Hoje, restam menos de cem axolotes adultos na natureza, o que levanta um alerta para a preservação de seu habitat natural
Símbolo cultural, ícone ambiental e agora ídolo gamer: o axolote, um tipo incomum de salamadra-aquática mexicana, vem sendo cada vez mais comentado e amado ao redor do mundo. Anfíbio, assim como o sapo, o animal tornou-se “popular” ao ser adotado pelo jogo Minecraft em 2021 e, desde então, tem aparecido em todo tipo de produto atrelado ao jogo e seu filme, lançado no início do mês nos cinemas – mas ainda é raro encontrá-lo em seu próprio habitat natural.
Embora não existam dados oficiais sobre a população atual, o Ambystoma mexicanum, nome científico do axolote, está listado como “criticamente ameaçado” na Lista Vermelha da IUCN desde 2019, o que indica risco extremo de extinção no meio ambiente.
Enquanto biólogos, historiadores e autoridades se mobilizam para proteger a espécie e restaurar seu habitat natural – o Lago Xochimilco, na Cidade do México -, um fenômeno inesperado surgiu em paralelo: a popularização global do animal.

Isso porque, no mesmo ano em que foi introduzido no Minecraft, o Banco Central do México lançou uma nova nota de 50 pesos com a imagem do axolote, transformando-o também em símbolo da nação. “Foi quando a ‘axolotomania’ explodiu”, relata Yanet Cruz, diretora do Museu Chinampaxóchitl, na Cidade do México, em entrevista ao g1. Assim, essa febre cultural ajudou a atrair atenção e apoio à conservação da criatura.
Desafios ambientais
Há mais de mil anos, o povo asteca Xochimilca desenvolveu um sistema agrícola engenhoso e sustentável no México chamado de chinampas. Ele consiste em ilhas artificiais flutuantes construídas sobre lagos rasos, cercadas por canais de drenagem, que não apenas sustentavam a produção de alimentos, mas também criavam habitats ideais para os axolotes. Nas chinampas, eles encontravam abrigo e alimento entre as raízes e águas calmas.

Ainda hoje, alguns agricultores, os chinamperos, mantêm viva essa prática ancestral nos arredores da Cidade do México. No entanto, tanto as chinampas quanto esses anfíbios enfrentam um cenário de declínio.
O processo de urbanização e industrialização da cidade e a poluição das águas do Lago foram, aos poucos, comprometendo esse ecossistema milenar. Além disso, espécies invasoras de peixes, como carpa e tilápia, foram introduzidas no lago e passaram a se alimentar de ovos de axolotes, o que contribuiu ainda mais para reduzir a população.
Hoje, restam menos de cem axolotes adultos na natureza e muitas chinampas já estão secas, sem produzir alimentos.

Popularidade cultural em prol da preservação ambiental
Segundo a lenda, o axolote nem sempre foi um simples anfíbio. Em tempos antigos, ele era um deus astuto, que se transformou para escapar de seus perseguidores. Sua história é cercada de mistério e espiritualidade, profundamente enraizada nas tradições dos povos originários, que o reconhecem como símbolo de identidade cultural e resistência.
Mesmo após séculos, o axolote, com sua aparência única e “dragônica”, se transformou em um ícone cultural. Ele está presente em murais urbanos, museus, artesanatos, roupas, acessórios e até mesmo em meias estilizadas que celebram sua imagem carismática. A popularidade é tanta que padarias criaram quitutes em formato de axolote, conquistando o público com doces e pães inspirados no anfíbio.
Criatividade e conscientização
Segundo Luis Zambrano, professor de zoologia da Universidade Nacional Autônoma do México em entrevista a CNN Brasil, a onipresença dos axolotes na cultura pop e nas lojas de animais pode fazer as pessoas presumirem que, como os axolotes “vivem em todos os tanques do mundo, eles não estão em perigo”.
Entretanto, é essencial que a popularidade do animal seja acompanhada de esforços para conscientizar a respeito de sua preservação, movimento que já vem acontecendo através das gerações com a união entre conhecimento local e científico. “Temos que ser criativos em termos de novas formas de restauração e resiliência e decisões sustentáveis”, diz Zambrano.

Um retorno amplo ao sistema tradicional das chinampas poderia ser crucial para a sobrevivência dos axolotes, afirmou o professor. Isso porque as chinampas oferecem um habitat mais limpo e equilibrado em comparação com os atuais usos industriais do Lago Xochimilco, que têm contribuído para a degradação do ambiente natural da espécie.
Implementar esse tipo de recuperação, no entanto, exige mudanças políticas e apoio institucional. Ainda assim, Zambrano acredita que o entusiasmo global em torno dos axolotes pode ser um poderoso aliado nessa luta. A popularidade do animal, que conquistou o mundo com sua aparência única e valor simbólico, pode mobilizar apoio para ações concretas, indo além das fronteiras do universo gamer.