Wilson Périco, presidente do CIEAM – Centro da Indústria do Estado do Amazonas
A Zona Franca de Manaus não é do Estado do Amazonas, mas sim do Brasil. Isso precisa ficar bem claro. O que nos resta fazer, em meio a mais uma artilharia pesada contra a Zona Franca de Manaus, senão redobrar a peregrinação entre rádios, revistas, TVs e jornais do país em busca de espaço para esclarecimentos? Qualquer hora dessas podemos inserir este modelo de acertos no sumário de uma política nacional, industrial, ambiental, de ciência, tecnologia e inovação. Neste clima nada festivo de um Natal com poucas luzes, o Amazonas volta a figurar com parte destacada dos problemas nacionais. Em pauta de retrospectivas, a Globonews, equivocadamente, coloca a ZFM, como sendo uma das causas do Brasil encerrar 2015 com as contas no vermelho. Vamos, aqui, didaticamente, demonstrar mais uma vez que, em vez de parte do problema, este modelo é parte das soluções que o Brasil desconhece e o poder central precisa perceber e adotar:
- O modelo ZFM, que usa o mecanismo da renúncia fiscal, como recomenda a Constituição – para reduzir as desigualdades regionais – se implantou em 1967, não nos anos 50 como afirmam seus críticos. Nos anos 50 quem se implantou foi a indústria automobilística, não na região Norte do País, com renúncia fiscal historicamente muito mais robusta, numa região em que hoje se concentra metade da riqueza do país.
- O modelo ZFM, que fique claro, não utiliza R$ 25 bilhões de renúncia fiscal, pois o montante mencionado se reporta a toda região Norte. Segundo a Receita, o Norte, incluindo o Tocantins, em 2014, utilizou 12% da renúncia fiscal do país, enquanto a Região Sudeste abocanhou 53% do total da renúncia fiscal da federação. Nessa mesma comparação, ilustrativa dos esquemas federais de perpetuação da desigualdade regional, de 2009 a 2014, de um total de R$ 1 trilhão investidos pelo BNDES no período, o Amazonas recebeu apenas R$ 7 bilhões de financiamento para desenvolvimento regional, enquanto o Estado de São Paulo, o carro-Chefe da economia nacional, usufruiu de R$ 245 bilhões, ou seja, 24,5% de todo o recurso disponibilizado pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) – criado para reduzir as desigualdades regionais – foi para o Estado mais rico do País.
- E se o modelo faturou R$ 80 bilhões em 2014, mais da metade desta riqueza – num levantamento acadêmico, transformado em doutoramento científico – foi repassada para os cofres do governo –, segundo estudos da Universidade de São Paulo. Além de não utilizar recursos públicos para sua implantação, o modelo ZFM foi transformado em exportador líquido de recursos.
- A reportagem cobra da ZFM a demonstração dos benefícios do modelo. Em 2014, com o debate no Congresso Nacional, para votar a emenda da prorrogação, o modelo foi questionado em detalhes na sua dinâmica, função socioeconômica e ambiental, antes de ser aplaudido e aprovado pelo conjunto da representação parlamentar nacional.
- Os incentivos da ZFM, que buscam reduzir as desigualdades regionais, cumprem o papel adicional de proteger a floresta, bioma vital no equilíbrio climático do país e do planeta. Além de resguardar o patrimônio da biodiversidade, já poderíamos – não fosse o confisco federal da riqueza aqui produzida – ter desenvolvido novas matrizes econômicas, que permitiriam a dispensa paulatina da renúncia fiscal.
- O modelo foi consolidado com a conservação de 98% da floresta do Estado do Amazonas onde se instala, e poderia promover sua diversificação e regionalização, ainda sem chaminés, se utilizasse em Pesquisa & Desenvolvimento a riqueza que produz. Dados da Suframa, o órgão gestor da ZFM, apontam mais de R$ 50 bilhões, confiscados nos últimos anos, para segurar o superávit primário, engordar a carteira do BNDES, financiar projetos do Agronegócio, do Centro-Oeste, subsidiar o Programa Ciência Sem Fronteiras, entre outras usurpações dos recursos aqui produzidos e, constitucionalmente, destinados a atender às demandas dos Estados e municípios da Amazônia Ocidental, além de Macapá e Santana.
- Esses recursos permitiriam consolidar dois Parques Tecnológicos (O Centro de Biotecnologia da Amazônia – CBA e o Centro de Ciência Tecnologia e Inovação do Polo Industrial de Manaus – CT-PIM), para inovação tecnológica, que agregariam valor aos itens de microeletrônica e informática do polo industrial de Manaus, ou diversificariam a produção local na direção coerente da bioindústria. O primeiro aguarda há 15 anos a definição de seu modelo de gestão para ter um CNPJ de identidade jurídica, o outro se encontra em estado pré-falimentar.
- A partir desse imensurável acervo biótico – a floresta amazônica detém 20% dos princípios ativos do planeta – a ZFM poderia produzir fitoterapia, cosmética, e nutracêutica, além da proteína da piscicultura, de que o país e a humanidade precisam para se manter hígidos, joviais e bem nutridos, com investimentos na formação de cientistas, e em infraestrutura de inovação tecnológica, nanotecnológica e biodigital.
- E isso não é responsabilidade direta das empresas. Recolhemos, no âmbito das indústrias de Informática e afins, em 2014, mais de R$ 1,3 bilhão para Pesquisa e Desenvolvimento, e valor semelhante para financiar integralmente a Universidade do Estado do Amazonas, presente em 62 municípios do Estado, o Centro de Educação Tecnológica, as cadeias produtivas do interior, os programas de turismo e interiorização do desenvolvimento, além de meio bilhão de reais com a TSA, taxas administrativas da Suframa, que deveriam ajudar a ZFM cumprir seu papel de desenvolvimento regional, não somente do Estado do Amazonas mas todos os Estados da Amazônia Ocidental, não fossem confiscadas pela União.
- Mais do que 10, 50 ou 100 anos de incentivos, as empresas querem trabalhar, de acordo com a Lei, que preconizam, por exemplo, a liberação do Processo Produtivo Básico para todos os itens que a Constituição e o bom senso autorizam. Existem 45 PPB´s retidos na burocracia federal, num momento em que o Brasil precisa de investidores para sair do buraco.
- É insensato e ilegal ter aguardado por mais de quatro anos o PPB de uma indústria de fármacos, para uma região vocacionada para a bioindústria. Como conquistar competitividade que nos remeteria a redução progressiva dos incentivos fiscais de um modelo que tem 20% de seus custos numa logística cara e inadequada e que tem o projeto de um porto esquecido nos escaninhos da justiça e outro na burocracia ambígua e distorcida?
- Apesar disso, e a despeito de insinuações perversas de que as empresas vivem num paraíso fiscal, dados da Receita Federal apontam que, dos 27 entes federativos (26 Estados mais o Distrito Federal) somente 8 devolvem para a União, em arrecadação de tributos federais, valores acima do repasse compulsório que recebem; o Amazonas devolve 2,5 vezes esse valor; a atividade industrial da cidade de Manaus recolhe mais de 50% dos tributos federais da Região Norte, o que lhe confere o papel de um dos principais pontos da geração de receitas públicas no país. Seria, aqui, enfadonho e interminável, recorrer ao confronto de indicadores para demonstrar, mais uma vez, o equívoco de algumas (des) informações sobre a ZFM.
A ZFM, portanto, não é parte do problema e sim das saídas possíveis para o Brasil, pela multiplicidade de oportunidades que gera e que estão à espera da gestão e integração nacional. Além dos produtos de boa qualidade e preços acessíveis presentes no cotidiano de todos os brasileiros, este modelo guarda a floresta, a mantém brasileira e à disposição do Brasil para aqui construir uma civilização economicamente próspera, socialmente cada vez mais justa e ambientalmente sustentável, como a humanidade precisa.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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