“Um recurso gerado pelas empresas de Informática, R$992,2 milhões, que deveria ser usado e não é, para diversificar e interiorizar o desenvolvimento da Amazônia, onde os IDHs são africanos no pior sentido que se pode dar a esse indicador na Mãe África. A operação para identificar o grave sumiço de uma verba tão essencial não surtiu efeito”. FOLLOW UP 16.02.2021
Alfredo Lopes
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Seria irresponsável, para não dizer desonesto, atribuir exclusivamente à atual gestão do governo federal o desmonte da Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil. É bem verdade que o orçamento de 2020, o primeiro elaborado pelo governo Bolsonaro, os recursos destinados ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) sofreram um corte de saída em torno de 15%. Justamente num ano em que começaria a pandemia e a urgência de pesquisas para estudar o vírus e desenvolver a vacina significaria mais ou menos milhares de mortes no Brasil. P a complicar, desde o início de 2019, a tesoura ideológica associou pesquisa a coisa de comunista. E as instituições acadêmicas e de produção científica foram escaladas para o desmantelamento do “nós contra eles”.
Os governos só pensam naquilo
Mas a gênese dessa desarticulação deve cair apenas na conta ideológica do governo Bolsonaro? Os cortes nas gestões anteriores, que vem-se acumulando ano a ano – revelam um desestímulo consolidado a quem precisa fazer Ciência a favor do Brasil. O cenário é mais complexo e passa pelo veto a qualquer programa de pesquisa que ultrapasse um mandato de quatro anos de qualquer governo. Todos eles começam o primeiro mandato focado apenas “naquilo”, isto é, assegurar a própria reeleição. Em 2017, já com a gambiarra da Comunicações atrelada à Ciência e Tecnologia, o ministério contou com apenas 3,3 bilhões. Estavam previstos 5,8 bilhões inicialmente, isto é, 44% a mais, segundo admite o próprio MCTIC em suas desculpas para o esvaziamento. No caso, foi preciso assegurar verbas para Comunicações, já que o país sai de um caos político para entrar em outro. E naquele ano, um novo tempo se impunha com a necessidade de um novo ciclo político pós-PT. Em suma, Ciência e Tecnologia ficou com R$ 2,5 bi, o que representou 25% do orçamento de 2010, ou seja, em 7 anos, a Ciência do Brasil dividiu por quatro a sua capacidade de atuação.
Follow the money
Uma estória recente serve para ilustrar a prosopopeia das verbas para a Ciência na Amazônia, onde qualquer país sério já teria feito uma revolução científica e tecnológica com o caminhão de recursos gerados pelo programa Zona Franca de Manaus. Em maio de 2015 a Superintendência da Suframa foi alvo da operação “Follow the money”, uma receita universal para mapear os desvios pecuniários de qualquer país. A autarquia bem que tentou explicar mas não conseguiu o destino de R$992,2 milhões das verbas de P&D para o programa Ciência sem Fronteiras. Um recurso gerado pelas empresas de Informática que deveria ser usado para diversificar e interiorizar o desenvolvimento da Amazônia onde os IDHs são africanos no pior sentido que se pode dar a esse indicador na Mãe África. A operação para identificar o grave sumiço de uma verba tão essencial não surtiu efeito.
“Por ciúme, despeito, amizade ou horror?”
Essa é uma estória sem H profetizada por Lupicínio Rodrigues na canção Nervos de Aço, onde as suspeitas da enganação aventam a possibilidade do .”… ciúme, despeito, amizade ou horror ”, nunca foram esclarecidas. Aonde foram parar os R$992,2 milhões que pagariam o Programa Ciência Sem Fronteiras? De Manaus eles saíram mas na Capes nunca chegaram. Tudo se deu no âmbito do CAPDA, um Comitê da Atividade de Pesquisa e Desenvolvimento da Amazônia e até hoje não foi devidamente apurado. A cobrança pública do tal sumiço foi feita pela Assembleia Legislativa do Estado, através do deputado Dermilson Chagas. A celeuma se baseava numa ata de reunião do CAPDA de 2014, onde estava debatida, votada e registrada com assinaturas e carimbos a remessa da generosa fortuna para o programa de qualificação científica de nossos pesquisadores. Uma ideia louvável mas que não consta no rol de atribuições da Zona Franca de Manaus. Depois de muito barulho e pouco esclarecimento, nada foi resolvido e tudo foi arquivado no esquecimento popular. Para engrossar o caldo do imbróglio, a CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior – exibiu por várias semana um outdoor digital em sua página na internet, afirmando, peremptoriamente que os recursos da ZFM não haviam desembarcado na instituição.
As tetas equinas das Amazonas
Vale lembrar que uma ação foi impetrada junto ao Ministério Público Federal no Amazonas para investigar a questão. Por omissão dos organismos envolvidos, jamais esse assunto foi elucidado. A Suframa, na ocasião, veio a público para esclarecimento definitivo (?) do mistério, através de um pronunciamento que não influiu nem contribuiu com a estória do Brasil, digo, da localização dos recursos públicos da Amazônia para a P&D em questão. E por que retomar essa estória? Ela é apenas mais uma entre tantas que arquivam a destinação/utilização obscura de verbas para a região. Quantos benefícios frustrados e quantos jovens desempregados vagando pelas ruas de tanta contravenção nacional… Já pagamos construção de porto público em Mariel, Havana, programas de inovação tecnológica para empinar o agronegócio no Centro-Oeste, recursos para financiar doutorado de funcionários públicos estaduais, a serviço de algumas organizações não-governamentais oportunistas que mamam nas tetas equinas das Amazonas, isto é, do erário público, entre outros peripécias constrangedoras dessa hilária ou perversa convivência pecuniária entre a Amazônia e o Brasil.
Todos pela Ciência
Em pronunciamento para o portal BrasilAmazôniaAgora, do qual ele é parceiro fundador, o ex-diretor do INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), Adalberto Val, um dos cientistas mais respeitado do Brasil, a questão do confisco de verbas para a Ciência voltou à pauta através de um documento da Academia Brasileira de Ciência, no qual Adalberto teve participação. Disse ele: “Sabemos que a ciência é fundamental para a nossa qualidade de vida, para nossa saúde, e para nossa segurança. Contudo, fazer Ciência requer investimento de longo prazo. Uma fonte importante de financiamento da pesquisa no Brasil é o FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). No entanto, os recursos desse fundo tem sido contingenciados, inviabilizando os investimentos em Ciência e Tecnologia. O Projeto de Lei Complementar 135/2020, foi aprovado na Câmara e no Senado por ampla maioria. Mas foi vetado, em sua essência, pela Presidência da República. A Academia Brasileira de Ciências (ABC) produziu uma revista conclamando a derrubada desses vetos. O portal BrasilAmazôniaAgora também tratou dessa questão. Convido a todos para conhecer os documentos no site da Academia, e no portal BAA. Junte-se aos que apoiam a derrubada dos vetos! Para que se possa manter as atividades científicas no Brasil. Todos pela ciência! – que é fundamental para a Amazônia e para o Brasil!”
Leia também “Chega de sabotar a Ciência no Brasil – Pela manutenção do FNDCT”
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