Ainda estamos vivendo o rescaldo da pandemia, mas já temos o mapa de quem se comprometeu ou não com nossa economia, a economia que ajuda a conservar mais de 95% de nossa cobertura florestal, fonte de saúde planetária, energia hidrelétrica e recursos hídricos para os reservatórios paulistanos.
Wilson Périco
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A despeito das suas dimensões continentais, de sua biodiversidade, províncias minerais e recursos hídricos, a Amazônia carece de cientistas, tecnólogos, especialistas em gestão do Bioma. Qualquer política de adensamento, diversificação e inclusão de novas modulações econômicas vai exigir recursos humanos qualificados. Estamos muito aquém do que precisamos. Nesse cenário, é extremamente gratificante identificar nossa região como a pauta da hora, nas mídias tradicionais e sociais de comunicação. É tanto destaque que temos razão para colocar as barbas de molho, especialmente depois que os três maiores bancos privados que atuam no Brasil resolveram engrossar as fileiras do Exército da Salvação da Amazônia. Sem ilusões, por favor! Não existe café de graça!
Queimadas culpadas
Foi assim, nos anos 90, para os que não sabem, quando o Brasil acolheu a Conferência da ONU, sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, como lembra o ex-embaixador Rubens Barbosa que, à época, diplomata brasileiro em Londres e, logo depois, em Washington. Ele escreveu sobre a Amazônia na revista Interesse Nacional, dedicada à Bioeconomia. O diplomata acompanhou de perto a movimentação do Primeiro Mundo, na citada Conferência, para acusar as supostas queimadas da Amazônia como sendo origem e causa do aquecimento global, numa época em que – foi divulgado depois pela própria ONU – somente os Estados Unidos já era responsável por 25% da poluição da Terra.
Nem apagaram nem pagaram
Como as supostas queimadas da Amazônia viraram um blefe eficaz, um verdadeiro bode expiatório, para o aquecimento global, o próprio governo George Bush, o pai, anfitrião da reunião do G-7, em Houston, no Texas, em 1990, propôs a Agenda de Salvação da Amazônia, conclamando os 7 países mais ricos da Terra a destinarem U$2 bilhões para “apagar o incêndio”. Não apagaram. Nem pagaram. À exceção da Alemanha que repassou 20% da bolada e Canadá num percentual bem discreto e em módicas parcelas.
Fake news na floresta
A questão, portanto, desde sempre, é mais pirotécnica do que realista. Na Europa, agora, as lideranças políticas, em temporada eleitoral, perceberam que as bandeiras ecológicas envolvendo a Amazônia são mais efetivas em termos de voto do que o Bolsa-Família no Norte-Nordeste do Brasil. Por isso, nossa empolgação precisa ser contida e nossa capacidade de decodificação de fake news urgentemente revista.
Centros Tecnológicos
Em entrevista ao Estadão na semana passada, o cientista do INPA, Adalberto Val, 40 anos de pesquisa na Amazônia, recomendou que fossem multiplicados os Centros Tecnológicos na região como condição de viabilidade de uma nova economia. Ou seja, precisamos adensar e diversificar nosso polo industrial de Manaus, a terceira planta manufatureira, com aproveitamento inteligente do Banco Genético. Especialista em piscicultura, o Cientista reclama dos recursos da própria região que são apropriados por grupos que não se permitem instalar unidades industriais para geração de empregos na região. Capturam nosso banco genético e vão abrir fábricas no Sudeste, via de regra em São Paulo, onde já existem 30% dos estabelecimentos industriais do Brasil, enquanto aqui apenas 0,6%.
Quem é quem?
Ainda estamos vivendo o rescaldo da pandemia, mas já temos o mapa de quem se comprometeu ou não com nossa economia, a economia que ajuda a conservar mais de 95% de nossa cobertura florestal, fonte de saúde planetária, energia hidrelétrica e recursos hídricos para os reservatórios paulistanos. Um serviço gratuito que a indústria do Amazonas colabora decisivamente para fornecer. Entre os parceiros, porém, não identificamos o Sistema Financeiro. Os bancos, que agora anunciam salvar a Amazônia, na hora mais difícil, de muita insegurança sanitária e alimentar – ou seja, fome, muita fome e falta de EPIs – se mantiveram distantes e firmes na cobrança de taxas extorsivas para empréstimos que iriam aliviar as perdas de nossas empresas. Não se comprometeram e viabilizar recursos mas, sim, linhas de financiamento, ou seja: juros! Esse café não cheira bem!
Bioeconomia não é barganha obscura!
Que sejam bem-vindos, e que cumpram seus compromissos e agendas. Não nos esquivaremos do diálogo, nem nos negamos a compartilhar 53 anos de experiência na geração sustentável de riqueza na floresta, financiando integralmente a Universidade do Estado do Amazonas, a maior instituição multi-campi do país, presente em 62 municípios. Só uma coisa não nos interessa, ou seja, compactuar com a agenda oculta de uma das propostas de Reforma Fiscal no Congresso, de eliminação do Programa Zona Franca de Manaus, o maior acerto fiscal na redução das desigualdades regionais inaceitáveis do Brasil. Bioeconomia é um aceno histórico do setor produtivo local, não instrumento de barganha obscura, muito menos para substituir nossa base econômica mas para se somar a ela, como temos feito e exigimos respeito à Lei para seguir fazendo.
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