Entrevista com Roberto Tadros, presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Amazonas – Fecomercio – Parte II
Em sua retomada histórica, num culto inteligente ao passado, Roberto Tadros, em colóquio com esta Follow Up, sublinhou as circunstâncias da vinda da Coroa Portuguesa no início do século XIX, fugindo das ameaças do expansionismo napoleônico, quando se instalou no Rio de Janeiro, por razões de segurança, em lugar de consignar seu projeto na Amazônia, como seria economicamente razoável. A Coroa Portuguesa tinha, no relato das Viagens Filosóficas de Alexandre Rodrigues Ferreira, a noção exata das riquezas naturais da região. Eles anteviram os benefícios para a humanidade na exploração deste patrimônio. “Na minha opinião, pesquisar este tesouro natural para promover o desenvolvimento inteligente da região deveria ser o papel do CBA, Centro de Biotecnologia da Amazônia”, insiste Roberto Tadros, ao lembrar que participou do lançamento da pedra fundamental do empreendimento ao lado de Marco Maciel, então vice-presidente da República, e de Mauricio Loureiro, presidente do Centro da Indústria. “O senador Marco Maciel, casado com uma amazonense de Parintins, rapidamente entendeu a importância do CBA para prospectar novos negócios com a nossa riqueza de fármacos e cosméticos. Não faz sentido ficar tanto tempo sem definição do modelo de gestão, muito menos o contingenciamento das verbas de pesquisa e desenvolvimento que possam desenvolver novos perfis de negócios que fortaleçam o polo industrial para diversificar e interiorizar que a economia. Todo esse esforço, porém, insiste o empresário, passa por um investimento robusto na logística regional e continental de transportes intermodal que aproxime o Oceano Pacífico e o Atlântico, utilizando ferrovias, hidrovias e rodovias com racionalidade estratégica, de olho no fluxo do agronegócio, de modelagem comercial semelhante ao Panamá e os bens da indústria, bioindústria e do polo mineral de fertilizantes. Precisamos parar de reclamar ou ficar esperando as iniciativas federais. O CBA é um exemplo bem claro. “Quem financiou o projeto foram as taxas das empresas para a Suframa, portanto, as empresas, suas entidades, de trabalhadores e dos investidores, todo o setor produtivo, o poder público, precisam ser ouvidos”. Antes de chamar Roberto Campos e Arthur Amorim, para solicitar estudos visando consolidação do projeto ZFM do deputado Pereirinha, lembra Tadros, o presidente Humberto de Alencar Castelo Branco, que atuara em Manaus, no comando do Primeiro BIS, Batalhão de Infantaria de Selva, antigo Vigésimo Sétimo Batalhão de Caçadores, chamou as entidades do setor produtivo e ouviu suado ponderações e demandas.
Os militares na Amazônia
Os militares têm na Amazônia a imagem de parceiros do processo civilizatório. Entretanto, o Brasil se recusa a reconhecer esta parcela como sua identidade. Em recente entrevista à Folha, o general Eduardo Vilas Bôas, comandante militar da maior floresta tropical do mundo, disse que a Amazônia é como uma colônia do Brasil. “Ela não está integrada ao país e, portanto, não há conhecimento de sua realidade e potencial”, disse um general que coordena um batalhão de 19 mil homens e 9.300 km de fronteiras. Nos anos 60, eles já sabiam do abandono das fronteiras e dos custos fiscais e de frete dos produtos para abastecimento local, bem como de todo o risco que as guerrilhas ofereciam para a região e a cobiça estrangeira, alertada pelo professor Arthur Cézar Ferreira Reis, em seu livro-denúncia, Amazônia e a cobiça internacional. Manaus, construída e eleita como capital da Província, no coração da floresta, equidistante das posições estratégicas nacionais e continentais, permanece abandonada pela União, a despeito de sua contribuição robusta na composição do PIB no período áureo da borracha e de devolver – pela renúncia fiscal praticada – para os cofres federais nos últimos 10 anos, R$ 53 bilhões, contra apenas R$ 17 bi aplicados. Belém, capital do antigo Grão-Pará e Maranhão, e que oferecera ao segundo império um representante da Amazônia, Bernardo de Souza Franco, que chegou a ministro da Fazenda, na era Barão de Mauá, sempre foi agraciada também pela República com asvprincipais agências e autarquias federais, incluindo a SPEVEA, a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, com 3% das receitas federais que jamais foram aplicados integralmente na região. “Esse relato não é revanchista, ao contrário, recomenda proatividade e comunhão e um convite para que nossos jovens conheçam a História da região, para entender o presente e planejar com inteligência seu amanhã.”
Em favor do Amazonas
Em 1967, segue o empresário e pensador Roberto Tadros, quando o governo militar decidiu publicar o Decreto- Lei 288/67, criando a Zona Franca de Manaus, nos moldes atuais, com integração entre comércio/serviços, indústria e agricultura, contabilizamos um acerto sem precedentes e a primeira medida arrojada em favor do Amazonas e da Amazônia Ocidental no regime republicano. Isso não voltará a acontecer. Os interesses são outros. Não podemos ficar mais na dependência de soluções extraordinárias de um regime de força para consolidar a Zona Franca de Manaus, pois nada sugere que o Amazonas está agenda de prioridades federais. A ZFM, cabe lembrar, surge na sequência do Instituto Hudson, que pretendia inundar a região para facilitar a navegação internacional, à frente os interesses das corporações estrangeiras, para mais facilmente acessar e transportar o jazimento mineral da região. Antes, com o beneplácito da ONU, o Instituto da Hileia Amazônica, por sua vez, pretendia, com adesão de alguns cientistas brasileiros, implantar-se na Amazônia em nome de curiosos interesses humanitários para inventariar os acervos e identificar opções para acomodar refugiados da II Guerra Mundial. A instalação do Inpa sinalizou uma atitude da União, apesar da precariedade dos recursos despendidos. Não havia sede, orçamento, sequer um microscópio para pesquisa botânica, tudo funcionou no começo com a adesão e colaboração local, incluindo os laboratórios de análises clínicas dos serviços de saúde. A partir dos anos 60, movimentos de guerrilha no Continente traziam para as desguarnecidas fronteiras amazônicas as sequelas da Guerra Fria entre União Soviética e Estados Unidos. Por isso, a decisão do governo brasileiro, baseada nos estudos estratégicos da Escola Superior de Guerra, aliada a algumas circunstâncias que incluem figuras como Arthur Amorim, filho de um próspero comerciante do II Ciclo da Borracha, J.S. Amorim, o diplomata e pensador Roberto Campos, os pioneiros Isaac Sabba, Moysés Israel e demais heróis de nossa história de resistência para assegurar saídas para o Amazonas.
Educação e a geografia da brasilidade
Conhecer a história é também uma oportunidade de entender os pilares de nossa identidade cultural e dos valores que estão na base de nossa atuação, insistiu Roberto Tadros, ao relembrar o papel do Colégio Dom Bosco, uma referência de formação humana e espiritual que chegaram a Manaus em 1920, mas já estavam nas missões religiosas da Amazônia bem antes, uma presença de 100 anos? Erguido com a ajuda de alguns comerciantes locais, o Colégio em Manaus funcionou em seus primeiros anos com aulas diurnas para os filhos de famílias remediadas e noturnas para os filhos de operários. O ensino era avançado, enaltecendo as leituras interpretativas. O colégio contava ainda com o Oratório Festivo, prática mundial das obras salesianas, animado por partidas de futebol, competições de atletismo, sessões de cinema e outras atividades de lazer, além do ensino humanista e religioso. Sua presença remete ao papel da Educação, este instrumento que ultrapassa o mero treinamento técnico, e repassa os princípios do respeito, da acolhida e da solidariedade, base das transformações sociais. Precisamos unir esforços, identificar, promover e multiplicar talentos e muita determinação para equacionar os entraves de infraestrutura, simplificar as operações com redução drástica da burocracia, da cangalha tributária, priorizando a qualificação dos jovens, o sentimento nativista sem xenofobia nem preconceitos, apenas obstinados a integrar a região ao país, do qual nossa região significa mais de dois terços, de geografia e de esperança.
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