Nesta terça-feira, entrou em discussão o projeto de PLS 626/2011, de autoria do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), no Senado Federal, que tem como objetivo liberar o cultivo de cana-de-açúcar na Amazônia Legal, em áreas já degradadas de floresta e em trechos de cerrado e campos gerais dos estados que compõem a região. Parece simples, mas não é. Conhecendo a habitual inépcia do governo brasileiro em fazer cumprir as leis que homologa, ou fazê-lo de modo obscuro do proibicionismo lucrativo, é óbvio que esta liberação vai promover o desmatamento que se quer evitar.
Do ponto de vista legal, o Código Florestal autoriza o uso de 20% da floresta para geração de emprego, renda e desenvolvimento. Desse ponto de vista, as áreas propostas estariam incluídas naquilo que a lei permite. Resta saber se plantar cana-de-açúcar ou grãos na floresta é a opção mais inteligente do ponto de vista do desenvolvimento econômico e socioambiental de que precisamos?
Moeda ambiental
No Amazonas, na medida que soubermos precificar os serviços ambientais que a floresta conservada representa, vamos continuar recebendo o apoio precioso da União Europeia e da Organização Mundial do Comércio. Ademais, temos Decreto 6961/2009, que ordena o Zoneamento Agroecológico do Brasil e restringe essas culturas em áreas diferenciadas como a Amazônia. Como contrapartida de melhor aproveitamento econômico, os cientistas do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia) tem um acervo diversificado e promissor para o plantio de espécies oleaginosas, nutricionais ou de dermocosméticos, capaz de gerar até dez vezes mais o valor da cana-de-açúcar, oferecer mais emprego, mais retorno de investimentos e – o que é mais relevante do ponto de vista da responsabilidade socioambiental – operar num parâmetro de baixa emissão de carbono.
Menos proibicionismo
Na opinião de Saleh Hamdeh, do Observatório da ZFM em Brasília, em todos os debates sobre preservação ambiental versus produção de alimentos ou energia em parâmetros de desenvolvimento sustentável, esbarramos sempre no uso predatório dos cultivos versus incapacidade do Estado de substituir o proibicionismo por estímulo ao fazer bem.
Melhor que fiscalizar e controlar os manejos sustentáveis em áreas sensíveis, como Pantanal e Amazônia, é promover a atividade econômica como instrumento de proteção e reposição dos estoques naturais. É bem verdade que esse estigma não vem do nada. Historicamente, pecuaristas e usineiros usaram de práticas predatórias para expandir suas áreas de cultivos, pressionando áreas de preservação e depois de desmatado a “Inês é morta”.
As promessas da inovação
Em Itacoatiara, no Amazonas, dentro da superação desta ótica predatória que o cultivo de cana-de-açúcar tem procurado, os remanescentes do senador Vergueiro foram atraídos pela pecuária, há 50 anos. As ervas daninhas do Amazonas levaram o projeto a nocaute e propiciaram o cultivo de outras espécies, a castanheira, Bertholetia excelsa, a árvore sagrada dos povos da Amazônia à frente.
Domesticação do cultivo extensivo, pesquisas de polinização eficiente, redução das alturas, controle de pragas, identificação de demandas da Indústria de química fina para alimentos, fitoterápicos e cosméticos. Bioeconomia com base de inovação tecnológica foi a trilha mais alvissareira com suporte do Inpa, Embrapa Amazônia Ocidental, Centro de Pesquisas do Trópico Úmido, de Belém, uma plataforma de biotecnologia foi estruturada.
Parcerias
Falta mobilização de atores, ampliação de parcerias, incluindo os empresários do agronegócio que se aglutinaram na Coalizão Brasil Clima, e que estão dispostos a apoiar a coerência deste caminho. Assim poderíamos mais fortemente exigir a retenção dos recursos de P&D&I, recolhidos pelas empresas de Informática, R$ 500 milhões por ano, para aplicar na Amazônia, criando clusters de bioeconomia no paradigma de baixo carbono.
Em vez de grãos em áreas de floresta, os pecuaristas de Rondônia estão escavando áreas degradadas para criar tambaqui, matrinxã e pirarucu, que Silvio Crestana, da Embrapa Instrumentação de São Carlos, transformou em projetos e convicção tecnológica para abastecer a dieta dos brasileiros com a mais deliciosa das proteínas sem pesticidas. Parcerias com a Coalizão, Esalq, UEA, Feasp, Fipe, Insper e UFMG, Inpa, Embrapa, siglas de uma academia que olha o mercado na perspectiva da sustentabilidade, são uma trilha de verdade, socialmente justa, economicamente rentável e ambientalmente equilibrada. Sem esquecer que protegemos a floresta fortuitamente nos primeiros 50 anos.
Para manter este ativo nas negociações do Amazonas precisamos nos próximos 50 anos apostar na precificação dos serviços que a indústria do Amazonas indiretamente propicia.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected] |
Comentários