Pesquisa revela contradições entre metas ambientais e financiamento agrícola no sistema agroalimentar do Brasil, com baixo apoio a práticas sustentáveis e concentração de recursos em monoculturas.
Apesar de avanços pontuais, o Brasil ainda carece de uma estratégia articulada e eficaz para promover uma transição justa e sustentável em seu sistema agroalimentar, setor responsável por cerca de 75% das emissões de gases de efeito estufa do país. A constatação é de um estudo conduzido pela Cátedra Josué de Castro (USP) e pelo Cebrap Sustentabilidade, que analisou três políticas públicas centrais: o Plano Safra, o Plano Clima e o Plano de Transformação Ecológica.
O Plano Safra, com mais de R$ 500 bilhões em recursos, é o principal instrumento de crédito rural do país. Embora possua linhas voltadas à agricultura de baixo carbono, a maior parte dos recursos ainda financia monoculturas convencionais. O apoio à agroecologia representa menos de 3% do total.
Já o Plano Clima, alinhado ao Acordo de Paris, introduz metas para mitigação e adaptação até 2035. Apesar de avanços como a inclusão da restauração florestal, o plano ainda apresenta contradições, como a priorização de biocombustíveis que podem incentivar o avanço de monoculturas. Essas tensões expõem a falta de articulação entre metas climáticas e práticas que impactam diretamente o sistema agroalimentar.
O Plano de Transformação Ecológica, por sua vez, aposta em instrumentos financeiros como a Taxonomia Sustentável e o EcoInvest para redirecionar investimentos ao baixo carbono. No entanto, persistem dúvidas sobre a inclusão de pequenos produtores e populações vulneráveis nesses mecanismos, especialmente diante das exigências de certificação e apoio técnico.
O estudo destaca que, embora os planos sinalizem esforços de transição, ainda faltam coerência, coordenação e metas claras de inclusão. A reforma do crédito rural, o fortalecimento da governança interministerial e o monitoramento contínuo dos instrumentos financeiros são apontados como eixos fundamentais para transformar o sistema agroalimentar em um vetor de desenvolvimento climático, econômico e social. Às vésperas da COP30, o Brasil mas precisará demonstrar como pretende transformar estruturalmente seu sistema agroalimentar e não apenas replicar soluções convencionais ineficazes.