quem ousa estar na região, fazendo o papel não feito pelo Estado, usa a crise da sociedade como o momento para ganhar muito mais dinheiro, sugando dos demais empreendedores.
Enquanto o Brasil não reconhecer a Amazônia como uma parte essencial do país, seguiremos, literalmente, tocando fogo. A fumaça já começa a ser vista em Manaus em um novo ano de destruições. Destrói-se a floresta, destrói-se a crença na sociedade organizada e nas instituições para o apoio da Amazônia. Sempre estamos com um grau extra de dificuldades, ao invés de facilidades construtivas. Quantos anos de crises serão necessários para reconhecer que a Amazônia precisa de infraestrutura sustentável e perene?
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade
Comentários