Transição energética: como participar a partir de seu lar

“Estudo da GHM Solutions e do Instituto de Energia e Ambiente da USP mostra que automação e eficiência em edifícios podem economizar, por ano, o equivalente à produção de Itaipu e milhares de quilômetros de linhas de transmissão. Mas essa revolução começa em casa, com decisões de consumo, automação simples e pressão cidadã por prédios mais inteligentes.”

Quando se fala em transição energética, muita gente pensa apenas em grandes usinas solares, eólicas offshore ou carros elétricos. Mas uma parte enorme dessa transformação está… no prédio onde você mora, trabalha, estuda ou busca serviços.

Um estudo recém-divulgado pela GHM Solutions, em parceria com o Instituto de Energia e Ambiente da USP (IEE-USP), calculou que medidas de automação e eficiência em edifícios têm potencial para reduzir em 87 TWh por ano o consumo de eletricidade no Brasil – cerca de 14% de toda a demanda elétrica do país, o equivalente à produção anual de Itaipu.

Em termos de infraestrutura, isso significaria evitar investimentos em nova geração e cerca de 12 mil quilômetros de linhas de transmissão, além de um ganho direto para o consumidor na conta de luz.

Segundo o estudo, 5,9 milhões de edifícios no Brasil – entre comerciais, de serviços e residenciais – têm perfil de consumo que justificaria investimento em eficiência e automação.

  • Sensores de presença para iluminação de áreas comuns;
  • Sistemas de gestão predial, que monitoram em tempo real o uso de ar-condicionado, iluminação e tomadas;
  • Automação de horários de funcionamento (desligar automaticamente o que não precisa ficar ligado à noite ou fins de semana);
  • Iluminação eficiente e inteligente, com LED e dimerização;
  • Integração com fontes renováveis, como geração solar no telhado.

De forma geral, a pesquisa aponta que essas soluções podem reduzir entre 20% e 40% o consumo dos prédios, com payback de 1 a 3 anos para soluções básicas e até 5 anos para projetos mais robustos em grandes consumidores.

A engenheira Juliana Ulian, CEO da GHM Solutions e coordenadora do estudo, lembra que uma grande edificação tem, em média, 50 anos de vida útil – e 85% de todo o custo ao longo desse período são operação e manutenção, com forte peso da energia elétrica.

“Se a gente motiva todo esse setor, a gente consegue fazer coisas melhores, com impacto maior e um retorno mais rápido”, afirma. Para ela, é hora de incluir automação, sensores, IoT e softwares de gestão como parte dos critérios dos chamados “selos verdes” de edificações e dos programas de financiamento público à eficiência.

Um exemplo citado é a chamada pública Energia Zero, do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), que incentiva a modernização de prédios públicos com foco em eficiência e geração renovável. A ideia defendida por pesquisadores é que, no futuro, esses editais passem a exigir também automação, inteligência artificial e gestão energética digital como itens financiáveis, especialmente quando se fala em prédios com conceito “energia zero”.

Transição energética
Imagem: Tarcisio Schnaider / Shutterstock.com)

Se o estudo olha para milhões de edifícios Brasil afora, o leitor pode perguntar: onde entro nessa história? Abaixo, alguns “degraus” para participar da transição energética começando do próprio lar.

Pegue sua conta de luz dos últimos 12 meses e observe a evolução do consumo (kWh) e do valor pago. Identifique os “vilões”: ar-condicionado, chuveiro elétrico, geladeira antiga, iluminação ineficiente, freezer extra, etc.

Apps oferecidos por algumas distribuidoras e medidores inteligentes domésticos já permitem acompanhar o consumo quase em tempo real, aproximando a lógica de gestão predial da realidade residencial.

Mensagem-chave: você não gerencia o que não mede. Transição energética em casa começa com transparência no uso da energia.

Troque toda a iluminação de casa por LED de boa qualidade (com selo Procel A). Em áreas comuns de condomínios (garagem, corredores, escadas), sensores de presença evitam luz acesa o tempo todo.

Em casas maiores, considerar dimerização (controle de intensidade) e automação simples por aplicativo ou assistente virtual já traz ganhos relevantes. Num prédio, só a troca de iluminação e o ajuste de horários já pode representar até 20% de economia, segundo estimativas de projetos de eficiência em edificações.

Priorize equipamentos inverter e com máxima eficiência energética. Use controle de temperatura responsável (cada grau a menos no termostato pode subir a conta em cerca de 5%–7%, dependendo do sistema).

Combine timer + sensores: o aparelho liga e desliga em horários programados e não fica resfriando cômodo vazio.

Em condomínios empresariais, sistemas de automação conseguem regular o ar-condicionado por zona, conforme ocupação real.

  1. Tomadas, stand-by e equipamentos “fantasmas

TVs, modems, decoders, carregadores e outros aparelhos em stand-by podem representar até 10% do consumo residencial.

Tomadas inteligentes permitem programar horários de desligamento ou cortar a energia de vez durante a madrugada, sem precisar tirar tudo da tomada.

Isso aproxima o lar da lógica da automação predial: não é só ligar e desligar – é criar rotinas inteligentes, com base no seu estilo de vida.

Quando a conta de luz é mais alta ou a residência é em casa (não apartamento), entra em cena a possibilidade de geração solar fotovoltaica no telhado ou em consórcio/cooperação (geração compartilhada).

A automação ajuda a sincronizar o uso de energia com a geração solar, ligando máquinas de lavar, bombas de piscina e outros equipamentos justamente nas horas de maior produção.

Muitos inversores e sistemas de gestão hoje já trazem monitoramento em tempo real via app, permitindo ajustar hábitos de consumo na marra – e com dados.

O estudo da GHM/IEE-USP mostra que parte relevante do potencial de economia está em edifícios coletivos: condomínios residenciais, shoppings, hospitais, escolas, órgãos públicos.

Se você mora em condomínio, pode:

Levar o tema para assembleias e conselhos: propor auditoria energética, projeto de iluminação eficiente, sensores de presença e fotovoltaica para áreas comuns.

Cobrar da administradora um plano de eficiência com cronograma, meta de economia e payback.

Defender que novas obras e reformas já incluam automação básica, em vez de repetir projetos antigos que “travam” o prédio no século passado.

É aí que o cidadão vira contador de histórias da transição: cada condomínio que se moderniza vira exemplo para a rua, o bairro, a cidade.

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Pressão cidadã por políticas públicas

Além da ação direta em casa e no prédio, há um papel político importante:

Acompanhar programas como o Procel Edificações e a chamada Energia Zero para prédios públicos, cobrando que sejam aplicados de forma transparente e com foco em eficiência real, não só fachada verde.

Influenciar conselhos de classe, ONGs, associações de moradores e entidades empresariais para que automação, IoT, IA e gestão energética passem a ser requisitos dos selos verdes e dos financiamentos para novas edificações.

Na Amazônia, onde a expansão de linhas de transmissão e grandes usinas traz impactos ambientais e sociais intensos, cada megawatt economizado em um prédio é um megawatt que não precisa ser produzido com mais pressão sobre florestas e rios.

Quando falamos que o Brasil pode “economizar uma Itaipu por ano” só com eficiência e automação em edifícios, não estamos falando de um detalhe técnico. Estamos falando de política energética, segurança climática, qualidade de vida nas cidades e na floresta.

Mas essa revolução não acontece apenas em laboratórios, ministérios ou grandes empresas. Ela começa:

  • No interruptor que você troca por LED;
  • No sensor que o seu condomínio instala na garagem;
  • No app que você passa a usar para entender sua própria conta de luz;

Transição energética não é uma abstração distante. É, antes de tudo, uma mudança de comportamento e de tecnologia que cabe na palma da mão – e no teto da sua casa.

Rildo Silva
Rildo Silva
É empresário e presidente do SINAEES – Sindicato da Indústria de Aparelhos EletroEletrônicos e Similares e membro da Comissão ESG do Centro da Indústria do Estado do Amazonas.

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