O MPF (Ministério Público Federal) recomendou ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) que suspenda obras em andamento na BR-319 (Manaus-Porto Velho/RO) até que seja feita consulta prévia aos povos indígenas e tradicionais que podem sofrer danos com a repavimentação da rodovia.
A suspensão se aplica especialmente ao segmento C (km 177,8 a 250) e ao chamado ‘trecho do meio’ (km 250 a 655,7), com exceção de medidas emergenciais de manutenção.
A recomendação também foi encaminhada ao Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), à PPI (Secretaria do Programa de Parcerias de Investimentos), à Funai (Fundação Nacional do Índio), ao ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), ao Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) e à Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente).
De acordo com o documento, a consulta deve incluir os povos indígenas, ribeirinhos, extrativistas e outros tradicionais que, independente da regularização de seu território tradicional, estão na área de influência da BR-319.
O MPF esclarece que a consulta prévia não se confunde com as audiências públicas do processo de licenciamento ambiental, que têm caráter apenas informativo. “O procedimento de consulta deve garantir a efetiva participação das comunidades afetadas, não devendo se constituir em processo apenas informativo e meramente formal”, afirma o órgão.
Na recomendação, o MPF alerta que a ausência da consulta prévia compromete o processo de licenciamento de forma incorrigível, obrigando à anulação de todos os atos administrativos relacionados ao processo.
Proteção permanente
O MPF recomendou também a construção imediata, em caráter emergencial, de um plano de proteção, monitoramento e fiscalização permanente nos territórios tradicionais com potencial impacto da rodovia, priorizando as áreas já impactadas como as identificadas nos municípios de Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá. O plano deve ser apresentado ao MPF em 30 dias, com prazo máximo de implementação de 60 dias.
A definição das comunidades a serem abrangidas pela recomendação deve ser considerada a partir da conectividade que a rodovia trará; do seu papel no desmatamento e nos impactos ambientais dos empreendimentos correlatos como mineração, agricultura extensiva de soja e pecuária; dos impactos de pavimentação que corta um ecossistema sensível em um contexto socioeconômico frágil, atravessando uma região sem regularização fundiária suficiente.
“O foco dos estudos que visam mensurar os impactos, a partir das disposições normativas, deve tomar a quilometragem proposta na Portaria Interministerial nº 60/2015 como parâmetro mínimo e seguir as conectividades viárias, hidrológicas, ecossistêmicas e socioambientais para determinar os impactos e sua magnitude transcendendo a mera limitação quilométrica”, diz o MPF.
Violações
O MPF afirma na recomendação os inúmeros documentos, denúncias, cartas e pedidos de apoio que continua recebendo dos povos indígenas e tradicionais com potencial impacto da BR-319. Segundo o órgão, ameaças, desmatamento, grilagem de terra, conflitos fundiários, caça e pesca ilegal, assoreamento de igarapés são alguns dos danos já ocorrendo diretamente ligados à reabertura da BR-319 e que necessitam de resposta firme e urgente do poder público.
Além disto, o MPF alega que a insistência dos órgãos públicos em excluir os povos tradicionais da consulta nos moldes da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho é mais uma entre as violações de seus direitos.
De acordo com o MPF, mesmo sem a emissão da licença prévia ambiental para o ‘trecho do meio’, o Dnit publicou, em 2020, editais de obras de serviços de recuperação (conservação/manutenção) para extensões inseridas no segmento C e no ‘trecho do meio’, sem consulta prévia aos povos indígenas e população tradicionais afetadas.
Fonte: Amazonas Atual
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