Editorial BAA – O melhor remédio pra patifaria é mais democracia

“O remédio contra a patifaria não é cinismo nem descrença. É mais democracia: voto consciente, fiscalização ativa, indignação organizada. É a sociedade lembrando que o mandato não é salvo-conduto, mas delegação temporária para servir ao povo”

À luz do dia, diante das câmeras, com espontaneidade ensaiada e uma dose cavalar de malandragem, a maioria dos deputados federais vota para blindar a si mesmos. Não é um deslize, é projeto: transformar a impunidade em cláusula pétrea da política. Uma democracia desavergonhada. Na noite desta terça-feira (16), 353 parlamentares votaram a favor da chamada PEC da Blindagem, contra apenas 134 votos contrários.

A proposta abre um atalho para transformar o Congresso em um bunker de privilégios, impedindo que deputados e senadores sejam processados e presos sem a benção dos próprios pares. A raposa, além de tomar conta do galinheiro, agora escreve o regimento da granja.

O que muda com a blindagem

•⁠ ⁠O Congresso volta a ter o poder de barrar processos criminais contra seus membros no STF. Se a Câmara ou o Senado disserem “não”, o processo fica suspenso até o fim do mandato.
•⁠ ⁠A regra também proíbe a prisão de parlamentares, exceto em flagrante de crime inafiançável (racismo, estupro, terrorismo, tortura). Mas, mesmo nesse caso, a Casa respectiva decide em 24 horas , em reunião secreta, se mantém a prisão ou se liberta o colega.
•⁠ ⁠Presidentes de partidos também passam a ter foro privilegiado no STF.
•⁠ ⁠Até ações cíveis de improbidade ou bloqueio de bens podem ser atingidas, já que medidas cautelares dependerão da corte suprema.

DEMOCRACIA

Um retrocesso histórico

Vale lembrar: esse modelo existia até 2001, quando caiu após pressão popular contra a blindagem e a impunidade. A votação secreta que protegia os políticos foi substituída por transparência mínima. Agora, 24 anos depois, a banda quer reerguer o muro da imunidade, numa versão ainda mais ampla e tóxica. E não é coincidência: a PEC vem como resposta às dezenas de investigações sobre desvio de emendas parlamentares, dinheiro público que deveria chegar às comunidades e acaba alimentando esquemas. É a reação corporativa de um sistema acuado pelas próprias falcatruas.

Quem patrocinou a vergonha

•⁠ ⁠O texto original é de Celso Sabino (União Brasil-PA), hoje ministro do Turismo do governo Lula.
•⁠ ⁠Recebeu apoio maciço do centrão e do PL de Jair Bolsonaro, mas também alguns votos do PT, mostrando que a autodefesa é suprapartidária.
•⁠ ⁠O acordo político surgiu como desfecho para acalmar o motim bolsonarista no plenário da Câmara — mais uma vez, a democracia refém da chantagem.

E os efeitos práticos?

Se aprovada pelo Senado, a PEC pode paralisar processos em andamento contra deputados e senadores. A emenda constitucional entra em vigor imediatamente, sem regra de transição. Especialistas dizem que o STF terá de decidir se aplica o “efeito retroativo”, mas a tendência é de que, mais uma vez, os poderosos escapem.

Democracia às avessas

Em vez de ampliar direitos sociais, como a prometida isenção do Imposto de Renda, o Congresso preferiu investir energia em sua própria blindagem. Enquanto milhões de brasileiros esperam por justiça fiscal, os senhores parlamentares garantem justiça seletiva. É o avesso da democracia: uma elite política que se protege das leis que ela mesma escreve.

Mas a história mostra que todo excesso cobra preço. Foi assim em 2001, quando a pressão popular derrubou o velho modelo. Pode ser assim de novo. O remédio contra a patifaria não é cinismo nem descrença. É mais democracia: voto consciente, fiscalização ativa, indignação organizada. É a sociedade lembrando que o mandato não é salvo-conduto, mas delegação temporária para servir ao povo.

Redação BAA
Redação BAA
Redação do portal BrasilAmazôniaAgora

Artigos Relacionados

Denis Minev no CIEAM: plantar árvores, rematar a Amazônia e virar a chave da sustentabilidade

Denis Benchimol Minev, representante do setor privado na Amazônia junto à COP30, ao visitar o CIEAM, neste 17 de setembro, deixou uma mensagem clara e provocadora: “é hora de plantar árvores, rematar a Amazônia e preparar o futuro com coragem e pragmatismo”. Segundo ele, quem plantar a partir de 50 mil hectares pode, em apenas uma década, estar pronto para transformar sua iniciativa em negócio de impacto listado na bolsa de valores. E detalhou, mais uma vez, a operação. 

Com apoio do Idesam, startups amazônicas conquistam prêmios internacionais

Startups apoiadas pelo Idesam conquistam prêmios internacionais ao transformar a biodiversidade amazônica em inovação e impacto socioambiental.

Pesquisadores avaliam composto da folha de goiabeira no tratamento da periodontite

Pesquisadores destacam potencial da morina, composto encontrado na folha da goiabeira, para tratar periodontite.

Impactos dos combustíveis fósseis na saúde expõem riscos fatais e custos bilionários

Estudo global revela os impactos dos combustíveis fósseis na saúde pública, de doenças fatais a custos bilionários.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor, insira seu comentário!
Digite seu nome aqui