A rodovia BR-319, que liga Manaus a Porto Velho na Amazônia Ocidental, tem sido o centro de um debate intenso e contínuo, envolvendo questões de recuperação e preocupações ambientais. Inaugurada em 1976, a rodovia é fundamental para a ligação terrestre entre a indústria da Amazônia e o Brasil, mas enfrenta desafios significativos. Como avançar?
Por Lúcio Flávio Morais de Oliveira
________________________________
Coluna Follow-Up
É preciso debater o isolamento rodoferroviário de dois grandes estados da Amazônia Ocidental, Amazonas e Roraima, que compromete substancialmente o desenvolvimento de projetos sustentáveis que reúnam defesa da propriedade social vinculada ao princípio da sustentabilidade. O encaminhamento desse embaraço de infraestrutura remete ao princípio segundo o qual a proteção dos estoques ambientais supõe a implantação de atividades econômicas sustentáveis. Não temos outro caminho.
Por um lado, existem esforços para a recuperação da rodovia, incluindo a pavimentação de trechos que estão em condições precárias há décadas. Em 2020, por exemplo, o governo federal iniciou obras de asfaltamento em parte da rodovia. Estes esforços visam sempre melhorar o transporte e a logística na região, trazendo potenciais benefícios econômicos e de integração para as comunidades locais, bem como para a base econômica do polo industrial de Manaus.
Por outro lado, há intensas preocupações ambientais e sociais. Ambientalistas alertam para os riscos de desmatamento e impactos negativos na biodiversidade da Amazônia, especialmente se a rodovia facilitar o acesso a áreas até então preservadas. A pavimentação da BR-319 pode estimular o desmatamento e a grilagem de terras, além de afetar comunidades indígenas locais que não foram adequadamente consultadas no processo de licenciamento. Essas preocupações são reforçadas pelo fato de a rodovia estar rodeada por várias unidades de conservação ambiental.
Em resumo, a história recente da BR-319 é marcada por um equilíbrio delicado entre a necessidade de desenvolvimento e recuperação de infraestrutura e os imperativos de proteção ambiental e social. O debate continua, refletindo as complexidades e os desafios enfrentados na gestão de recursos e desenvolvimento na Amazônia Ocidental, A rodovia que liga Manaus a Porto Velho está praticamente intrafegável há mais de 30 anos. Os estudos de impacto ambiental relacionados à rodovia BR-319 revelam preocupações significativas e variadas. Um dos principais focos é o potencial aumento do desmatamento e seus efeitos na biodiversidade, bem como o impacto social nas comunidades locais.
Um estudo encomendado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), em 2020, reconheceu possíveis efeitos negativos da repavimentação da BR-319, incluindo um impacto imediato na fauna e na flora da região. Foi estimado que a repavimentação poderia quadruplicar o desmatamento no Amazonas, afetando não só a vegetação nativa, mas também os serviços ambientais como a regulação de chuvas, essenciais para outras regiões do Brasil, especialmente para o agronegócio.
Estudos realizados pelo Idesam (Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia), em 2018, analisaram a evolução do desmatamento e também os impactos socioeconômicos na região. Foram observadas mudanças nos indicadores como PIB e IDH, mostrando tanto progressos quanto desafios contínuos, incluindo altos níveis de desigualdade na distribuição de renda.
Há uma demanda contínua por avaliações mais aprofundadas e monitoramento dos impactos da rodovia. O Observatório da BR-319, por exemplo, se dedica a divulgar informações e conteúdos estratégicos sobre a área de influência da rodovia, incluindo desmatamento e focos de calor.
Outros estudos e um acervo monumental de artigos, debatem a reconstrução da BR-319, alvo de debates intensos, envolvendo ambientalistas, indigenistas, representantes do governo e engenheiros. Questões como a legalidade da ocupação de terras, a grilagem e o impacto nas comunidades indígenas também estão no centro das discussões. Uma série de reportagens da Rede Amazônica, de 2016, revela os conflitos, paradoxos e contradições no gerenciamento deste embaraço, incluindo a revelação das imagens que confirmam explosões com dinamite na Terra do Meio, trecho de mata virgem, claramente destinadas a comprometer sua recuperação.
Esses estudos e debates evidenciam a delicadeza das problemas desta conexão rodoviária. Uma das ilações mais recorrentes remete ao desinteresse da União com um investimento de alto custo e uma taxa de retorno discreta, não compensatória. Outras alegam o custo ambiental extremo comparado ao benefício de ir e vir da população posto que a rodovia não suporta a movimentação de cargas de mercadorias com tonelagem expressiva. Essa complexidade dos impactos ambientais e sociais relacionados à reconstrução da BR-319, destacando a necessidade de um equilíbrio cuidadoso entre desenvolvimento e conservação, precisa responder a uma pergunta essencial: proteger a floresta é mais fácil com a pavimentação da rodovia ou sua manutenção no estado atual, intrafegável durante 8 meses por ano.
A questão de proteger as florestas através da pavimentação ou manutenção de estradas em seu estado natural é complexa e depende de vários fatores. Por um lado, estradas bem construídas e mantidas podem, em teoria, facilitar o monitoramento e a fiscalização das florestas, potencialmente ajudando na proteção contra o desmatamento ilegal e outras atividades prejudiciais. Um curso organizado pelo Instituto Floresta Tropical (IFT) e WWF-Brasil no Pará mostrou que é possível construir estradas em áreas florestais minimizando os impactos ambientais. Isso inclui a abertura de estradas para manejo florestal sustentável, o que requer planejamento cuidadoso para gerar o menor impacto possível aos ecossistemas.
No entanto, a construção de estradas em florestas tropicais úmidas, como na Amazônia, traz desafios significativos. Estudos mostram que as estradas, sem planejamento de monitoramento e fiscalização adequadas, podem levar a um aumento do desmatamento, fragmentação de habitats, caça predatória e exploração madeireira ilegais. Adicionalmente, os custos de manutenção podem ser muito altos devido aos desafios impostos pelo clima e terreno, muitas vezes superando os benefícios econômicos iniciais. A manutenção inadequada das estradas pode levar à degradação e erosão, piorando as condições da floresta ao redor.
Em suma: a rodovia BR-319, que liga Manaus a Porto Velho na Amazônia Ocidental, tem sido o centro de um debate intenso e contínuo, envolvendo questões de recuperação e preocupações ambientais. Inaugurada em 1976, a rodovia é fundamental para a ligação terrestre entre Manaus e Porto Velho, mas enfrenta desafios significativos. Como avançar?
Lúcio Flávio é advogado, empresário e presidente-executivo do Centro da Indústria do Estado do Amazonas.
Coluna Follow-up é publicada às quartas, quintas e sextas feiras no Jornal do Comércio do Amazonas, sob a responsabilidade do CIEAM e coordenação editorial de Alfredo Lopes, consultor da entidade.
Comentários