“Falta brasilidade ao Brasil. Falta compromisso com o que é de todos. Falta sentido de Nação. E sobra cálculo eleitoral, sobra barganha, sobra cinismo. Em nome de quem se governa neste país? Em nome de quem se legisla? “
O Brasil está ferido em sua brasilidade. Não aquela de folclore ou de festa, mas a brasilidade que nasce do compromisso com o bem comum, com a soberania popular e com a integridade da coisa pública.
A cada nova manobra política, a cada chantagem institucionalizada, o país vai se afastando de si mesmo — do Brasil que deveria ser. A exigência do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, para que o governo suspenda imediatamente as novas regras do IOF — em nome da defesa dos varejistas — é mais um capítulo do realismo político brasileiro, onde os princípios da República são substituídos pelo “vale tudo” da polarização.
O recado foi dado em alto e bom som: ou o governo recua, ou enfrentará dificuldades reais para governar. Dificuldades orçamentárias, inclusive. Mas desde quando o parlamento se tornou executor de políticas públicas, gestor direto do orçamento, distribuidor de verbas sem qualquer delegação popular para isso?
Desde que as chamadas “emendas de relator” — rebatizadas de “emendas discretas”, mas que são, na essência, as emendas secretas sob nova roupagem — criaram um orçamento paralelo, opaco, inalcançável por auditorias consistentes, e recheado de beneficiários investigados pela Polícia Federal.
É esse o retrato de um país em distorção profunda: o Legislativo, que deveria fiscalizar o Executivo, se tornou seu principal chantagista. E o Executivo, em vez de governar com firmeza, se vê forçado a ceder — não por convicção, mas por medo de colapso.
O que está em jogo já não é apenas a política econômica. É a própria democracia que se vê encurralada por um presidencialismo de chantagem e um parlamentarismo de ocasião.
A polarização política, que anestesia o senso crítico de uma parte significativa da população, transformou o Brasil num tabuleiro onde não há mais regras estáveis. Tudo vale — desde que se vença. Desde que se leve vantagem. Desde que se mantenha o controle de verbas e cargos.
Os interesses públicos, nesse cenário, são coadjuvantes. O país real — com seus trabalhadores, empreendedores, agricultores, povos originários, cientistas, educadores, servidores honestos — assiste, à margem, a um teatro que já não o representa.
Falta brasilidade ao Brasil. Falta compromisso com o que é de todos. Falta sentido de Nação. E sobra cálculo eleitoral, sobra barganha, sobra cinismo.
Em nome de quem se governa neste país? Em nome de quem se legisla?
Não é mais possível aceitar que a política brasileira continue a operar nesse regime de chantagens disfarçadas de negociação, de privilégios disfarçados de meritocracia, de corrupção disfarçada de gestão eficiente.
O Brasil não pode ser sequestrado por interesses de ocasião. É hora de restituir à política sua função nobre: a de servir ao povo.