Alimentos como manga, café e algumas leguminosas exemplificam como agricultores estão adotando novas culturas, técnicas e locais de cultivo à medida que o mundo aquece
À medida que as mudanças climáticas dificultam o cultivo de culturas historicamente emblemáticas em determinados países, agricultores locais estão cada vez mais investindo em trocar o foco de suas plantações. Em regiões como Sicília, Puglia e Calábria, por exemplo, na Itália, as tradicionais azeitonas e os limões, dentre outras frutas cítricas, já começaram a ser trocados por frutas tropicais, como a manga.
Em reportagem produzida pelo portal Grist e co-publicada com o El País, especialistas apontam que o aumento das temperaturas, as mudanças nos padrões de precipitação e o surgimento de novas doenças fazem parte da complexa rede de impactos climáticos que estão transformando as zonas agrícolas ao redor do mundo.
Muitos produtores estão abandonando culturas de baixa produtividade ou vulneráveis a pragas e patógenos, optando por variedades mais resistentes e adaptáveis às novas condições climáticas.

A manga, fruta essencial em diversas culinárias e culturas ao redor do mundo, é um bom exemplo dessa transformação. Essa fruta supera em vendas a maioria de seus equivalentes tropicais e já é cultivada em cerca de 120 países. No entanto, os principais produtores enfrentam desafios crescentes, como temperaturas mais altas, maior aridez e outras condições adversas, que dificultam o cultivo da espécie. Suas árvores, que podem ultrapassar 30 metros de altura, prosperam em temperaturas em torno dos 20°C e são extremamente sensíveis à geada.
Assim, à medida que sua popularidade cresce — com uma produção global projetada para alcançar 65 milhões de toneladas métricas no próximo ano —, o cultivo da manga começa a migrar para novas regiões.
Transições de culturas e técnicas de cultivo de alimentos
O mesmo acontece em zonas agrícolas na América Latina e na Ásia, onde agricultores estão cada vez mais adotando variedades altamente adaptáveis de quinoa, em substituição a culturas sensíveis ao clima, como o café. Nos Estados Unidos, produtores de milho no Centro-Oeste estão experimentando milhetos resistentes à seca. Em paralelo, na África Subsaariana, agricultores investem em variedades de sorgo e leguminosas, que exigem menos água do que outros grãos, tornando-se alternativas mais sustentáveis diante das mudanças climáticas.
Essa tendência só tende a se acelerar: antes do fim do século, algumas regiões poderão ser forçadas a substituir suas principais commodities. No Reino Unido, por exemplo, o cultivo de alimentos tradicionais como aveia e trigo podem dar lugar a soja, grão-de-bico e até uvas.

Já o México, Brasil e Peru, que juntos produziram quase 5,5 milhões de toneladas métricas de mangas, mangostões e goiabas em 2023 (embora não sejam botanicamente relacionadas, essas frutas tropicais costumam ser agrupadas em avaliações comerciais internacionais), registraram quedas na produção no último ano, o que é mais um indicador de possíveis mudanças de locais de cultivo da fruta.
De acordo com dados da FAO, o Peru foi o mais afetado, registrando uma redução de 55% nas exportações. Já o México e o Brasil também tiveram quedas, de 2% e 8%, respectivamente.
Símbolo das mudanças climáticas

Com isso, além da presença cada vez mais forte na Itália, agora a manga pode ser encontrada em novas regiões dos Estados Unidos. Na Califórnia, onde as mangas são cultivadas no sul do estado desde o final do século XIX, agricultores das regiões central e norte estão começando a adotar a cultura, expandindo sua produção.
A Flórida também se destaca como uma área promissora para o cultivo da fruta, impulsionada por condições climáticas favoráveis e pelo aumento do interesse na diversificação agrícola.
Em um cenário onde a agricultura está em constante transformação, a fruta se tornou um alerta dos impactos ambientais e, ao mesmo tempo, um símbolo de resiliência, demonstrando sua capacidade de se desenvolver em diferentes territórios.