Enquanto a Amazônia for percebida apenas pelo que pode ser no futuro ou pelo que foi no passado, ignorando seu presente, suas aspirações e as suas dificuldades de hoje, seguiremos a não dialogar, a não construir e, principalmente, a desperdiçar uma enorme oportunidade
Por Augusto Rocha
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O “nosso futuro comum” adotou o termo sustentabilidade no Relatório de Brundtland em 1987. Ali e em outros lugares a sustentabilidade é percebida como um tripé econômico, social e ambiental. Por aqui, adotamos o termo com apenas um pé, ora no econômico, ora no ambiental, excluindo os demais.
Em exemplos cotidianos do Amazonas, como a construção de rodovias ou de atividades de mineração, o que se vê é sempre um pé. Ora para nada fazer, ora para fazer muito e ignorar as demais dimensões. Ou fazemos apenas o que agrada a um pequeno grupo de investidores, com uma pegada completamente econômica, ignorando todo o resto ou não se faz nada, com um apelo ambientalista, ignorando-se os demais alicerces.
Assim, exclui-se o social para qualquer debate sobre a Amazônia. Não há sustentabilidade nas ações planejadas para a Amazônia, pois o olhar é sempre parcial, precário e pouco includente. A ausência do Estado como parte do apoio construtivo é notável, pois não há investimentos transformadores, mas sempre está atento ao imposto recolhido e a retirada dos recursos naturais, sem contrapartidas minimamente razoáveis.
Em geral, usa-se o termo “sustentabilidade” para ocultar o que se quer fazer ou não fazer. Mineração sustentável? Não há como, mas é assim que a chamamos. Todavia, encontrar um modo de realizar o que uma sociedade quer, como a rodovia BR-319 recuperada e asfaltada, com todas as contrapartidas e preocupações ambientais sendo executadas? Nem pensar, porque afeta o meio-ambiente. Como assim? O que afeta é nada fazer, pois a floresta seguirá a ser destruída pela ausência do Estado.
A destruição lenta ou acelerada da floresta se dá pelo não obedecimento das leis. Onde não há a presença do Estado para fazer as leis serem obedecidas (“enforcement”), levará as pessoas a não obedecerem às leis, se não houver outro meio razoável de ganhar a vida. Uma infraestrutura em si é apenas uma oportunidade. Se não houver meios de realizar atividades econômicas, as pessoas usarão os mecanismos que forem possíveis – inclusive os ilegais.
Não discutimos a sustentabilidade na Amazônia. Apenas discutimos como nada fazer ou apenas como aproveitar sem compensar a sociedade ou a natureza. Olhamos as pessoas da região apenas como se fôssemos encontrar pedintes miseráveis e é isso que há em grande parte da região, pela falta de dinamismo econômico e de oportunidades. Mas não é só o que temos de pessoas. Enquanto isso, o Aquecimento Global segue, com maio de 2024 sendo 1,52ºC mais do que a média 1850-1900 ou maior 0,65ºC do que a média 1991-2020, segundo a agência Europeia Copernicus.
Enquanto a Amazônia for percebida apenas pelo que pode ser no futuro ou pelo que foi no passado, ignorando seu presente, suas aspirações e as suas dificuldades de hoje, seguiremos a não dialogar, a não construir e, principalmente, a desperdiçar uma enorme oportunidade. O problema é de quem? É principalmente nosso, que por aqui vivemos. Também é do Brasil, que desperdiça uma potencialidade única. É também do mundo, pois seu ecossistema certamente afeta o aquecimento global. Até quando seguiremos nesta condição?
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade
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