“O país tem reafirmado, historicamente, sua incapacidade de compreender, valorizar e abraçar a Amazônia, avaliar e rentabilizar suas riquezas com inteligência e sustentabilidade. […] Oxalá sejam os eleitores mais atentos, posto que alcançados pelos estragos dessa negligência, e optem por promotores dignos e capazes desta urgente correção.”
Por Nelson Azevedo Coluna Follow-up 07.12.21
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O mundo passou a nos olhar com desejo desde a busca das famosas e preciosas “ervas do sertão”, uma demanda da Europa carente de conservantes para sua segurança alimentar. A Amazônia, assim, passou a ocupar um lugar de destaque na agenda econômica mundial. Com o debate da equação meio ambiente e desenvolvimento, acirrado no início dos anos 90 – com a preparação da Conferência da ONU, realizada no Brasil, a Rio 92, sobre o tema – nossa região ficou no centro da discussão nesta querela recorrente entre meio ambiente e aquecimento global. Mesmo assim, tema prioritário no debate planetário, a Amazônia não tem ocupado lugar de destaque nos programas de governo daqueles que se propõem a dirigir o Brasil. Por que será?
Distanciamento
Poderíamos imaginar, considerando o papel preponderante dos votos, que a quantidade reduzida de sufrágios na floresta, comparativamente a outras regiões, seja o fator decisivo pelo descaso. Entretanto, ao acompanhar as manifestações a respeito dos tais presidenciáveis, nas últimas disputas, as razões passam a ser outras. E elas são confirmadas pelos posicionamentos assumidos por aqueles que foram eleitos. Numa palavra, o que se observa é um distanciamento, antigo e renovado, com opiniões apressadas e frequentemente superficiais, por parte de quem pretende governar o Brasil.
A Amazônia de amanhã
E pouco tem adiantado qualquer mobilização reclamatória mais organizada ou tecnicamente sistematizada por parte dos atores locais. A frustração crônica se resume à ausência de um projeto nacional para tratamento de um assunto que é ordem do dia na agenda política das grandes nações. E mesmo que este ou aquele gestor federal ponha a Amazônia no bojo eventual de sua prioridade, para responder a pressões diplomáticas, a maior floresta tropical do planeta, com mais de 20% da biodiversidade e dos recursos hídricos do mundo, é assunto transferido indefinidamente para um amanhã, um qualquer dia desses que nunca vem.
O bolo da cidadania
O posicionamento do economista Affonso Pastore, publicado na semana passada a propósito de nossa economia, é sinal de que tudo será como antes no quartel de nossos governantes. “A Zona Franca de Manaus é um mau exemplo de política fiscal do país”, disse um economista que foi presidente do Banco Central no governo militar João Figueiredo. Pupilo de Antônio Delfim Neto, o economista compartilha com ele o princípio equivocado de que é preciso, primeiramente, incrementar o tamanho do bolo arrecadatório para depois promover sua distribuição. Esta receita da economia representou, de fato, um bolo de frustração crônica na cidadania. Basta observar as desigualdades sociais e regionais do Brasil.
A partilha equivocada
Talvez por isso, nossos indicadores de desenvolvimento humano – no entra e sai de ministros de Economia, seguem destacados entre os piores do Brasil. Em todos os momentos de destacada geração de riqueza, como o Ciclo da Borracha e os momentos altos do programa Zona Franca de Manaus, nossa região extremamente generosa com os cofres federais. O Brasil reza o Pai Nosso da Amazônia somente até o “venha nos”. Atualmente, o Amazonas figura entre os 5 maiores pagadores de impostos do país. Se somos um mau exemplo fiscal, o bom exemplo seria o da região Sudeste que utiliza mais de 50% do bolo de incentivos fiscais do Brasil?
Sem competitividade nem expansão
No caso do “mau exemplo” da Zona Franca de Manaus, que se vale de menos de 8% do referido bolo de compensação fiscal, é justo anotar que esta fatia é destinada a toda a Amazônia Ocidental mais o Estado do Amapá, uma das regiões mais pobres da federação. E mesmo assim, repassamos 75% de sua receita fiscal para os cofres da União. Este repasse impede a autonomia fiscal do programa, mantendo sua infraestrutura precária e cara que compromete sua competitividade e expansão.
Compreender, valorizar e abraçar
Tem sido assim, Sr. Pastore, não se sinta acusador único da descaso ou da desinformação pois ela é crônica. O país tem reafirmado, historicamente, sua incapacidade de compreender, valorizar e abraçar a Amazônia, avaliar e rentabilizar suas riquezas com inteligência e sustentabilidade. A recente crise hídrica, por exemplo, que ainda acomete o Brasil – dizem os cientistas – foi agravada em virtude do aumento acentuado do desmatamento. Quanto menos floresta menos água, quanto maior a redução da vegetação mais escassez hídrica dos rios voadores. Oxalá sejam os eleitores – nem ovelhas pastores – mais atentos, posto que alcançados pelos estragos dessa negligência, e optem por promotores dignos e capazes desta urgente correção.
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