Baseado em um levantamento que contou com a participação de profissionais de 370 parques naturais – o equivalente a mais de dois terços de todos os parques cadastrados no país – o Instituto Semeia revela que na esfera federal, a média é de um único funcionário para cada 11 mil hectares de área protegida. Na esfera estadual, o número é menor, com uma média de um profissional para cada 2 mil hectares, e na municipal é de um para cada 58 hectares. De acordo com a análise feita recentemente pelo estudo, a falta de equipe, de recursos e de infraestrutura básica para visitação são os principais desafios enfrentados na gestão dos parques brasileiros.
Os dados foram publicados em março no relatório “Diagnóstico de Uso Público em Parques Brasileiros: A Perspectiva da Gestão”, disponível para leitura online. Esta é a 5ª edição da análise, feita a cada dois anos pelo Instituto Semeia, com o objetivo de mapear aspectos relacionados à gestão dos parques a partir da visão dos profissionais que atuam na administração dessas áreas. As informações foram coletadas através de um questionário online enviado aos participantes, entre maio e agosto de 2020, e reúne profissionais de parques das três esferas de governo e de todas as regiões e biomas.
Dentre os parques analisados, 49% conta com equipes de até 10 funcionários e 9% possui apenas uma pessoa no seu quadro operacional. Além disso, o estudo destaca que a maior parte do tempo de trabalho desses profissionais é dedicada à rotina administrativa (41%), o que diminui a disponibilidade para outras ações, como atividades de uso público, conservação e fiscalização.
Segundo o levantamento, 86% dos parques têm conflito com ao menos um ator social – com destaque para caçadores e palmiteiros (64%), agropecuaristas (58%) e pescadores (34%).
“Isso ilustra o grande desafio que a gestão enfrenta para conciliar todas as demandas contando com um quadro reduzido”, ressalta Mariana Haddad, coordenadora do Semeia responsável pelo estudo.
Na opinião de 67% dos profissionais entrevistados, faltam recursos não apenas humanos, mas também financeiros, para a realização das atividades do parque e 40% destacaram que não possuem acesso às informações orçamentárias dos parques em que atuam. Entre os que possuem acesso a estes dados, seja de forma parcial ou total, o valor médio do orçamento em 2019 foi de R$790 mil para os parques federais, R$9,6 milhões para estaduais e R$800 mil para os municipais.
“Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, o National Park Service [Serviço Nacional de Parques], órgão responsável por gerenciar 421 unidades, que correspondem a 34 milhões de hectares, teve em 2019 um orçamento de USD 2,4 bilhões. O ICMBio, no mesmo ano, teve um orçamento de R$ 791 milhões, isto é, USD 142,6 milhões, para gerir cerca de 170 milhões de hectares de áreas protegidas terrestres e marinhas”, compara a coordenadora.
O orçamento do ICMBio, mencionado pela coordenadora, é referente ao ano de 2019. Em 2020, o orçamento do órgão gestor das 334 unidades de conservação federais foi reduzido para R$596 milhões. A previsão para 2021 é ainda pior, de acordo com o Projeto de Lei Orçamentária Anual, já aprovado e esperando sanção presidencial, o Ministério do Meio Ambiente terá o menor orçamento das últimas duas décadas.
“As equipes gestoras dos parques lidam com recursos restritos. Por outro lado, a pesquisa evidencia que existe um potencial, ainda subutilizado, de receitas que poderiam vir a ser geradas e revertidas para o aprimoramento dos parques”, analisa Haddad, que cita a visitação como uma alternativa possível para gerar receita para o parque.
De acordo com o levantamento, entretanto, apenas 24% dos parques gerou receita em 2019 a partir de um ou mais serviços relacionados ao uso público. E apenas 13% gerou receita através da cobrança de ingresso, mas em 62% deles este recurso não foi revertido diretamente para o parque.
A análise do Semeia também mapeou as condições de cada um destes parques para visitação e das unidades que receberam visitantes em 2019 (79%), apenas 7% afirmaram contar com uma estrutura que garante plenamente as necessidades básicas de visitação em suas áreas e somente 11% consideram que a manutenção das estruturas está em excelente estado. De acordo com a pesquisa do Semeia, 32% dos parques não possui estrutura de apoio à visitação.
“Nossos parques têm um grande potencial turístico. Temos locais com paisagens cênicas exuberantes, que poderiam ser mais visitados e conhecidos pela sociedade. Mas no momento em que não oferecemos condições básicas de visitação, esse potencial fica comprometido e essas áreas ficam impedidas de cumprir plenamente uma de suas missões fundamentais, além da conservação: serem o elo de aproximação entre as pessoas e a natureza”, explica Mariana.
A pesquisa mostra ainda que 40% dos parques não possuem plano de manejo (documento basilar para gestão de uma unidade de conservação) e que, entre os que possuem, apenas em 18% dos casos o plano está integralmente implementado. Quanto à regularização fundiária, apenas 23% dos entrevistados informaram que os parques onde atuam estão completamente regularizados. Outro dado levantado é que 73% dos parques possuem conselho consultivo – independentemente de estar ativo e/ou regularizado – e, entre eles, 52% dos participantes afirmam que o conselho está envolvido na maior parte das decisões importantes.
“A pesquisa também abre espaço para um debate importante sobre a necessidade de avançarmos numa agenda mais moderna e empreendedora sobre os parques brasileiros e seus órgãos gestores, de modo que esses órgãos tenham mais autonomia e consigam fomentar oportunidades relacionadas ao turismo e à adoção de parcerias e concessões de serviços em parques, por exemplo”, aponta Fernando Pieroni, diretor-presidente do Semeia.
Os profissionais entrevistados em sua maioria (93%) acreditam que parcerias entre o poder público e o setor privado podem ajudar a melhorar a infraestrutura dos parques, assim como o atendimento aos visitantes (89%).
“Na prática, os gestores passam a atuar mais focados em ações voltadas à conservação e à fiscalização desse parceiro privado, que é mais ágil, flexível e vocacionado a desenvolver serviços turísticos que melhoram a experiência dos visitantes”, conclui o diretor-presidente.
Fonte: O Eco
Comentários