Nova área protegida da Amazônia peruana sofre com avanço de obra que ameaça povos indígenas

Apesar de promover a criação de área protegida na Amazônia peruana, governo do país viola o direito indígena à consulta prévia e avança com a construção da rodovia Bellavista-El Estrecho, que ameaça territórios e modos de vida indígenas.

O Peru criou neste mês a Área de Conservação Regional Medio Putumayo Algodón (MPARCA), que protege mais de 280 mil hectares de floresta amazônica no corredor Napo-Putumayo, próximo à fronteira com a Colômbia. A iniciativa, resultado da colaboração entre governo regional, comunidades indígenas e ONGs, fortalece o mosaico de áreas protegidas da região Napo-Putumayo-Bajo Amazonas.

Além de abrigar espécies ameaçadas, como ariranhas, onças-pintadas e antas, a MPARCA tem papel crucial na regulação climática, com alto potencial de sequestro de carbono e resiliência às mudanças climáticas. A área protegida também é considerada um exemplo positivo da aplicação da consulta prévia no Peru, respeitando o direito das comunidades tradicionais de serem ouvidas sobre projetos que as impactam diretamente.

Cachoeira Gocta, localizada na província de Bongara, a 770 km de Lima. Peru anunciou uma nova área protegida em julho de 2025.
Peru anunciou em julho de 2025 a criação de uma nova área protegida na floresta amazônica. Foto: Renata Garcia/Blog Kangaroo.

Apesar de avanços, governo peruano ainda promove ameaças a povos indígenas

No entanto, essa política de conservação contrasta com a continuidade da obra da rodovia Bellavista-El Estrecho, que atravessará áreas protegidas ainda maiores, como a MKRCA e a AARCA — territórios essenciais para a sobrevivência de milhares de indígenas. Das quatro fases previstas da estrada, duas já estão em andamento. A última cortará diretamente as terras do povo Maijuna, que reúne menos de 600 pessoas em quatro comunidades.

A obra deve gerar desmatamento, invasões e perda de territórios, além de comprometer a segurança alimentar e cultural dos povos indígenas. Apesar de a consulta prévia ser exigida por lei, apenas uma das quase 100 comunidades indígenas afetadas foi formalmente consultada. Em alguns casos, invasões e exploração ilegal de territórios já começaram antes mesmo da consulta formal.

Imagem de indígenas de posto de vigilância comunitária do povo Maijuna.
Imagem de posto de vigilância comunitária do povo Maijuna, cujo território será atravessado pela rodovia Bellavista-El Estrecho. Foto: SPDA Actualidad Ambiental.

O fracionamento do projeto em quatro partes tem sido usado como estratégia para contornar a legislação e evitar a avaliação dos impactos acumulados. Ao mesmo tempo em que cria áreas protegidas, o governo peruano avança com uma obra que pode destruí-las, expondo a contradição entre o discurso oficial de conservação e a prática que ameaça povos originários e florestas.

Indígena Maijuna-Kichwa produzindo peças de artesanato.
Indígena da etnia Maijuna-Kichwa. A subsistência dos povos indígenas está diretamente ligada à preservação de seus territórios e dos recursos naturais ali presentes. Foto: SPDA Actualidad Ambiental.
Bruna Akamatsu
Bruna Akamatsu
Bruna Akamatsu é jornalista e mestre em Comunicação. Especialista em jornalismo digital, com experiência em temas relacionados à economia, política e cultura. Atualmente, produz matérias sobre meio ambiente, ciência e desenvolvimento sustentável no portal Brasil Amazônia Agora.

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