COP30 e o sistema de preços ataca novamente

“A COP30 em Belém, que nos últimos dias tem sido novo pretexto para expressões baixas e preconceituosas contra uma sociedade amazônida. Foram em torno de notícias sobre os preços elevados das hospedagens, seus efeitos quanto a afastar participantes e tentativas atabalhoadas de soluções por parte de governantes”

Difícil encontrar crítica construtiva nos temas que envolvem populações amazônidas. Lembro de uma. Na Revista Piauí, sobre as obras para a Copa de 2014. Era um lamento porque Manaus estava a perder o Vivaldão, então caso raro de estádio com arquitetura harmoniosa com seu entorno. O artigo demonstrava ser possível atender ao “padrão Fifa” por meio de estruturas provisórias, evitando queimar recursos que posteriormente se seriam de importância fatal para o sistema local de saúde.

Agora a Amazônia está em novo evento, a COP30 em Belém, que nos últimos dias tem sido novo pretexto para expressões baixas e preconceituosas contra uma sociedade amazônida. Foram em torno de notícias sobre os preços elevados das hospedagens, seus efeitos quanto a afastar participantes e tentativas atabalhoadas de soluções por parte de governantes. 

Foi resposta quase definitiva a lembrança de um líder empresarial amazonense de que Belém acolhe anualmente um evento de impacto muito maior que a COP30: O Círio de Nazaré. O evento religioso reúne mais de 2 milhões de pessoas, e o que se fala a respeito são apenas testemunhos positivos, em que os belenenses atendem plenamente as demandas dos visitantes.

COP30
A nova rede hoteleira da capital do Pará vai usar o Círio de Nazaré, em outubro, como evento preparatório para a Conferência do Clima (Rodrigo Pinheiro / Ag.Pará/Divulgação)

Quais seriam, então, as diferenças entre a COP30 e o Círio, que levariam a relatos adversos somente para o primeiro? Resposta imediata: A COP30 está sendo organizada na lógica “top-down”, de cima para baixo, com pouca participação da sociedade belenense. No mínimo faltou clareza quanto à magnitude do evento, os modos que os cidadãos poderiam contribuir para seu sucesso e os recursos que lhes seriam disponibilizados para que efetivassem suas contribuições. 

Por ocasião do Círio tudo isso é muito claro aos belenenses, que o fazem há dois séculos. Para que a COP30 tivesse um sucesso coerente com o Círio seria necessário que seus organizadores construíssem uma plataforma de cooperação com os belenenses. Algo análogo ao “padrão Fifa” tão citado no evento anterior deveria ter sido disseminado a todos belenenses potenciais interessados a prestarem serviços envolvendo a COP30. Isso poderia ter ocorrido com auxílio dos websites de intermediação, de onde se obteve boa parte das anedotas para as matérias e comentários preconceituosos.

Isso também dá nova lição sobre o funcionamento do sistema de preços. O quanto expectativas claras e fundamentadas são importantes para seu justo funcionamento. Expectativas são, por óbvio, relacionadas ao futuro. Opõem-se ao comum engano de que os preços são definidos pelo custo, uma variável pertencente ao passado.

O custo, o passado, é uma importante referência. Garantir que os preços não sejam inferiores a eles é apenas um bom começo. Somar os custos, acrescentar os impostos e a margem de lucro esperada não é suficiente para estimar a necessidade de alterar os ativos, em sua natureza ou dimensão, para atender às infinitas demandas da sociedade. É necessário, mas não suficiente.

Os atributos dos ativos que estão sendo oferecidos em serviço à COP30 e são alvo de críticas preconceituosas pela suposta incoerência com os preços pertencem ao passado. São expressões do custo histórico incorrido solitariamente por seus proprietários para construí-los. Para o futuro, fica a expectativa que os líderes consigam sucesso devido à COP30. E amazônidas aprendamos esta lição de governança e sistema de preços, impedindo apropriação indevida de nossos temas.

André Ricardo Costa
André Ricardo Costa
Doutor pela FEA USP e professor da UFAM

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